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OPINIÃO

Elogio à invisibilidade

Leonardo Teixeira,Especial para Diário da Manhã

Neste exato momento inúmeros pais, avôs, mães, avós e tantas outras pessoas exercem o seu papel de invisibilidade no mundo. Dentre um número bem maior de desocupados notáveis, que se caracterizam nas calçadas e praças mundanas, aos diálogos da fofoca, espalham suas inutilidades a outros ociosos memoráveis; há de fato alguns seres de raça e coragem, que cumprem sua missão de trabalhadores, de chefes de família, donas de casa etc.

Algumas dessas pessoas acordam cedo, preparam o café da manhã, organizam a mesa, a casa, lavam e passam roupa, cuidam dos filhos, se aventuram na cozinha, administram uma casa e um lar. Algumas delas fazem jornada dupla, tripla ou quádrupla. Conhecem o valor da luta, na labuta diária de se lidar com o cansaço e com o desgaste do corpo que já não é mais o mesmo.

Elas fazem suas tarefas diárias como formigas invisíveis, sendo solitárias na multidão. Seus filhos sonâmbulos e ébrios de sono mal olham nos olhos, muitos nem sequer agradecem pelo quitute preparado, pelo leva e traz diário.

Incansáveis, falam repetidas vezes como se (com)portar nas diversas atitudes necessárias. Por várias vezes falam sem ser ouvidas, já que os outros estão imersos nos vícios do entretenimento: as telas da TV, celular, jogos e internet. Várias vezes chamam, convocam, pedem, mas ninguém as percebe, por ser assim, de tão atuante: invisível.

O comodismo e a mesmice lhes assegura o status de corriqueiro esperado, de cotidiano plausível. De repente, a presença desses seres tão fundamentais e extraordinários não são percebidas na casa, na porta da escola, no trabalho e no passeio público. Enquanto isso, atores de menor calibre, pessoas de menor peso, viventes e passantes das telinhas, Big Bosta Brasilis e correligionários são visceralmente curiados por olhos alheios.

Se maridos, esposas, netos e filhos não notam esses extraordinários seres que constroem o dia após dia e o lar, pela fé de quem crê, Deus os notam em seus mínimos detalhes: o alimento preparado, a organização e limpeza, o suor do esforço, a concentração, o afinco, a roupa costurada, o botão pregado, o trânsito enfrentado, o filho buscado e cuidado, o banho tomado, o estudo feito, os pequenos e grandes sacrifícios, a tarefa e o trabalho que foram entregues. Invisibilidades perceptíveis aos olhos da onisciência.

É possível que esse trabalho nunca acabe. Como a rotina dos cuidados da casa e da família. É possível que ele mude; em vez de cuidar dos filhos, agora são os netos. Quem busca uma recompensa material ou humana nem sempre encontra. É possível que se colha amor e felicidade. Mas há pessoas ingratas que só fazem disputa e guardam rancor. A humanidade é sortida, às vezes benigna, às vezes desumana.

O glorioso benefício de ser invisível é a distrição, a serena vocação do trabalhador fiel e dedicado que constrói inúmeros palácios sem desfrutá-lo. A invisibilidade é o remédio para o egoísmo, individualismo e egocentrismo. É o que há de melhor contra o orgulho e toda raiz do mal que provém do ego elevado.

Muitas obras são erguidas e concluídas sem que conhecemos de fato o nome dos seus trabalhadores. A Muralha da China levou cerca de 2000 anos para ser concluída. Stonehenge, cerca de 1600. A Catedral York Minster, 252 anos. A catedral da Sé (São Paulo) levou 41 anos para ser construída. A Grande Pirâmide de Gizé foi construída em 20 anos, com cerca de 100 mil trabalhadores. Nenhum deles entrou para a história.

Os invisíveis não entram para a história, pois fazem a própria história da família. Constroem a educação e entendem do zelo, uma das poderosas e mais importantes das cinco linguagens do amor.

Eis aqui o reconhecido elogio aos invisíveis. Mas não queiram ser vistos! Nunca foi fácil trabalhar em silêncio construindo a entidade mais importante da sociedade: família. Sem as formigas construtoras, não há formigueiro. Até a próxima página!

(Leonardo Teixeira, escritor)

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