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OPINIÃO

Feminicídio: um crime hediondo

Flávia Moraes,Especial para Cidades

Desde os tempos mais remotos, seja por aspectos culturais ou pela resistência de um modelo social machista, a condição simbólica relegada à mulher é de inferioridade.

Isso pode explicar, em tese, a defasagem que ocorre hoje no mercado de trabalho, na política, nos postos públicos e privados de comando e, por outro lado, nos números cada vez maiores de casos de violência, dentro e fora de casa, contra a mulher.

Minha visão sobre a família, a cumplicidade entre o homem e a mulher, as funções que juntos exercem na educação dos filhos – é de crescimento mútuo.

Eu costumo dizer que há no tempo uma resposta para tudo, mas as mulheres vítimas da violência, física e moral, carregam consigo um olhar de tristeza, solidão e medo, como de uma viuvez que não se acaba.

A essa altura matam-se no Brasil cerca de onze mulheres por dia. Não por doença, acidente ou assalto. Elas morrem nas mãos de seus próprios parceiros; aqueles aos quais depositaram confiança no início do relacionamento. O Brasil, nesse quesito, é o sétimo país que mais pratica violência contra mulheres em todo o mundo.

Pesquisa divulgada recentemente pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), sobre a efetividade da Lei Maria da Penha, estima que houve uma redução de 10% na projeção da taxa de homicídio contra as mulheres dentro de casa.

O estudo considerou que, sendo o assassinato a ‘ponta do iceberg’, ou seja, a consequência extrema dos ciclos de violência, a Lei freou um crescimento generalizado de homicídios desde 2006, período em que o texto entrou em vigor.

Por falta de uma tipificação penal específica ou de instrumentos jurídicos que obriguem a designação do assassinato de uma mulher em razão do gênero, ou seja, pelo fato da vítima ser mulher, o feminicídio ainda conta com estatísticas desconectadas da realidade, o que torna impossível apontar uma dimensão real do problema.

Neste mês, entretanto, mais um passo importante foi dado para que a legislação garanta punições mais duras a esses criminosos. Foi sancionada, com o apoio direto da bancada feminina da Câmara e do Senado, a Lei que classifica o feminicídio como um crime hediondo e o inclui no Código Penal como homicídio qualificado, com pena de 12 a 30 anos de prisão.

Além disso, a pena vai aumentar em um terço em determinadas circunstancias: se o crime acontecer durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto; se for contra adolescente menor de 14 anos, adulto acima de 60 anos ou ainda pessoa com deficiência; e se o assassinato for cometido na frente de filhos ou pais da vítima.

É apenas um passo ao longo de uma extensa jornada de combate à violência contra a mulher. Acredito que, nesse momento, o papel da sociedade – das famílias, das Igrejas, das escolas, das instituições políticas e sociais –, é determinante para uma mudança de pensamento.

Parece uma ideia arcaica, mas o preconceito ainda ensina muitas meninas a não serem independentes demais, a não serem fortes demais, a assumirem uma condição futura de inferioridade, muitas vezes submissa aos parceiros e subestimada aos desafios.

O que me conforta, apesar de tudo, é o fato de que as mulheres estão aos poucos se enchendo de coragem. Muito mais que antes, elas vão às delegacias especializadas, procuram os órgãos de defesa e se inteiram da legislação.

Essa coragem, no entanto, precisa ser alimentada por todas, para que a discriminação, o preconceito, a violência e a morte, sejam referências de um passado cada vez mais distante.

(Flávia Morais, deputada (PDT/GO))

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