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Menino do Pé Perebento – Extrato Xll

Quando o Brasil foi Campeão do Mundo pela primeira vez, em 1958, a vibração foi tremenda. Ouvíamos todos os jogos no rádio através de uma baita antena que o Potêro, meu “papy”, improvisava nestas ocasiôes especiais. Nas tardes de domingo, reuníamos debaixo do inesquecível “pé de caju” e ao som de músicas da época refestelávamos ao ar livre saboreando o banquete dominical sempre constituído por macarronada, tutu de feijão e guaraná caçula com a tampinha furada com prego. Tudo feito por meu pai, cozinheiro nato e requisitado que detinha um aprimorado e sensível paladar, do qual herdei.  Tanto é que sempre o acompanhava, auxiliando – o, no preparo de banquetes particulares, em toda a cidade, principalmente nas mansôes de famílias abastadas, inclusive também em clubes diversos, como o Sírio Libanes, “Jockey Club” e o “Uberaba Tênis Club”.

O tempero forte sempre foi à tônica maior que acompanhou o meu pai pelo resto da vida; seu paladar e o sabor imprimido aos banquetes era esmerado, e invejado por outros cozinheiros que lhe pediam “dicas e mais dicas”. Era também um bom “Capoteiro”, estofador e tapeceiro nato, manipulando e vendendo suas capas de “selim de bicicleta”, capas de volante, capas de bancos, de veiculos diversos, etc. Também para se virar, dava uma de vendedor ambulante de frutas, principalmente no Natal e Ano-novo.

Na mansão da dona Celuta, na av. Leopoldino de Oliveira, esposa do Adalberto Rodrigues da Cunha que era presidente da ACGZ (Associação de Criadores do Gado Zebu),responsável pela organização dos eventos anuais da Exposição Agropecuaria de Uberaba, todos os anos recebia como hóspede o Presidente da Republica, Juscelino Kubitschek. Meu pai era o cozinheiro oficial e nos levava, eu e minha mãe, para auxiliá-lo. Foi aí que aprendi a cozinhar e também naveguei e aprimorei meu paladar, tanto é que ao longo de minha vida, também cumpri bem com esta herança saborosa, como corroborado por apreciadores do meu tempero (espiritual), exercitado desde a época de rapazinho, onde inclusive fui conclamado a montar um restaurante, ação abortada por motivos profissionais. Em Florianópolis, fiz uma feijoada para mais de 200 magistrados.  Na Praia dos Ingleses, também em Florianópolis, como exercitei exacerbadamente este honroso dote, deixando embasbacados nossa turma do “camping”, como também, turistas argentinos e uruguaios dentre outros.  Meu apartamento em Florianópolis era constantemente sempre requisitado pelos apreciadores do bom tempero de Minas Gerais que por aquelas plagas não existia!

Já como geólogo do Radam BRASIL, incorporado pelo IBGE, fui até convidado para ser entrevistado no Jô Soares, afim de relatar entre outros assuntos, estes esmerados feitos culinários; principalmente a “Suruba do João Minero” ou seja o “Mechidão” verdadeira comida caseira do nosso Triângulo Mineiro. Eram também de minha especialidade, macarronada, tutu, vaca atolada, feijão tropeiro, lombo à mineira, quibebe, arroz carreteiro, “inhock”, feijoada, peixadas, cozidões e inúmeras outras iguarias!

Outra lembrança salutar da infância exuberante que tive do BerabaBão foi quanto à verticalização da cidade. Achávamos que progresso queria dizer prédios de muitos andares. Existia na cidade naquela época, o Cine Metrópole, e o esqueleto inacabado da Empresa “Miranzi Delta”. Quando surgiu a construção do Prédio da Eqüitativa,foi uma euforia só, principalmente para a molecada “Berabense” da década. Hoje sabemos que toda verticalização é abominável, principalmente visualizando e convivendo na Uberaba de hoje, toda verticalizada, o que nos gerou problemas urbanos de toda ordem com reflexos graves como se vê com a canalização do Corrego da Laje na Av. Leopoldino de Oliveira. Perdemos todas as “minas “d’água” do centro. A molecada da época se influenciava muito com a acirrada disputa urbanista com Uberlândia, e não podíamos ficar para trás, sob qualquer aspecto. Vivenciávamos o que tínhamos de melhor, como o pastelzinho da Pastelaria Mineira (China), ao lado da Padaria Central  na  Av. Manoel Borges especializada nos típicos docinhos do “Paderão”, campeão de natação e ex mergulhador, nos seus 120 Kg. Ali degustávamos o melhor pé de moleque moído, doce de leite, ameixa, “suspiros” “sonhos” e outros quitutes que jamais encontrei pelas minhas andanças Brasil a fora. Era da época a balinha chita, início do Doce de Leite Zebu e as garrafinhas de crush, além dos suspiros; a cochinha de galinha, e muitos outros saborosos e inesqueciveis “confeitos” quitutes, tudo de dar água na boca!

Só de lembrar vem o sabor no cerébro e dágua na boca.  Os saborosos Pirulitos vendidos nos tabuleiros furados; Os picolés de “cocoqueimado” do Messias na Praça Dom Eduardo e da Sorveteria no início da São Miguel, defronte o SENAI.  São detalhes de minha infância rica que ficou para trás, mas eternamente presente em nosso farto imaginário atual. Jorge Luis Borges, revirou em seu tumulo de inveja!

(Geol. João José, comendador do Araguaia, ex-professor da UFMG, articulista e cronista do DM, ex-diretor da Femago e Metago, assessor do Governo do Estado e da Prefeitura de Goiânia, detentor do Prêmio de Meio Ambiente Altamiro Moura Pacheco 2014)

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