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POLÍTICA

Angústia da suspeita da morte de filho acabou com Castelinho

  • Rodrigo Lordello morrera em um suposto acidente provocado em Brasília
  • Jornalista assinou por mais de 30 anos coluna política no Jornal do Brasil
  • Ele foi, por 7 meses, secretário de Imprensa da etílica vassoura Jânio Quadros
  • Com alma de repórter, tentou mas não conseguiu ser um escritor de sucesso


- Eles matam pessoas!

Assim o ex-presidente da República João Goulart, um nacional-estatista de linhagem trabalhista que havia sido deposto pelo golpe civil e militar de 31 de março de 1964, no Brasil, afirmou ao jornalista Carlos Castello Branco ao interrogá-lo se havia tentado investigar o acidente automobilístico que matara o seu filho Rodrigo Lordello Castello Branco, em 2 de maio de 1976, na Capital da República, Brasília. Ele possuía apenas 25 anos de idade. Os seus pais, no dia da morte, Castelinho, como era chamado, e Élvia, sua mãe, estavam em Madri.

Em uma conversa regada a Royal Salute, durante o exílio de Jango, em passagem pela Europa, lembrou ao titular da coluna política do Jornal do Brasil [JB]  que não havia limites para o terror. Os exilados aprenderam com o medo, teria afirmado. O diálogo compõe o livro recém-lançado 'Todo Aquele Imenso Mar de Liberdade - A dura vida do jornalista Carlos Castello Branco' [2015], Editora Record, 559 páginas, de autoria do jornalista Carlos Marchi. O autor trabalhou em O Globo, O Estado de São Paulo e já escreveu Fera de Macabu [1988], Record.

Não custa lembrar: em 21 de maio de 1976 morreram, com os corpos crivados de balas, o ex-senador e ex-ministro de Estado do Uruguai Zelmar Michelini e também o ex-presidente da Câmara dos Deputados daquele País do Cone-Sul, que enfrentava uma ditadura civil e militar desde 1973, Héctor Gutierrez Ruiz. Os dois eram amigos de Jango. O ex-ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, "O Pai dos Pobres", que suicidou-se em 24 de agosto de 1954, no Palácio do Catete, sentia-se mais leve e protegido em Londres do que na Argentina.

Em 2 de junho é executado o ex-presidente da Bolívia Juan José Torres. Jango, que despachara os filhos para Londres, queria mudar-se para França ou Espanha. Não teve tempo. Ele morre de forma misteriosa em dezembro de 1976. Antes, em agosto daquele ano, em um suspeito acidente automobilístico, como comprovou a Comissão da Verdade Rubens Beirodt Paiva, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, morrera o ex-presidente da República Juscelino Kubitschek, cassado em 1964 pelo general-presidente Humberto Castello Branco.

- Olhe, acho que você fez mal [em não mandar investigar o acidente do filho  Rodrigo Lordello Castello Branco porque você causou muitos danos a esses militares.

É o que afirmara Jango a Castelinho. O colunista do JB nunca tinha parado para pensar nestes termos, diz Carlos Marchi. Ele guardava suspeitas do episódio e mantinha dúvidas sobre a investigação causada pela polícia. O que se colocava à mesa era que agentes da ditadura civil e militar poderiam estar envolvidos no planejamento e na execução de uma missão de sabotagem para vulnerabilizar o carro do rapaz, de forma a propiciar um acidente programado "A sua pregação democrática constrangia a ditadura e irritava a linha dura", diz o autor.

- Zuzu Angel  teria sido assassinada em circunstâncias semelhantes 18 dias antes de Rodrigo Lordello Castello Branco.

O carro de Rodrigo Lordello Castello Branco  era um Chevette, que capotara no Balão de Dona Sarah, uma rotatória próxima ao Aeroporto de Brasília. Registro: o histórico de mortes no Cone-Sul era assustador, apontava Jango. A Operação Condor estava em andamento, com a participação do Brasil, Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia. Preto no branco: 77 dias depois da conversa com Castelinho Jango estava morto. Apenas o seu cadáver retornava ao Brasil, 12 anos, oito meses e quatro dias após ser deposto por fardados e civis.

- As evidências apontadas por Jango possuíam, sim, encadeamento lógico!

O autor relata 'Todo Aquele Imenso Mar de Liberdade - A dura vida do jornalista Carlos Castello Branco' que Castelinho recebia dezenas de cartas com ameaças enviadas por supostos militares, integrantes dos bolsões radicais do regime civil e militar. As cartas eram enviadas à sucursal de Brasília do Jornal do Brasil, aponta o escritor. Elas foram levadas para o Jornal de Brasília, para suposta reportagem de denúncia. Detalhe: os verdadeiros documentos da vigilância e monitoramento do colunista simplesmente desapareceram.

- O próximo será você, seu filho da puta!

Até os seus pais eram mencionados nas ameaças, Christino Castello Branco e Dulcilla Castello Branco:

- Tudo pode acontecer a eles!

Castelinho não tinha coragem física para enfrentar a crise. "Ele estava perturbado pelos problemas de Jango", aponta Carlos Marchi. Primeiro, Zuzu Angel. Depois, JK. A morte do pé-de-valsa foi estranhamente antecipada por uma boataria 15 dias antes. Em seguida, o próprio Jango. Por último, em 21 de maio, Carlos Lacerda, 'O Corvo'. A morte de Rodrigo Lordello Castello Branco  teve o trágico condão de mudar Castelinho. Ele ficou um homem ensimesmado, que parecia destilar um amargura sem fim e mergulhado em álcool.

- Do nada, começava a chorar!

Nascido no Piauí, na madrugada de 25 de junho de 1920, uma sexta-feira, no nordeste do Brasil, ele deixou Teresina aos 16 anos de idade. Garoto, gostava de jogar futebol e de andar de bicicleta. Em tempo: era o quinto filho de uma cadeia de nove rebentos. Ainda adolescente mudou-se para Belo Horizonte, Minas Gerais, onde cursou Direito. Memória: o seu pai, Christino Castello Branco, foi advogado, juiz e desembargador. Primeiro general a entrar em cena após 31 de março de 1964, Castello Branco era seu primo, meio distante.

Ele, que não gostava de falar em público, entrou em contato com o jornalismo aos 12 anos de idade, no Liceu Piauiense. Com 11 anos havia se matriculado em um curso de datilografia. O curso primário foi realizado no Grupo Escolar Teodoro Pacheco. O secundário no Liceu Piauiense. Carlos Marchi confidencia que ele devorava os livros adquiridos pelo pai. As suas marcas jornalísticas já eram sempre ordem direta e frases curtas e objetivas. Apesar disso, o jornalismo não veio pela vocação, mas pela necessidade, sublinha o seu biógrafo.

Em 1º de janeiro de 1937 Castelinho chega a Belo Horizonte. O homem começa a trabalhar, após ser aprovado em um teste, no Estado de Minas. Polícia, a primeira editoria que passou. O novo repórter policial ganharia 150 mil-réis por mês. Por telefone, cobriu a segunda guerra mundial.  Ele dividia a pensão com Francelino Pereira. O curso de direito foi concluído em 1943. As garras do Estado Novo, ditadura de Getúlio Vargas, de 1937 a 1945, começara a incomodar-lhe. Como à época, tornou-se simpatizante do Partido Comunista.

- Ele balançava entre as teses liberais e os ideais comunistas.

Em 1945 o jornalista deixa Belo Horizonte. Vai para o Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa, capital da República. Neiva Moreira o convida para ser subsecretário de O Jornal, dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, o Chatô. Depois, ele se transfere para o Diário Carioca. No mês de dezembro de 1948, Castelinho se casa com Élvia Lordello. Em 1950, nasce Rodrigo Lordello Castello Branco. Logo depois JK o nomeou procurador do DNER. Sem concurso. Ele ingressa na revista O Cruzeiro, permanece no Diário Carioca e vira colaborador de jornais:

- Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo e A Noite.

Em 1961, com a vitória da etílica vassoura Jânio Quadros, ele assume a Secretaria de Imprensa da Presidência da República. No dia 25 de agosto do mesmo ano, dia da renúncia, ele chega atrasado ao Palácio do Planalto e encontra-se com Roberto Marinho, a quem dá a notícia e recebe um convite para trabalhar em O Globo, que polidamente recusa. Apesar de ter lançado Continhos e Arco do Triunfo, ele percebe que era melhor jornalista que escritor. Em 1962, ele organiza a sucursal do Jornal do Brasil [JB], em Brasília, centro do poder federal.

- Em 3 de janeiro de 1963 Castelinho estreia sua coluna no Jornal do Brasil [JB]. Lá ficaria por mais de 30 anos. Ele morreu em 1º de julho de 1993.

SERVIÇO

livra

Livro: 'Todo Aquele Imenso Mar de Liberdade - A dura vida do jornalista Carlos Castello Branco'

Autor: jornalista Carlos Marchi

Editora: Record

Número de páginas: 559

Ano de lançamento: 2015

Avaliação: Ótimo

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