Cerca de 80 pessoas participaram de uma manifestação na manhã de sexta-feira (22/12) no Centro de Goiânia. O ato pedia resposta ao poder público sobre o desaparecimento de Kaique Liberato de Melo, o MC Sabotinha, de 17 anos. O ato aconteceu em frente ao Teatro Goiânia, no mesmo dia que completou trinta dias do sumiço do adolescente.
“Não dá pra gente viver em um país onde jovens negros são exterminados todos os dias. Onde alguém entra na casa de uma pessoa e leva esse jovem de 17 anos e não tem nenhuma resposta. Hoje estamos na rua cobrando o retorno desse filho para o lar, porque esse pai precisa desse filho”, afirmou a presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Goiás (Sintego), Ieda Leal, que esteve presente no protesto.
A manifestação criticou não somente a omissão da justiça perante o caso, como também a alta taxa de assassinatos de jovens negros. Segundo o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência (IVJ 2017), em média, jovens negros têm 2,71 mais chances de morrerem por homicídio do que jovens brancos no país. “Para nós, o desaparecimento do Sabotinha é a continuidade desse projeto de extermínio do povo negro no Brasil. Nossos jovens estão desaparecendo, nós temos que fazer um movimento contrário, fazer com que o Estado proteja nossas vidas porque vidas negras importam sim”, declara Leal.
Na pesquisa do IVJ 2017, o estado de Goiás aparece próximo da média nacional, onde um jovem negro tem exatamente duas vezes mais chances de ser assassinado em relação a um jovem branco. Embora todos os dados sejam alarmantes, o estado de Alagoas chama atenção, onde um jovem negro tem 12,7 chances a mais de ser morto por homicídio. “Aqui em Goiânia morreu uma jovem rica em frente a escola no Setor Bueno, há dois anos. Três dias depois caiu o secretário de segurança pública”, relembra a membro da Comissão de Políticas de Formação da Igualdade Racial, do Instituto Federal de Goiás (IFG).
O CASO
Segundo o irmão de Sabotinha, que presenciou o momento do desaparecimento, três homens invadiram a casa do adolescente no dia 22 de novembro por volta das 17h00. Eles se identificaram como policiais, revistaram a casa em busca de uma arma e levaram o jovem, mesmo sem encontrar a suposta arma. De acordo com o irmão, eles disseram que havia um mandado de prisão para o jovem e que a família deveria procurar na delegacia. Os homens estariam um carro descaracterizado.
O caso começou a ser investigado pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) de Aparecida de Goiânia. Em seguida foi encaminhado à Superintendência de Polícia Judiciária, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em reunião ontem com o secretário de segurança pública, Ricardo Balestreri, o pai de Kaique, Jonas de Melo, disse que Balestreri garantiu que “a investigação está bem avançada e que em breve a Secretaria vai emitir uma posição sobre o caso”. O processo foi encaminhado ontem para a Delegacia Estadual de Investigações Criminais (DEIC).
Por telefone, a DEIC confirmou que o processo foi recebido e que deve ser encaminhado na segunda-feira para o Grupo Anti-Sequestro (GAS), que é coordenado pelo delegado Cleiton Manoel. Segundo um dos advogados da família, Alan Hahnemann, a expectativa é de novidade nos próximos dias. “Nós acionamos a Comissão de Direitos Humanos da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] para solicitar uma reunião com o Secretário de Segurança Pública. Ele nos recebeu ontem e estamos confiando no trabalho da DEIC. A expectativa é que nos próximos dias o caso seja solucionado. O secretário garantiu ao pai do Kaique que a investigação se encontra em grau avançado, já no intuito de solucionar o caso”.
Segundo o secretário, apesar do avanço, a investigação é considerada sigilosa e, por isso, não repassou maiores detalhes sobre o processo. O advogado da família concorda. “A gente não aprofundou nos detalhes porque podemos comprometer o trabalho da polícia”, afirma Hahnemann. A equipe do GAS desenvolve as investigações a partir divisão de grupos. Uma parte fica na DEIC, efetuando pesquisas e interceptações telefônicas, outra realiza monitoramento junto à família. Simultaneamente, outra parte dos policiais vai a campo e efetua levantamentos e investigações acerca dos suspeitos.
O MC Sabotinha vinha se destacando no rap goiano. No início deste ano venceu a Batalha do Rei, considerada a mais importante batalha de MCs da região metropolitana de Goiânia. “Hoje o que motiva os meninos que estão começando no rap é saber que um cara igual o sabotinha, goiano, estava representando a cena do rap daqui em vários outros estados”, conta o MC 2K, que também é amigo de Sabotinha e está participando das mobilizações para pressionar a Justiça.
Não dá pra gente viver em um país onde jovens negros são exterminados todos os dias. Onde alguém some com um jovem e não tem nenhuma resposta” Ieda Leal, presidente do Sintego