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OPINIÃO

Corumbá, berço de dois expoentes da literatura (final)

Eurico Barbosa, Especial para Opinião Pública

Corumbaense, Bernardo Élis nasceu a 15 de dezembro de 1915. Sua estreia em livro, Ermos e gerais, contos, aconteceu quando ele tinha 29 anos, 1944 portanto. Foi um grande acontecimento na literatura nacional. Monteiro Lobato se entusiasmou tanto com a qualidade e a originalidade dos contos que dirigiu a Bernardo uma carta de grande repercussão. Diz nela:

Bernardo Élis:

Acabo de ler Ermos e Gerais... Quod abundat nocet. O livro está prejudicado pelo excesso de talento do autor. Como derrama! Parece uma taça de champanha abruptamente cheia demais e que se derrama toda. Se você conseguir disciplinar, amansar, o cavalo bravo do seu talento; e se admitir que um livro não é escrito para nós mesmos e sim para uns receptores espalhados pelo mundo afora e chamados “leitores”, teremos em Bernardo Élis o mais prodigioso escritor do Brasil moderno, o primeiro grande manejador da imensa massa de dores, estupidez crassa e tragédia que é o imenso Brasil analfabeto do interior. Com esse material e o seu gênio, meu caro Élis, você opera em nossa literatura uma revolução ainda maior do que foi na Rússia o comunismo.

Mas tem que fazer uma coisa: admitir que existe a figura do “leitor” e que é para ele que a gente escreve.

A crítica vai sentir dificuldade em analisar teu livro – e vai sobre ele dizer todas as asneiras do farnel. É que o teu livro aberra demais de todos os moldes, e só para os que não fogem aos moldes a crítica não tem gagueira.

Que maravilha, um talento verdadeiro – uma “monstruosidade” como você! Se conseguir domar-se; se puder controlar as suas qualidades, em vez de acentuá-las até o ponto em que uma qualidade se torna defeito; e só admitir o leitor, a grande figura, o sans pareil, o peerless de amanhã será Bernardo Élis”.

A carta de Lobato contém mais alguns tópicos, mas deixo de reproduzi-los porque o espaço de um artigo tem limites fáceis de serem excedidos.

Anos mais tarde Guimarães Rosa também escreveu a Bernardo missiva de que vale a pena transcrever seu texto manuscrito:

“Meu caro Bernardo Élis, foi uma alegria receber os livros, com sua carta de 5 de dezembro. Gostei, imenso, de receber “O tronco” com a mesma viva admiração – de quem se entusiasma com coisa verdadeira, bela, palpitante, nova. E deliciei-me com o Caminhos e Descaminhos. Formidável aquele conto (“aqui, ali, acolá?”) dos índios, da indiazinha com a veadinha. Ninguém em país nenhum, nenhum tempo, parte alguma, escreveu coisa melhor! Obrigado. O mais, o nosso Domingos Félix dirá a você. Adorei conhecê-lo. Tudo o que ele pensa e diz, a seu respeito, confere comigo, com o que sustento e acho. Perdoe o atraso desta. Escreva, sem parar – pedimos. Mas, isto, aqui, é só rápido recado. O Domingos, ao lado, espera-me, proferindo fortes coisas, com o rico tom goiano. Mas – grande, grato, sincero, é o abraço do seu Guimarães Rosa”.

Bernardo reuniu em coleção que ganhou a denominação Alma de Goiás, em cinco volumes, suas obras Ermos e gerais, Caminhos e descaminhos e Veranico de janeiro (contos); O tronco e a terra e as carabinas (romances); Apenas um violão (novela) – As adivinhações do coronel; Caminhão de arroz; A lavadeira chamava-se Pedra, Sua alma, sua palma, Noite de São Lourenço, Talvez uma vida, talvez uma lenda, O bicho (será?); Toque-toque (contos esparsos); Chegou o Governador (romance), Goiás em sol maior (artigos, estudos, discursos); Lucro e/ou Logro (estudos, ensaios, artigos); Jeca Jica – Jica Jeca (crônicas); Os enigmas de Bartolomeu Antônio Cordovil (ensaio literário); Marechal Xavier Curado, criador do Exército Nacional (ensaio histórico); Primeira chuva (poesia); Discursos: Na Academia Brasileira de Letras (posse), Na Academia Brasiliense de Letras (posse).

Foi o único goiano a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras.

Na Academia Goiana de Letras sua cadeira foi a de número 1, cujo primeiro ocupante foi Pedro Ludovico Teixeira. Bernardo foi eleito em 23 de outubro de 1975. Faleceu no dia 30 de novembro de 1997, aos 82 anos.

(Eurico Barbosa, escritor, membro da AGL e da Associação Nacional de Escritores,  advogado, jornalista e escreve neste jornal às terças e sextas-feiras)

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