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Alimentos transgênicos e saúde humana

Maurício Tovar,Especial para Economia

Vírus, bactérias, fungos, plantas e animais, inclusive o ser humano, são essencialmente constituídos dos mesmos elementos químicos – carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo e enxofre –, os demais elementos ocorrem em pouquíssima porcentagem nos corpos dos seres vivos e todas as coisas existentes no nosso planeta, outros planetas, estrelas e outros corpos siderais são formadas por esses mesmos tipos de matéria. Nossos corpos são feitos do “pó cósmico”. Entretanto, a complexidade do funcionamento metabólico de cada célula de um animal, planta ou outro organismo é determinada por sequências de “palavras” (códons), que se encontram na molécula de Ácido Desoxirribonucleico (DNA). São essas palavras do código genético que constituem os genes, sequências específicas de bases nitrogenadas que comandam a síntese de proteína dentro da célula. Esse processo de síntese proteica, juntamente com o sinergismo de moléculas sofisticadas no organismo, é que vão garantir a expressão das características, sejam elas morfológicas ou fisiológicas.

CÓDIGO GENÉTICO UNIVERSAL E FORMAÇÃO DE UM TRANSGÊNICO

Um Organismo Geneticamente Modificado (OGM) também conhecido como transgênico é um organismo que recebe gene de uma outra espécie. A biotecnologia do DNA recombinante, também conhecida como Engenharia Genética, abrange um conjunto de técnicas e tecnologias que possibilitam ao geneticista manipular a molécula de DNA de modo a extrair gene de uma espécie e transferi-lo para outra espécie.  O sucesso dessa operacionalidade, quanto ao propósito de se obter uma característica desejada em uma espécie que não teria o gene específico para tal característica em seu DNA, decorre do conhecimento de que o código genético existente nas moléculas de DNA dos seres vivos é universal, ou seja, um determinado gene, que é um segmento do DNA com “palavras” (códons) específicas para selecionar os aminoácidos que irão compor uma certa proteína relacionada com a expressão de uma característica particular, pode ser transferido para a célula alvo de outra espécie e a síntese da proteína e sua consequente manifestação no organismo será efetivada. Foi com base nessa compreensão que os geneticistas passaram a elaborar os chamados Organismos Geneticamente Modificados ou transgênicos, obviamente com o propósito de se obter vantagens específicas. Nesse campo de pesquisas, as chamadas plantas transgênicas, a exemplo da soja, milho, algodão, feijão e arroz, terão genes adicionados ao seu genoma para expressarem características, a princípio vantajosas, como, por exemplo, aumentar o valor nutritivo do alimento, tornar a planta mais resistente ao herbicida, mais resistente ao ataque de insetos, fungos e bactérias e aumentar a produtividade. Vale lembrar que existem também as plantas transgênicas que expressam o gene de proteínas imunogênicas produtoras de vacinas.

No Brasil, dos 55 milhões de hectares plantados, 40 milhões recebem sementes transgênicas. As mais plantadas são a de soja com 67,2% e a de milho com 31,2%. Atualmente, apesar de o plantio de soja transgênica superar o dobro do plantio de soja convencional, o Brasil é o maior exportador do mundo de soja convencional, e seus principais compradores são os japoneses e os europeus. A Monsanto, empresa multinacional de agricultura e biotecnologia, monopolizou a comercialização da modalidade de soja  transgênica a partir da liberação do plantio em 2005, entretanto, antes dessa data muitos fazendeiros gaúchos, mesmo sem autorização legal, já plantavam sementes da Monsanto, o que contribuiu para o cenário atual de supremacia dos grãos modificados. (M.T)

PESQUISA FOI REALIZADA EM SEGREDO

Apesar de a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) considerar que o glifosato é um agrotóxico de baixo risco, em 2012 um estudo do cientista francês Gillis Éric Seraline assustou o mundo. Ele atribuía ao consumo de glifosato e milho transgênico o surgimento de tumores em ratos. A pesquisa foi realizada em sigilo, envolveu 200 cobaias e durou dois anos. Pouco tempo depois da publicação dos resultados, o governo brasileiro pediu um parecer técnico da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança. Dois pesquisadores da CTNbio e outros dois pesquisadores independentes concluíram que o trabalho de Seralini não era confiável por cometer algumas falhas de procedimentos, entre elas a escolha errada de linhagem de ratos, segundo eles, com propensão a desenvolverem tumores.

Jeffrey Smith, pesquisador respeitado mundialmente e autor internacional do livro Sementes do Engano, ao ser entrevistado no Brasil, no programa Roda Viva da TV Cultura, afirmou que a produção e consumo de alimentos transgênicos oferece riscos à saúde do ser humano e do meio ambiente. O pesquisador relatou que a Academia Americana de Medicina Ambiental divulgou uma orientação no sentido de que a questão dos transgênicos seja considerada com base na política de precaução. De acordo com essa orientação, os médicos devem prescrever aos seus pacientes uma dieta sem alimentos transgênicos, precavendo-se. Também diz que os médicos devem fornecer aos pacientes materiais educativos sobre a saúde relacionada aos trangênicos. Na publicação, é esclarecido que não existem estudos suficientes e que deveria haver etiquetas indicativas de produtos transgênicos aprovados, tudo isso demonstra que o princípio da precaução, em termos de saúde relativa a transgênicos, vem repercutindo nos Estados Unidos entre as organizações médicas.

O maior relatório sobre fome no mundo na área da agricultura, feito pelo International Assessment Science And Technology For Development (IAASTD), com mais de 400 cientistas inclusive com a participação da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), determinou que a Engenharia Genética não possui qualquer relação com a alimentação do mundo faminto e não deveria ser usada no momento na agricultura de países em desenvolvimento. Jeffrey Smith comentou que apesar de o Brasil ter assinado a Convenção da Biodiversidade, que inclui o princípio da precaução, o qual recomenda a realização de estudos prévios epidemiológicos e de impacto ambiental sempre que houver risco à saúde, esses estudos praticamente não acontecem.

Um dos entrevistadores, que compunha a mesa, ressaltou que “no Brasil, quem acha que não é necessário estudos prévios de impacto ambiental ou sobre a saúde, no que concerne à produção e liberação dos transgênicos é visto com bons olhos, é cientista que entende da matéria, já quem acha que é preciso realizar os estudos detalhados é taxado de ideológico”. Ele lembrou que quando a soja transgênica foi liberada para plantio, no Brasil, a legislação era diferente e exigia uma expressiva maioria na Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNbio) e o Ministério do Meio Ambiente chegou a anunciar que votaria pela exigência de estudo de impacto ambiental antes de autorizar o plantio. Estranhamente, quando houve a votação na comissão, o Ministério do Meio Ambiente, mesmo sem o estudo de impacto ambiental, votou também a favor da liberação do plantio da soja transgência. Com intuito de saber o porquê daquela decisão, o jornalista procurou o Ministério do Meio Ambiente, mas foi informado que se tratava de uma decisão proveniente da presidência da república. Na ocasião, o cientista que era o representante do ministério se recusou a votar a favor da liberação e foi substituído. (M.T)

EPIGENÉTICA E EXPRESSÃO GÊNICA

Depois que o projeto genoma foi concluído e publicado, em 2003, houve uma grande surpresa, pois a expectativa era de que o genoma humano deveria conter algo em torno de 140.000 genes, entretanto os estudos conclusivos indicaram apenas 23.000. A partir desses dados, foi possível o surgimento da Epigenética, um ramo da biologia que demontra que o controle da expressão dos genes se relaciona com os alimentos que ingerimos. Nesse sentido, o alimento que ingerimos pode favorecer o equilíbrio metabólico das células ou desencadear processos que contribuam para o desequilíbrio e consequentemente para o aumento de riscos de ocorrência de doenças degenerativas.

A Epigenética coloca em xeque o chamado determinismo genético, pois o silenciamento e a ativação dos genes também está na dependência  de substâncias que ingerimos na alimentação. Mesmo que um ser humano tenha herdado algum proto-oncogene (gene potenciamente cancerígeno), isso não quer dizer que ele irá necessariamente desenvolver um câncer, já que esse oncogene poderá permanecer silenciado, devido a inibidores produzidos a partir de uma nutrição favorável. É evidente que o contrário também pode ocorrer, ou seja, uma alimentação inadequada pode contribuir para a ativação de tais genes, o que nesse caso precipitaria a gênese de um câncer.

No Brasil, nossa legislação estabelece que qualquer produto com porcentagem de até 1% de transgênicos não necessita ser rotulado. Estima-se que o uso de rações de soja e/ou milho transgênicos, usados na alimentação animais para abate, seja amplo, constatando-se, dentre outras modalidades, uma ampla penetração de tais produtos, não obstante a nova visão paradigmática da epigenética e o princípio da precaução, que consideram a ainda importante incerteza sobre a segurança no uso de transgênicos com relação aos mecanismos de controle de ativação ou silenciamento gêneticos. (M.T)

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