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Por que Sarney, há 30 anos, vetou a criação do Tocantins?

Liberato Póvoa Especial para  Opiniãopública

Embora alguns projetos e emendas para a criação do Tocantins tivessem sido aprovados tanto pela Câmara como pelo Senado, o então presidente José Sarney vetou os dois principais, em 3 de abril e em 9 de dezembro de 1985, respectivamente, fazendo desmoronar o sonho de todos aqueles que se dedicaram à secular causa separatista. As razões de seus vetos, segundo Sarney, teriam tido como principais fundamentos, dentre outros, o agravamento das diferenças entre as duas regiões a serem desmembradas e a convocação da Assembleia Nacional Constituinte, que seria competente para tratar daquela matéria.
No entanto, sua negativa em permitir a criação do Estado estava no temor de que, com o previsível desenvolvimento do então Norte de Goiás, a importância do Estado do Maranhão, fronteiriço do novo Estado, sofreria um baque, por razões históricas. No decorrer da História, o Maranhão sempre teve a tendência de anexar a seu território a parte hoje pertencente ao Tocantins, conforme se pode constatar:
Na primeira metade do Século XVIII (por volta de 1730), com a notícia das riquezas, notadamente do ouro, chegada a Lisboa, o rei de Portugal mandou D. Luís da Távora, Conde de Sarzedas, para Goiás, com a incumbência de criar a vila e a Comarca de São João das Duas Barras, pois, em razão das descobertas de ouro, o governador da Capitania do Maranhão estava invadindo a Capitania de São Paulo (a que pertencia o hoje Tocantins), estendendo sua jurisdição para além das fronteiras paulistas.
Entretanto, as restrições impostas pelo rei de Portugal foram insuficientes para atingir o objetivo, pois não impediram de surgirem novos arraiais, e expedições procedentes do Maranhão, que abriam picadas, utilizadas para o contrabando do ouro.
O desvio da produção das minas, em decorrência das penetrações no interior, que poderia redundar em novas descobertas, causou preocupação à coroa portuguesa, fazendo com que o rei de Portugal expedisse Carta Régia em 1730, que proibia a abertura de mais de um caminho para as minas de Goiás, para dificultar as penetrações e permitir uma fiscalização no transporte da produção de ouro; o governador do Maranhão, por seu turno, recebeu recomendações no sentido de abster-se de povoar as proximidades das minas e de permitir a abertura de novos caminhos para elas.
Além das notícias das imensas riquezas minerais nas terras tocantínias, também despertaram o desejo do governador do Maranhão em ampliar seus limites. Para prevenir o desejo expansionista da Capitania vizinha, o conde de Sarzedas criou no Distrito do Tocantins, através de Provisão datada de 15 de fevereiro de 1837, uma intendência para cobrança de captação, administrada pelo Intendente Agostinho Pacheco Teles.
O governo do Maranhão não se deixou levar pelas recomendações da Carta Régia de 1730 e empenhou-se em estender sua jurisdição até as minas do Tocantins, de tal modo, que o Conselho Ultramarino determinou, em 20 de maio de 1739, que o governador do Maranhão não continuasse a estender seus domínios sobre as referidas minas, e mandou dar ciência dessa decisão ao Conde de Sarzedas, através de Carta Régia de 30 de maio daquele mesmo ano.
A grande extensão da Capitania de Goiás era um fator que dificultava sua administração, se não houvesse uma alteração na administração. Aliado a isto, havia as constantes invasões, por parte da Capitania do Maranhão, que adentrava os limites da Capitania de Goiás, fatos que vinham ocorrendo desde a época em que esta pertencia a São Paulo. Esses conflitos de jurisdição eram um motivo de enormes preocupações, pois as minas goianas vinham sendo exploradas pela Capitanias do Maranhão, cujos limites ficavam próximos às regiões mais ricas.
Assim, a criação da Comarca de São João das Duas Barras fora, em grande parte, motivada pela interferência do Maranhão, que insistia em buscar ampliar seus limites, invadindo as terras hoje tocantinenses.
Sendo o presidente Sarney maranhense, seus dois vetos não foram motivados pela alegada competência da Assembleia Nacional Constituinte, mas pelas indisfarçáveis razões históricas.
Foi neste ponto que despontou a figura de Siqueira Campos, com a politicamente explorada greve de fome, e até escondendo nomes de capital importância, deixando como grande herói o ouvidor Joaquim Teotônio Segurado, que foi por ele guindado a expoente máximo (deixando em segundo plano Felipe Antônio Cardoso, Feliciano Machado Braga, Fabrício César Freire, Trajano Coelho Neto e outros).
Segurado, na verdade, era um zeloso português, próspero negociante e dono de muitas fazendas, que visava não era bem a independência, mas a separação da região tocantínia para – como Siqueira – ficar sob sua exclusiva tutela, ditando normas e privilégios, como espécie de propriedade familiar.

(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, escritor, jurista, historiador e advogado. E-mail: [email protected])

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