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COTIDIANO

Saúde perece em Aparecida

Divania Rodrigues

Ontem, os Centros de Atendimento Integral à Saúde (Cais) de Aparecida de Goiânia viveram mais um dia que não é normal. Com o aumento da demanda, pacientes se espalham pelos corredores e em filas esperam para ser atendidos. Eles reclamam da demora no atendimento e da dificuldade em conseguir informações, por outro lado os médicos e profissionais da Saúde dizem estar se desdobrando para recepcionar todos que procuram socorro.

No Cais Nova Era, as cadeiras da recepção estavam todas ocupadas e havia fila para que a enfermeira fizesse o procedimento de triagem em que se avalia as condições de saúde, conforme o grau de gravidade do paciente, para priorizar ou não o atendimento pelos médicos. Sentada atrás de uma mesa, a enfermeira afirmava já ter atendido 200 pessoas.

De acordo com Denyson José Moraes Lopes, diretor-geral do Cais há quatro anos, passam cerca de 600 pacientes por dia, um fluxo 30% maior do que o normal. O aumento se deve à demanda de pacientes não atendidos pelas unidades de saúde de Goiânia e a pessoas afetadas pela epidemia de dengue.

Em outra unidade, o Cais Garavelo, a situação era oposta: o lugar estava vazio. De acordo com as recepcionistas, havia apenas um médico atendendo casos de urgência. No momento em que a reportagem esteve no local, Luzinete Siqueira, de 31 anos, procurava atendimento. Ela disse que havia desmaiado três vezes durante o dia e estava sem saber onde procurar ajuda. Seu acompanhante informou que não tendo como levá-la a outro local, por falta de carro, ligou para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e foi informado que onde estava deveriam estar atendendo dois médicos.

Uma fonte que trabalha no Cais e não quis se identificar explicou que os profissionais de Aparecida estão desestimulados, tendo que atender além da demanda aumentada do próprio município – por causa da temporada atípica de dengue – os pacientes que estão se deslocando de Goiânia. A frase que o profissional usou e que supostamente está sendo mencionada pelos corredores é a de que os profissionais de Aparecida “não podem carregar nas costas os pacientes de Goiânia”.

Trabalhando, há 13 anos, no Cais Colina Azul, o pediatra Luciano Henrique da Silva, diretor clínico do local, explica que a procura por atendimento realmente aumentou, principalmente os casos de complexidade. De acordo com ele, a estrutura física do Colina Azul é pequena e os pacientes graves e gravíssimos deveriam ser apenas estabilizados e permanecer no máximo 12 horas na unidade, mas a permanência tem sido de até cinco dias, devido a falta de vagas no restante do sistema de saúde.

É nesse tempo de espera por vagas, conforme Luciano, que acontece os óbitos. De acordo com o diretor, na última semana havia no Cais três pacientes críticos, um leito para estabilização e mais um que podia ser disponibilizado na enfermaria. “Não estamos conseguindo encaminhar os pacientes daí para frente porque não tem vagas”, afirma.

Outra dificuldade que surge com o aumento no número de pacientes é a demora no atendimento. Esse tempo de espera acaba gerando tumultos, porque muitos não entenderiam o procedimento que os classifica conforme seu estado de gravidade. Para Luciano, a saúde pública ainda não é considerada ruim ou em estado de caos apesar das dificuldades enfrentadas no dia a dia: “Poderia estar pior, mas também poderia estar muito melhor.”

Para Juliana de Jesus Ramos, que estava esperando para internar seu bebê de seis meses, a situação está crítica. Ela peregrinava com o filho – que não consegue parar com a alimentação no estômago devido a vômitos constantes – desde as 8h para ver o médico e fazer exames. Só na Unidade de Pronto Atendimento (Upa), ela afirma  ter ficado mais do que três horas esperando o resultado de exames.

Na Upa, a situação de aumento na lotação também era visível. Muitos pacientes à espera estavam revoltados com a demora no atendimento. Marcos Antônio Alves buscava atendimento para o tio e já tinha percorrido quatro unidades. De acordo com ele, havia muita desinformação e nos locais onde procurava ajuda era informado que deveria ir a outro lugar.

Valdir Leite Gouveia estava com o sogro de 80 anos esperando atendimento em uma cadeira de rodas. Ele reclamava da demora no atendimento do paciente idoso e hipertenso que reclamava de falta de ar e dores no peito. Conforme Valdir, eles estavam na Upa desde as 14h, mas conseguiram atendimento apenas por volta das 17h. “Meu sogro está aqui há muito tempo, é idoso e não tem preferência para ser atendido.”

A médica Adriana Francisco Silva, diretora clínica da unidade, informou que os pacientes idosos, só por esse fato estão na classificação amarela, mas que se tiver mais 50 pessoas nessa categoria o atendimento ainda será demorado. Ela e a diretora administrativa, Lorena Nunes Mota, explicam que o atendimento mais que dobrou – ultrapassando 60% – e que por dia pelo menos 75 pessoas que chegam ao local são de Goiânia.

Adriana afirma que os profissionais trabalham sob pressão por causa da grande demanda e pela dificuldade dos pacientes entenderem a complexidade da situação a que as unidades estão expostas. De acordo com ela, muitos já chegam sem paciência e tentam ser atendidos mediante agressividade.

A diretora administrativa esclarece que a unidade de saúde tem tentando receber os pacientes da melhor forma possível, com aumento de leitos de hidratação para pacientes com dengue, com tentativas de suprir o estoque de medicamentos por meios mais rápidos que a licitação – que tramita lentamente. “Estamos pegando emprestado medicamentos e insumos de outras unidades, inclusive em Goiânia”, conta.

Para a diretora clínica do Upa, a greve em Goiânia é válida, mas é inconcebível deixar os pacientes morrerem por falta de atendimento, para chamar atenção para a causa. Para ela, o sistema deve ser melhorado na infraestrutura oferecida, que ainda é deficiente, e nos direitos dos profissionais, mas a população não deve ser prejudicada.

Em nota, a Secretaria de Saúde de Aparecida de Goiânia informou que tem trabalhado para atender a demanda depois da paralisação dos servidores de Goiânia. Esclareceu, além disso, que as unidades já estavam sobrecarregadas e que os casos de urgência estão sendo priorizados. Sem negar atendimento, a secretaria pede paciência aos pacientes, “pois enquanto não cessar a greve, as unidades continuarão superlotadas.”

Continua a nota: “Para tentar diminuir a superlotação nas unidades de saúde, como por exemplo, o Cais Nova Era, a Saúde de Aparecida implantou na última sexta-feira (17), uma unidade de apoio para o atendimento a pacientes com diagnóstico de dengue. No caso, os pacientes que recebem o diagnóstico da doença em qualquer unidade de saúde de Aparecida pode se encaminhar para a UBS do Mansões Paraíso para receber os atendimentos posteriores e também fazer a reidratação, caso necessário.”

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