No começo do ano de 1938, o escritor e folclorista paulista José A. Teixeira esteve em Goiás, a convite do então governador dr. Pedro Ludovico Teixeira. Sua missão era estudar, in loco, o folclore goiano, tendo em vista, segundo suas próprias palavras “ser Goiás o estado mais rico em tradições verdadeiramente nacionais, ainda não deturpadas pela onda europeizante do litoral”.
Visitou dezesseis localidades, sobressaindo-se, pela riqueza do material coletado, as de Morrinhos, Itaberaí, Jaraguá, Ipameri, Goiandira e Santa Luzia; nestas cidades, sua atenção foi centrada, principalmente, em três ramos do folclore: cancioneiro, contos, Lendas e superstições.
O resultado final desta sua peregrinação foi a publicação do livro Folclore Goiano, com duas edições, 1940 e 1958, ambas da Cia. Editora Nacional.
O autor ficou encantado com a figura do cantador de desafios que é a figura central das festas e pagodes do sertão; este é, normalmente, analfabeto ou semianalfabeto, porém possuidor de “poesia esplêndida, com grande expressividade das imagens, além de prodigiosa memória e grande agilidade mental”.
O autor faz referência a uma noitada em Ipameri, a convite do prefeito dr. Frota, quando o cantador Adolfo Mariano, de Goiandira, desafiou um soldado do 6º Batalhão do exército para um desafio acompanhado de viola; a contenda só terminou de madrugada, assim mesmo pela intervenção do prefeito.
Foi, no entanto, em Goiandira, graças à solicitude do então Prefeito, cel. Absay Teixeira que ele, realmente, se aproximou de Adolfo Mariano de Jesus, “homem de meia estatura, moreno, magro, pais mineiros, lê e escreve; sempre com sua viola, toda enfeitada de fitas”.
Foi este homem, cuja fama corria longe, quem escreveu versos sonoros para a memória popular, particularmente os referentes à coluna Prestes e à revolução de 1930; sua moda fornece dados históricos e reacionais da população sertaneja, ante estes dois acontecimentos; alem disso, sua poesia registrou, também, os velhos processos políticos e eleitorais da época, em que imperavam a fraude e a violência.
A coluna Prestes deixou marcas profundas na população rural por onde passava; por quase dois anos Goiás foi o palco das suas atividades revolucionárias e, também, a revolução de 1930, chefiada, aqui em Goiás, pelo dr. Pedro Ludovico Teixeira.
O que Adolfo Mariano tem a dizer, na verdade ecoando o que pensava o caboclo, a respeito da coluna Prestes, eram versos hostis ao movimento, uma vez que a contrapropaganda governamental trabalhava neste sentido.
Por outro lado, o mesmo cantador tece loas à Revolução de 1930, como veremos.
ABC da revolução (resumo)
Coluna Siqueira Campus
Amigu leia estis versu
I presti bem atenção,
Neli queru dar us dadu
Da ultima revolução,
Desde u Piris Du Riu
Até u velhu Catalão.
Muitus passaru nu matu.
O fuguetêru não sabendo
Daquela risulução,
Foi isprementar um fogo,
U povo uvindu o barulhu
Dizia: é revulução
Muita genti em Catalão,
Chegandu naqueli pontu
Dividu aqueles buatu,
Xegô até pru Alcindu Zoroastru di Artiaga
Fugiu levandu a mudança
Puxada numa carrocinha
Fantasiô di operariu
Andandu di olhos vivu
Logu tirô uma linha
levandu a mudança
Dizia: é revulução
Ia fazer barbaridadi
Prifiria ser cativu
I pidindu aos que ficassi
Ninguém dê nutícias minha
moda da
revolução de 30
Desculpi franquezas minhas,
Licença, caro leitor,
Vou rabiscar estas linhas,
Com frases mesquinhas
Di mau improvisador.
Por aqui foi importante
Não vou escrever mentira,
Só achei interessante,
Pois até mesmo os defunto
Deram voto em Goiandira.
Temos em nossa fronteira
Trabalhando com proveito
Sonhor Absai Teixeira
Nosso futuro prefeito
Vae seguir boa carreira
Por ser moço e sem defeito
Eu teria grande orgulho,
Se achasse um dominante,
Fosse Vargas ou fosse Julio,
Que me desse algum pecúlio,
Eu adorava bastante.
Aqui em nosso Estado
Quando soubemos da vitória
Todos que tinham votado
Pelo lado dos Caiados,
Deram as mãos a palmatória
Viva o governo atual
O território brasileiro,
Aliança Liberal
Plano de bravus guerreiro,
Nos livrou de um grande mal
Libertou de um cativeiro.
(Hélio Moreira, membro da Academia Goiana de Letras, Academia Goiana de Medicina, Instituto Histórico e Geográfico de Goiás)