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OPINIÃO

A ambição capitalista e sua degenerescência

Na segunda metade da última legislatura o noticiário da imprensa se ocupou de um fato em que o curioso se mistura com a surpresa. Algumas mulheres jovens e lindas vindas a Goiânia, não me lembro se de Brasília ou de outro lugar, se fizeram personagens de fatos envolventes de parlamentares estaduais e dos quais ficou a informação de que o objetivo principal delas foi o de propor propinas para finalidades que não ficaram bem definidas. O noticiário chegou a causar respingos de relativo escândalo. Se por um lado tudo terminou sem nenhuma consequência, por outro ficou a entristecedora imagem de que a mais exuberante beleza feminina pode ter atrás de si a perigosa ambição do dinheiro.

Essa constatação infelizmente está aliada à desoladora evidência de que a ambição capitalista degenera o ser humano, como se tem visto pela infindável sucessão de acontecimentos em que a desonestidade se projeta na maior e na mais triste dimensão que a mídia, praticamente em todos os continentes, mas sobretudo no Brasil, tem mostrado de modo cada vez mais crescente.

Quem seria capaz de imaginar que cidadãos até então inteiramente insuspeitos, colocados em postos diretivos de uma empresa com história tão gloriosa desde as lutas pela sua implantação, como a Petrobras, se revelassem tão audaciosos e inescrupulosos que viessem a mergulhar a empresa mais importante do país em situação tal que a sua recuperação, felizmente já em processo de execução, venha a demandar longos meses, talvez anos, para se realizar da maneira almejada pelo povo brasileiro?

Mais que a audácia e a inescrupulosidade tem me impressionado o cinismo desses criminosos cidadãos brasileiros. A tal de delação premiada a cada dia produz, revoltantemente, a mostra em toda a sua inteireza chocante do quanto esses indivíduos têm mau caráter. Pois eles, certamente na esperança de atenuar as suas punições, oferecem relatos com os quais procuram envolver pessoas que têm muito a perder, sobretudo politicamente. Confessam descaradamente os seus crimes, mas sempre a evidenciar o propósito de, na prática deles, envolver nomes com o fito de municiar adversários políticos. Com isto suscitam outros focos cuja exploração política minimize a dimensão dos crimes deles, isto é, dos autores cujas falcatruas a operação Lava Jato vem mostrando ao País.

A ação corruptora de empreiteiras vêm estarrecendo o país e muitas vezes revela-se de maior amplitude que a de pessoas da área política. E, mais ainda, sob esse aspecto se agrava a situação ao emergir a dolorosa verdade de que grandes obras de interesse nacional estão impossibilitadas ou de prosseguir ou de se iniciar, já que os principais empreendedores estão alijados em razão das denúncias contra eles.

A ambição do mercantilismo mostra as suas garras em todas as áreas de atuação humana. Nas últimas 48 horas estourou o escândalo das falcatruas apuradas no âmbito da FIFA – entidade que rege soberanamente os destinos do futebol em todo o mundo. O que acaba de ser revelado já era suspeitado por quem acompanha os acontecimentos do universo futebolístico. Na última semana um dos tópicos do meu artigo intitulado O rebaixamento do futebol refere-se exatamente à desonesta atuação da Fifa e da CBF, em episódio de que resultou a concessão absurda de um título de campeão mundial a um clube brasileiro, por meio do reconhecimento de um mero torneio com a participação de quatro clubes, sem que houvesse a disputa da Libertadores da América. Nesse escândalo resultante de investigações nos Estados Unidos e na Suíça figura o brasileiro José Maria Marin, ex-presidente da CBF. E a esta altura já se sabe que vários outros nomes do nosso pobre futebol – pobre porque os clubes estão quase todos em situação caótica – já aparecem nas denúncias, entre eles os de Marco Polo Del Nero, Ricardo Teixeira e J. Hawilla. Poderão surgir outros.

Mundo político, mundo empresarial, mundo financeiro, mundo futebolístico, enfim todo o mundo representativo do ser humano está a demonstrar que A Selva do Dinheiro – título de excelente livro que Roberto Muggiati traduziu para o português – é uma realidade cada vez mais desoladora.

(Eurico Barbosa é escritor, membro da AGL e da Associação Nacional de Escritores, advogado, jornalista e escreve neste jornal às terças & sextas-feiras)

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