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Vítima do anticoncepcional

Ano passado, Carla fez sucesso com o vídeo no qual contava sua experiência e alertava outras mulheres a respeito do uso de anticoncepcionais (Foto: Reprodução)

Fernanda Laune

Vítima do uso de anticoncepcionais, Carla Simone Castro, mercadóloga, especialista em marketing, mestre e doutoranda em psicologia criou uma página na rede social Facebook para contar seu caso e buscar mais relatos de pessoas que tiveram problemas com o método contraceptivo. A página da psicóloga já alcançou mais de 78 mil curtidas.

Em entrevista ao Diário da Manhã, Carla conta a sua história. “Comecei a tomar anticoncepcional em dezembro de 2013 para tratar um mioma, por orientação da minha ginecologista”. Ela relata que nunca havia tomado o medicamento por não gostar da ideia de se “encher” de hormônio, mas como sentia muitas cólicas e pela insistência da médica em que seria o melhor tratamento, optou pela medicação.

Carla Castro explica que chegou a questionar a ginecologista após ler a bula do medicamento, pois ao analisar as contraindicações observou a presença de risco de trombose. “Mas como eu não tinha nenhum fator de risco como obesidade, histórico familiar e diabetes, minha médica me tranquilizou”, afirma. A médica chegou a afirmar que em vinte anos de profissão, nunca havia presenciado um caso grave com uso de anticoncepcional.

O problema se deu quando Carla começou a se sentir mal. Ela ficou doente e perdeu a visão por noventa dias. “Eu jamais imaginei que seria o primeiro caso!”, explica. Como era professora de universidade, vários alunos mandavam muitas mensagens querendo notícias. “Eu não conseguia ler tanta mensagem. Tive então a ideia de fazer um vídeo sem pretensões para informar aos amigos e alunos sobre o perigo desta medicação”.

O vídeo da psicóloga dando o seu relato acabou viralizando na internet, foram mais de 160 mil compartilhamentos na rede. Com isso, muitas mulheres que passaram pelo mesmo problema entraram em contato com Carla. Ela comenta que numa semana recebeu mais de cem mensagens. Foi quando ela e Simone Vasconcelos, vítima do mesmo hormônio (drospirenona) criou a página para reunir os depoimentos de todas as vítimas.

Atualmente é Carla quem administra sozinha a página do Facebook: “Vítimas de anticoncepcionais. Unidas a favor da Vida”. “Hoje somamos mais de quatro mil depoimentos. A estimativa é que ocorram mais de dez mil novos casos por ano”, comenta.

“Hoje a única forma que eu tenho de ajudar estas mulheres é continuar informando sobre os riscos e outros fatores associados. A escolha de continuar tomando e poder tomar alguma providência médica em caso dos primeiros  sintomas, elas terão. A decisão de continuar é de cada uma. Estou dando a elas, o direito a informação que eu não tive. E isso me motiva a cada dia a continuar lutando para restabelecer a minha vida”, relata Carla Simone.

Carla comenta da dificuldade em contabilizar esses casos, tendo em vista que no Brasil não existem estatísticas de número de vítimas de anticoncepcionais já que a Anvisa não obriga os médicos a registrarem. “Acredito que dificilmente eles vão registrar, já que ninguém quer formar provas contra si. Não se tem ideia real da dimensão do problema”, enfatiza.

Segundo a publicitária, o sistema da Anvisa é extremamente complexo e dificilmente o cidadão comum conseguirá fazer o relato de casos. Entre os anos de 2009 e 2014 só constam dez relatados. “Depois de nossa ampla divulgação hoje passam de 300 casos relatados, mas está longe de revelar o quantitativo real”, completa.

Exame é necessário, apesar de caro

De acordo com a publicitária a gravidez aumenta em mais de quinze vezes o risco de trombose, portanto ela reforça que as mulheres precisam se proteger. “O que ocorre é uma banalização do uso de hormônios”, enfatiza. Para Carla, o Brasil não incentiva as outras formas de contracepção. “Não podemos trocar uma gravidez por um acidente cardiovascular (AVC)”, reclama.

O órgão de regulação americano Food and Drug Administration (FDA) e outros internacionais alertam desde 2009 sobre os hormônios da terceira e quarta gerações (drospirenona, acelato de ciproterona, gestodeno, entre outros). Segundo Carla Castro, esses hormônios aumentam, em quatro vezes, o risco para trombose. Por isso ela questiona a falta de medidas que devem ser tomadas à respeito do assunto.

“A minha luta diária é pelo direito da informação prévia. Existe um exame que pode detectar predisposição genética a trombose, pois portadoras desta mutação não podem tomar hormônios. Isto está preconizado na cartilha de elegibilidade da Organização Mundial da Saúde para uso de contraceptivos. Se você se descobrir portadora, saberá como se proteger. Mesmo se não for portadora, ainda assim, a trombose pode ser adquirida, apenas pelo uso do anticoncepcional”, explica a publicitária.

Estima-se que 25% da população mundial, possua alguma forma de trombofilia. A publicitária explica que os médicos alegam que o exame é caro e por isso não é recomendado.

Para ela é preciso baixar o preço do exame e não negar as pacientes o direito de se proteger: “Mulheres, como eu estão sendo submetidas a um risco que não escolhemos correr. O risco dependendo da mutação aumenta em 149 vezes. Só que o efeito colateral, não é uma dor de barriga. Estamos falando de doenças gravíssimas, como: AVC, infarto, trombose mesenterica e embolia pulmonar.”

Luta diária

A publicitária Carla Castro mobilizou vítimas de anticoncepcional ao relatar seu caso. A sua página no facebook já tem o acompanhamento de mais de 78 mil mulheres

Carla Castro conta que vive uma luta diária pela sobrevivência, após sofrer a trombose venosa cerebral bilateral ficou noventa dias sem enxergar, além da paralisia do lado direito do corpo durante quarenta e cinco dias. A trombose se desenvolveu  ainda para a má formação artério venosa (MAV), ocasião em que fistulas se abriram nos dois hemisférios cerebrais.

“Passei por duas cirurgias complicadíssimas no cérebro. Na segunda, em julho deste ano, tive uma paralisia da prega vocal direita e hoje tenho dificuldades para falar e deglutir”, afirma Carla ao contar que a sensação que tem é de total impunidade e descaso por parte das autoridades brasileiras.

“Ninguém se responsabiliza. Não foi uma fatalidade. Fatalidade é algo que poderia ter sido evitado. Se minha ginecologista tivesse mencionado a possibilidade dos exames e do risco que eu poderia estar correndo mesmo sem histórico familiar, eu teria tido oportunidade de escolha. Essa informação me foi negada”, completa.

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