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Trabalho fora não motiva violência

Pesquisadores que estudam criminalidade não veem qualquer relação de causa entre a saída das mulheres para o mercado de trabalho, deixando filhos em casa, e o aumento da violência na sociedade. Declaração neste sentido foi feita na manhã de ontem pelo secretário de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, Wantuir Jacini, informa o jornal Zero Hora.

Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, o secretário afirmou que a família "é um dos problemas" do aumento da criminalidade:  “Antigamente, o pai era apenas o provedor do lar, e a mãe ficava fazendo a educação. Hoje, a mãe sai para prover o lar também, e as crianças ficam sozinhas, ficam na rua, à mercê de todos os criminosos, principalmente nas periferias e nas comunidades”.

Indagado uma responsabilização indevida das mulheres na violência, o secretário reafirmou sua visão: “A mãe tem todo o direito de sair para trabalhar, só que a educação dos filhos tem de ficar com pessoas responsáveis. Não é atribuição da segurança pública fazer esse papel. O papel da segurança pública é cuidar da segurança criminal. A violência social é falha ou falta de outros setores, mas sempre cobram das policias”, ompletou Jacini.

Para o sociólogo Alex Niche Teixeira, vice-coordenador do grupo de pesquisa Violência e Cidadania da UFRGS, partir do argumento de família nuclear como “bastião da ordem” é uma falácia, informa o Zero Hora.

Ele explica que o sentido de “família” a que o secretário se refere é um “mito” e “só diz respeito a uma parcela muito pequena da população”:  “Essa análise sociológica não procede. É um olhar enviesado da conexão entre o social e a ocorrência criminal. Também é largamente machista, por partir do princípio de que o homem é o “provedor” do lar. E o papel do homem na educação dos filhos?”, questiona o especialista.

ESTUDOS

O pesquisador também afirma desconhecer estudos acadêmicos que façam relação entre o ingresso das mulheres no mercado de trabalho e o aumento da violência. Para ele, essa concepção é uma “justificativa para a inoperância” do Estado na esfera da segurança, que deve ser articulada com outras pastas do governo e não focada apenas na atuação das polícias, como definiu Jacini.

“A segurança pública envolve mais de uma ação, não apenas a da polícia. Para dar certo, a política de segurança pública tem de ser articulada em parceria com as áreas de assistência social, saúde e educação”, afirma Teixeira.

O professor Rodrigo de Azevedo, integrante do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUC-RS, também relata desconhecer estudos científicos que relacionem a entrada das mulheres no mercado de trabalho com a violência. Para ele, a fala do secretário foi “uma manifestação extremamente infeliz”.

“A perspectiva que o secretario aponta é inadequada e machista. Essa mudança social aconteceu há no mínimo 20 anos. A falha não é da mulher que sai de casa para trabalhar, mas do Estado que não oferece acesso à educação para as crianças”.

Focar os esforços da pasta em combater a “violência criminal” e deixar a “violência social” com outras secretarias, como indicou Jacini, também é vista como uma ação equivocada.”Países com baixa criminalidade têm políticas de segurança pública aliadas com outras áreas. Essas políticas só dão resultado se foram integradas com assistência social, educação, e até com questões urbanas como saneamento básico”, explicou Azevedo.

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