Home / Opinião

OPINIÃO

Cartagena

Como não se apaixonar por seu charme irresistível e por seu calor? Como não se enamorar do seu sol de fulgor inigualável, que parece brilhar mais que em outras plagas? Como não pairar no seu céu de azul mais autêntico que o azul? Como não se cativar por seu clima caribenho e pelo mar que te agarra num amplexo caliente e lascivo? Como não se entregar às águas de Playa Blanca, dum verde-azul paradisíaco, tão puro, tão serenidade, êxtase aos olhos e ao corpo? Como não se deixar dominar por suas grossas muralhas feitas de corais, valorosas, imbatíveis? Como não se pintar com suas cores vívidas, enchendo tudo de vida, de vibração, de energia? E seus sobrados coloniais sem pejo algum de maravilhar? E seus telhados pintando um pedaço do céu? E suas galantes sacadas de madeira? E suas trepadeiras coloridas, enfloradas, florescidas, espraiando-se onde podem, debruçando-se sobre todos, qual que das sacadas brotando em profusão? E suas igrejas enlevadas? E suas cúpulas marcando esse seu céu sem vergonha de arrebatar? E suas ruas que nos tragam inteiros? E suas praças sedutoras? E seus pródigos portais invocando ao ingresso às mansões centenárias? E sua gente, boa gente, povo fascinante? Como não se perder de amor e de volúpia por suas mulheres, desta beleza linda e colombiana? Como não se embevecer com seus deslumbres, Cartagena?

Esta cidade é daquelas que tomam a gente por completo. Que marcam. Que tatuam n’alma seu rogo de singular, seu distintivo de incomparável, por mais que conheçamos outras milhares de cidades mundo afora. Cartagena fica entranhada na carne da gente. Fica eriçada na pele. Suplicando vista às retinas. Correndo nas veias e levando sangue ao peito, e, junta às outras paragens fantásticas do mundo, faz meu coração bater, pulsar neste ânimo de vida, neste sublime de aventurar-me, conhecer e desbravar, neste abastado esplendor de viver, suma glória, que luxo maior não há.

Entrei à cidade amuralhada cruzando um dos enormes portais que transpassam o grosso muro da entrada principal. Aí está a Torre do Relógio. Bela e altiva. Logo ao meu primeiro ingresso para dentro das muralhas, estava ali, na ampla praça que se descortina à precípua entrada, um grupo de dança popular colombiana se apresentando vivazmente, cheio de movimento, harmonia, muito colorido, exuberante, muito regozijo.

Caminhar pelas ruas e praças de Cartagena é um deleite. Coisa das mais agradáveis a se fazer. E vamos apreciando o tesouro arquitetônico, histórico, artístico, humano que guardam as vigorosas e altaneiras muralhas na ciudad vieja. Na Plaza Santo Domingo, que se deita defronte a igreja homônima, abrem-se-nos bons restaurantes e cardápios de delícias caribenhas, em aprazíveis momentos de sentar, conversar com os amigos e com quem ali mesmo se conhece, deixar a vida rolando como ela quer, sem preocupações, sem amarras... E os frutos do mar nos alimentam com os melhores aromas e sabores, enquanto há música típica ecoando a alimentar os ouvidos, alegrando o cerne.

As muralhas e fortes de Cartagena das Índias atravessam os séculos com seu vigor possante, seu corpo indestrutível, suas dimensões invulgares, ante o prodígio do caribe colombiano. Navegando pelos caudalosos mares de amavios da Terra, ávido nauta que é, só meu coração corsário logra trespassar essas muralhas colossais, saquear os encantos da cidade, roubar suas belezas e guardá-las para sempre, devassar a cidadela das emoções irrefreáveis e conquistá-las, tudo, porém, num assalto apaixonado, do tipo melhor das paixões. Sem despojar sequer uma das ricas joias desta moça formosa, graciosa, sensual, cartagenera, também chamada cidade. Dela tudo levo, mas tudo deixo incólume, para que todos os corações corsários, navegantes do planeta, possam também desfrutá-la, ainda que cúpida, amorosamente, com todo o carinho que a moça merece.

Cercando e defendendo a ciudad vieja, são tão imponentes as muralhas, e, não raro, tão grossas, tão largas, que onde outrora militares vigiavam a urbe e afugentavam os inimigos, hoje se assentam donairosos bares e restaurantes, que ofertam uma vista incrível a hipnotizar os olhos e a mente na imensidão do mar, e que ainda compartem seu espaço com os canhões aposentados, no entanto, sempre sentinelas, como que atentos e a postos para qualquer investida de piratas de nefárias intenções...

Cartagena da melhor salada de frutas que já comi, salpicada com queijo ralado. Cartagena do Castillo de San Felipe de Barajas, um colosso de fortificação, guardião protetor da urbe, que levou quase quatro décadas para ficar pronto, impressionante pela construção e pelas vistas que enseja, qual mirante, que inebria. Cartagena das suas carruagens, do bom café colombiano, dos seus artistas, dos seus pintores, espalhando desenhos e cores pelas ruas, quais fotografias das paisagens do lugar, ruas, igrejas, casarões coloniais, permitindo aos viageiros levar um pedacinho da encantada cidade para ver de fora dos olhos...

É uma terra abençoada e feliz. Sabe daqueles lugares que exalam alegria pelos poros? Esse lugar é Cartagena. Exala alegria pelos poros da cidade e pelos nossos, junto com o calor banhando o corpo de suor. Pode-se sentir nesse lugar uma aura contagiante do puro contentamento de viver, de respirar, de deixar-se fascinar pelo que há de belo no mundo. Acho que o sol ali reluzentíssimo potencializa a peculiar energia vital de Cartagena. E essa terra, com todo o seu calor, aquece, anima, enriquece a energia vital dos seus filhos peregrinos, que por ali passam, que partem, mas dali não saem.

(Rafael Ribeiro Bueno Fleury de Passos é advogado, escritor, poeta, cantor e viajante. Colaborador do jornal “O Vilaboense” e articulista do “Diário da Manhã”)

Leia também:

  

edição
do dia

Capa do dia

últimas
notícias

+ notícias