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OPINIÃO

Sem o Estádio Antônio Accioly, Atlético Goianiense caminha para o seu fim

Não existe nação sem território e, portanto, para se falar em nação de atleticanos é preciso identificar onde ela se territorializa. De onde vêm suas origens e sua tradição. Assim se formam os clubes tradicionais do futebol em todos os cantos do mundo. A torcida é a alma do futebol que, infelizmente, no Brasil, vem sendo substituída por espaços vazios vendidos para as TVs. Por que no Brasil? Porque mesmo tendo transmissão de TVs, o futebol em outros países é sucesso de bilheteria e possui forte territorialidade. Como assim? Os torcedores freqüentam os estádios não apenas e simplesmente para ver aquela determinada partida contra X, Y ou Z. Eles frequentam por tradição, por vocação ao símbolo do clube, por suas cores e por sua territorialidade naquele bairro, naquele lugar. Ali se construiu uma nação de fanáticos apaixonados.

No Brasil também se acha esse tipo de exemplo, podemos pegar os jogos do Sport de Recife na Ilha do Retiro, sempre cheios e energizados pela torcida. O Vitória da Bahia no Barradão. E o que dizer do Santa Cruz no Arruda? O ABC no Frasqueirão? O que esses clubes têm em comum? Deixam de jogar em grandes estádios existentes em suas cidades para se aproximar de suas torcidas e viver o território de cada um em seus respectivos lugares.

Em 2005 estive na reinauguração do Estádio Antônio Accioly, o reduto dos atleticanos goianos. Impressionante que um ano antes, estive no Estádio Olímpico Pedro Ludovico para assistir uma partida entre Atlético X Caldas Novas e não tinha nem 500 torcedores presentes. Mas na reinauguração do Accioly, com arquibancadas móveis e tudo mais, vi um Estádio bonito e colorido de vermelho e preto por todos os lados, 5 mil torcedores numa manhã quente de domingo, para ver um time que estava sendo montado para a segunda divisão do campeonato goiano. Mas ninguém estava ali por conta da qualidade em si do time que estava sendo formado. As pessoas estavam chorando, com lágrimas intermináveis, um sorriso de orelha a orelha e um peito estufado de orgulho de ver o Dragão de volta ao seu território. Assim, eu e os 5 mil atleticanos, naquela manhã, estávamos todos em alegria. O Atlético perdeu o amistoso para o Brasiliense por 3 X 1, mas ninguém estava chateado pelo placar, afinal, o Accioly estava de volta e o time era só questão de tempo.

De 2005 a 2010 não se viu um dia sequer de jogo vazio no Accioly, todos lotados. Em 2006, com a volta do time para o Campeonato Goiano da 1ª Divisão, todos os jogos no Accioly tiveram público maior que os estádios dos rivais em Goiânia, dando ao Atlético o título de maior média de público daquele campeonato. Outro fato interessante do campeonato goiano de 2006 é que nos jogos do Serra Dourada, quando todos pensavam que a torcida iria fazer feio, foram 16 mil torcedores no jogo de volta da semi-final contra Anapolina (e olha que o Dragão perdeu o jogo de ida por 3X1). Serra cheio e torcida vibrante deu nisso: Atlético 5 X 1 Anapolina. Chega a tão sonhada final e a torcida surpreende 44 mil presentes com a torcida rubro-negra lotando a metade oposta às cabines, foi uma grande surpresa para a imprensa local que passou a semana lamentando o Vila não ter ido pra final e que ela seria esvaziada.

Mas de onde veio essa torcida rubro-negra? Da Campininha, do Accioly, do território atleticano. Em 2007 novamente Accioly lotado e Serra Dourada cheio, principalmente na final contra o Goiás e com o título para Campinas.  Sempre que o Atlético iniciou a temporada jogando no Accioly a torcida compareceu ao Serra Dourada. Foram jogos inesquecíveis contra o Vila Nova pela Série C de 2007, com Serra lotado e muita vibração, bandeirões, bandeiras, fumaças e baterias. Em 2008 dois jogos me marcaram quanto ao público Atlético 1 X 2 Itumbiara com quase 8 mil pagantes no Accioly em um sábado chuvoso e Atlético 2 X 0 Brasil de Pelotas com 15 mil atleticanos num Serra Dourada encharcado pela chuva torrencial que caiu sobre Goiânia.

Em 2011 o Atlético vai abandonando o Accioly e, consequentemente sua torcida foi diminuindo e se distanciando, cada vez mais. Com o Accioly destruído, aos escombros novamente, a descrença e tristeza tomaram de conta da alma do torcedor atleticano, é como se o filme se repetisse e as cenas da destruição que estiveram presentes entre o final da década de 1990 e início de 2000 voltassem a rondar as cabeças rubro-negras. Em 2013 um grande suspiro, 16 mil torcedores no jogo da vida pela Série B (que exemplo de amor ao clube essa torcida demonstrou), um dos jogos mais emocionantes da história rubro-negra – Atlético 2 X 0 Guaratinguetá. Mas o público durante 2012, 2013, 2014 foi um vexame total. 5 anos sem o Accioly e sem torcida.

Me assusta a falta de sensibilidade da Diretoria do Atlético. Sensibilidade ou interesses estranhos? Não vou me esquecer que o atual presidente do Conselho Deliberativo do Atlético, deputado Jovair Arantes, apoiou o  então presidente do Atlético no início dos anos 2000, Alencar Júnior, e que foi Alencar que tentou destruir o estádio Antônio Accioly para fazer um shopping, além de querer mudar as cores e o mascote do time, o Dragão. Dizem que foi Jovair que levou Alencar Júnior para dentro do Atlético e apoiou a proposta de fundir o Atlético com o Goiânia, dirigido naquele momento por seu irmão, Ibrahim Arantes. Sorte que os tradicionais dirigentes, torcedores de verdade, estavam por lá. Zenha, Álvaro Melo e tantos outros imortais apaixonados.

Hoje o Atlético está novamente entregue nas mãos de um empresário, que não tem tradição como atleticano, e eis que Jovair novamente é um dos cabeças pensantes desta gestão e mais uma vez vem à tona a ideia de derrubar o Accioly e levantar um centro comercial. O que estará por trás disso tudo? Por que não enxergam a importância do Accioly para a torcida e para o Bairro de Campinas, pois o mesmo é Patrimônio Histórico de Goiânia e do tradicional bairro de 200 anos. O que os fazem acreditar que o Serra ou o Olímpico passarão a ser a casa dos atleticanos? Ou será o fato de pessoas do grupo político do deputado estar à frente da administração das praças esportivas estatais? É isso que os faz pensar que será viável e que o Olímpico vai ser um caldeirão rubro-negro? Afinal quem está envolvido com os projetos tem outras visões. Mas é muito subjetivo para se saber, né?

O Atlético não pode ser desrespeitado por seus próprios dirigentes, que assim o fazem ao cogitar vender/arrendar, se desfazer do estádio Antônio Accioly. O Atlético tem torcida, tem tradição. Mesmo com o menor número de títulos goianos conquistados (Goiás 25, Vila 15, Goiânia 14 e Atlético 13), é o único clube que em todas as décadas disputou títulos e o segundo que mais disputou finais do Goiano (Goiás 41, Atlético 37, Goiânia 25 e Vila 23 vezes). Foi o primeiro campeão goiano, em 1944, primeiro goiano campeão nacional, Torneio da Integração Nacional em 1971, e o primeiro goiano campeão de uma série do brasileiro, em 1990. É o clube mais antigo, fundado em 1937, e do bairro mais tradicional da Capital, bairro mais velho que a própria capital, pois Campinas tem mais de 200 anos.

O fato é que o Atlético sem o Accioly perde a alma, ou seja, sua torcida. Perde sua tradição e se desterritorializa enquanto uma nação de torcedores. Por favor dirigentes, torcida, políticos torcedores, empresários torcedores, não deixem isso acontecer.

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(Ubiratan Francisco de Oliveira é professor mestre em Geografia pela Universidade Federal do Tocantins. Torcedor atleticano e ex-apresentador do Programa A Hora do Dragão que foi ao Ar em 2007 pela Difusora Goiânia)

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