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OPINIÃO

ECA - da utopia à distopia

Gilson Vasco ,Especial para Opinião Pública

Antes de 1989, o Estatuto da Criança e do Adolescente ainda não existia e, por isso, o Brasil estava órfão de uma ferramenta legal que amparasse e defendesse a criança e o adolescente que viviam a mercê da própria sorte. Porém, em 1990, quando essa utopia deixou de ser um sonho e se transformou numa realidade nasceu, ali, o desejo concreto de amparo para essas duas classes. No dia 13 de julho de 1990, junto com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nasceu também o Conselho Tutelar instituído pela Lei 8.069. Os Conselhos Tutelares são órgãos municipais destinados a zelar pelo cumprimento dos direitos da Criança e do Adolescente, conforme determinado no Estatuto da Criança e do Adolescente (artigos 131 a 140).

Passadas mais de duas décadas que o sonho se transformara em realidade, milhares de nossas crianças e milhares de nossos adolescentes continuam completamente desamparados pelas três esferas do poder público, seja federal, sejam estaduais e municipais. Dos Conselhos Tutelares criados Brasil afora, muitos viraram postos de caçadores de colégios eleitorais, onde muitos membros eleitos usam a ocupação que exercem como forma de trampolim politiqueiro, deixando milhares de crianças e adolescentes sem tutelas. Como disse, o descaso é observado em todo o Brasil, mas, não percamos nosso precioso tempo viajando para lugares mais distantes, ao passo que, a problemática também ocorre embaixo das nossas catarrentas narinas, fiquemos aqui mesmo no Estado de Goiás, aliás, nem saíremos da nossa tão contemplada capital goiana, concentremo-nos apenas em Goiânia, uma das mais bonitas capitais brasileiras. Melhor, adentremos somente num dos seus 738 bairros, com um porém: ele possui a maior concentração de crianças e adolescentes desamparados em Goiânia.

Autoridades, senhores, senhoras, senhoritas, rapazes, leitores, jovens, crianças e adolescentes eu vos apresento os Residenciais Jardins do Cerrado e Mundo Novo, bairro localizado na região sudoeste da Capital goiana, criados pelo Governo Municipal, em parceria com o Governo Federal. Atualmente, o empreendimento popular possui ao todo 2. 378 casas e 1. 808 apartamentos. O conjunto habitacional recebeu seus primeiros moradores no dia 1º de outubro de 2009 e hoje se encontra 100% habitado, isto é, cerca de 20 mil residentes, dentre os quais, 8 mil são crianças e adolescentes, é isso mesmo, Senhores Conselheiros Tutelares e demais autoridades, oito mil crianças e adolescentes com idades entre zero e dezoito anos clamam pela ajuda de Vossas Senhorias.

Em seu artigo 2º, o Estatuto da Criança e do Adolescente, lei que rege as ações e reações do Conselho Tutelar, diz que para os efeitos dessa lei considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente o indivíduo entre doze e dezoito anos de idade, sendo assim, oito mil crianças e adolescentes com idades entre zero e dezoito anos, moradores dos Residenciais Jardins do Cerrado e Mundo Novo que deveriam ser legalmente amparados pelo ECA clamam pela intervenção do Conselho Tutelar de Goiânia.

Oito mil crianças e adolescentes das etapas I, II, III, IV e VII dos Residenciais Jardins do Cerrado e etapa III do Residencial Mundo Novo correm sérios riscos de tomarem caminhos tortuosos se o poder público não intervir rapidamente. São pessoas que quando não estão nas escolas, nos bairros longínquos, (já que o bairro não contam com escolas estaduais e as escolas e creches municipais não atendem a demanda) uns ficam presos em casa, uma vez que os pais precisam trabalhar para sustentar a casa, outros soltos nas ruas e, outros ainda, desnorteados sem saber o que fazer, haja vista que o poder público não se preocupa em arrumar uma ocupação para as crianças e adolescentes.

Interessante, senão repudiante é que se criou o Estatuto da Criança e do Adolescente para proteger nossas crianças e nossos adolescentes, não permitindo nem mesmo que eles trabalhassem. Vinte e cinco anos após a criação da Lei nossas crianças e adolescentes vivem abandonadas entregues às drogas, aos bandidos, ao mundo. A verdade é que esse Estatuto da Criança e do Adolecente está virando uma distopia, prefere deixar as crianças e adolescentes livres e soltas para entrarem no mundo da bandidagem a criar políticas incentivadoras oferecendo-lhes cursos de capacitação profissional, práticas de esporte e lazer ou mesmo uma ocupação no mercado de trabalho para mantê-las ocupadas nos horários em que não estão nas escolas. A verdade é que aquilo que nunca atendeu e que continua não atendendo mais a realidade é distopia. É chegada a hora de rever os dizeres dessa Lei, bem como, sua aplicação. É preciso que imediatamente o poder público intervenha a favor de nossas crianças e adolescentes para que elas cresçam e se desenvolvam como homens e mulheres de bem.

(Gilson Vasco, escritor)

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