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Um artista do povo

As obras de um dos maiores nomes da arte goiana ficam em cartaz na Capital até o dia 30 de novembro, com a exposição Raízes do Brasil. Estamos falando dos trabalhos do artista plástico Omar Souto, que na nova mostra apresenta ao público 26 quadros em óleo sobre telas de diversos tipos tamanhos. Os quadros estão espalhados no Espaço Cultural Goiandira do Couto, que está sediado no Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO).

Com uma linguagem simples de um homem interiorano, que passou a infância entre Hetoraí e Itaberaí, é difícil separar Omar Souto de sua arte. “Eu pinto o que eu sou. Uma vez, estava fazendo uma exposição em Brasília, e um jornalista escreveu uma matéria me elogiando, mas no final disse que eu era um grande pintor naif.  Aí eu pensei que ele estava me xingando. È sério isso”, conta ele, sorrindo, e com aquele seu jeito característico de quem está sempre brincando.

Hoje, o artista que completou 50 anos de carreira, já sabe bem o que é naif e também se reconhece como tal. No entanto, revela que estilos, escolas, não são bem o seu foco. “Nunca me preocupei em definir meu gênero e, sim a minha temática. Na minha pintura não tem como eu inventar nada. Eu pinto o que eu vejo do povo”, explica.

Ao pintar ele mesmo, o artista faz um desenho singelo e verdadeiro da rotina e crenças do homem simples do campo ou do interior. Logo, aparecem em suas obras plantadores de cana, cangaceiros e foliões. Com a identidade goiana fortemente ligada à zona rural, não é difícil reconhecer em seus quadros algum parente, amigo ou até a si mesmo.

Foram estas peculiaridades que o tornaram conhecido no mundo, mas Omar não sabe dizer a data exata em que se tornou famoso. Mas, sabe que é. “Às vezes eu vou ao shopping e me pedem autógrafo. Às vezes a arte me assusta um pouco. Quando vejo uma multidão rezando de frente aos painéis da Via Sacra, me pego chorando. Não sei o que é. É muito forte”, revela.

Os painéis da Via Sacra para o artista, que se diz espiritualista e frequenta “todas as igrejas que falam de Deus”, se tornou um dos maiores marcos de sua carreira. Construída em 1988, e incentivada pelo projeto Galeria Aberta, na época em que Henrique Santilo era governador do Estado, a obra frequentemente é listada como uma das maiores galerias a céu aberto do mundo.

E desta grandiosa obra, espalhada pelos 16km da Rodovia dos Romeiros, que separam Goiânia de Trindade, ele guarda muitas recordações. “Uma vez Henrique Santilo meprocurou para acertar o valor da Via Sacra. Como eu tinha conseguido a doação dos materiais, disse que tinha feito o trabalho para o povo. Aí, ele meio que assustado, me perguntou quanto eu queria nos estudos das obras que eram 14. Assim, coloquei os preços dos quadros que vendo. Em seguida fez um cheque, dobrou pôs em cima da mesa e foi embora”, relembra.

No entanto, quando Omar abriu o cheque teve uma surpresa: o então governador do estado havia pagado o dobro da quantia que criador da Via Sacra cobrou. E, assim que pôde, o artista procurou o político para corrigir o "equívoco". “O governador falou: tá errado? E eu disse que sim, que não era aquele tanto e sim a metade. Ele levantou com o cheque me abraçou e disse que era um presente. Mas, não governador e, sim do médico. Disse ainda que eu não tinha consciência da importância da minha obra na Rodovia”, recorda.

Todavia, se próprio artista não reconhecia o valor da arte de Omar, o mundo reconheceu. Seus trabalhos já rodaram o Brasil afora e parte do mundo. Já fez exposições na França, Holanda, México, Estados Unidos e Peru. “Minha primeira viagem internacional foi no México. Foram eu Poteiro e Naura Tim”, recorda.

Quando questionado se aprecia de viajar, ele prontamente diz que sim. Mas, de fato,  que não para muito longe. “Gosto de ir viajar para minha terra natal Heitoraí. Nosso pastel, pão com carne, as almondegas, só tem aqui em Goiás. Adoro isso”, diz.

Ao perscrutar sua carreira, Omar conta se sentir um pintor privilegiado, por, nos últimos 50 anos, nunca ter parado de pintar, esculpir ou moldar. E, quando ele fala nunca, é nunca mesmo. “Todos o dias eu pinto, não sei fazer mais nada além de desenhar e pintar. Às vezes estou andando na rua e pintando um quadro na minha mente”, revela.

É por isso que ele conta que "não sabe se foi ele quem abraçou a arte, ou ela quem o abraçou”.  “Sei que pela arte tenho paixão, então esse abraço não é em vão”, rima ele entre risadas. Mas, este amor lhe gerou alguns problemas. Na infância, o artista sempre era pego desenhando, ao contrário de estudar. “Fiquei 15 anos na primeira série do primário. Não dava para aquilo. Durante as aulas contava piadas e fazia bizura. Na aula de artes, a professora passou a me chamar para desenhar para os outros alunos. Eu parecia mais um grilinho desenhando no quadro”, diz ele zombando do próprio porte físico.

Sua entrada no mundo artístico, ele conta que se deve aos bons encontros que teve. O primeiro, o pintor conta que foi fundamental. “Com o saudoso Caramuru, em Itaberaí, apreendi a dissolver as tintas. Sempre o via pintando”. Mas, quando chegou em Goiânia aos 14 anos vei para trabalhar como pedreiro. Logo pintava casas, fazia letreiros, placas e painéis. Continuava  a fazer quadros, que segundo ele não vendia nada.

Felizmente, sem dúvidas, a carreira de pintor de Omar, logo deu certo. Mas, ele não esqueceu seu lado pedreiro. Esta faceta pode ser vista em obras grandiosas, como as esculturas do Jardim do Diário da Manhã, das cidades de Baliza e São Miguel do Araguaia. Aliás, o próprio ateliê, ele mesmo fez em formato de uma cúpula que tem cerca 20 metros de altura.

“Ajudei a terminar também  a escultura do Templo das Mãos Postas, que possui 30 metros de altura. Fiz seus vitrais e acabamentos. Foi uma obra que me deu muita alegria”, diz ele se referindo a obra que fica na Loja Rosacruz.

A facilidade e gosto por fazer grandes construções é, aliás, um de seus dons favoritos. Ele ousa a dizer até que se acha melhor com a colher de pedreiro do que com os pincéis. “Na pintura eu envelheci trabalhando dia e noite trabalhando em busca da perfeição e quanto mais eu trabalho mais fica longe. Admiro pintores como: Renoir, Hogan e Portinari. Não queria pintar como eles, mas aproximar, mas eu vejo que falta tanta coisa”, diz o pintor da Via Sacra, parecendo ainda inconformado.

No auge de seus 50 anos de carreira, ele conta estar ainda cheio de sonhos e metas: “Quero continuar contribuindo com a cultura, por mais pequena que minha colaboração seja”, revela.

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