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OPINIÃO

De novo não!

A evidente e incontestável politização do poder judiciário, que afeta a legitimidade do Ministério Público e da Justiça, é tão grave quanto os escândalos de corrupção que afetam o Poder Legislativo e Executivo.
A virulência contra o PT, Lula e Dilma é assustadora. Mais assustadores são os aplausos dos setores mais reacionários, igualando-se aos alemães contra os judeus, manipulados pela mídia capitaneada por Hitler e pelo sobrinho de Sigmund Freud, Eduard Bernstein, encarregado da propaganda nazista e, mais tarde, em tempos de paz, de inventar o conceito de marketing segundo o qual as mercadorias tocam e excitam os poderes irracionais da vida, como o desejo, o prazer e a autoestima. E o fez na terra do tio Sam, levando milhões de norte americano à histeria do consumismo.
Em meio às manifestações pró impeachment, originadas pela vaidade e pelos “obscuros” objetivos do juiz Sérgio Moro, encontram-se pessoas que, mesmo cientes de que o confronto nas ruas encaminha para nos devolver ao ano de 1964, ou seja, tomada do poder pelos militares, insistem nas palavras de ordem como fora Dilma” ou “a casa caiu”, empunhando a irresponsabilidade de contribuir para que realmente a casa caia. É a politização facínora dos despolitizados como bem definiu Maurício Dias em recente artigo publicado na revista Carta Capital, intitulada de “Um juiz sem juízo”.
Se a casa cair mesmo, os reacionários inconscientes, que vão às ruas manipulados pelos conscientes, vão amargar a dor de viver numa ditadura que começou assim: o então presidente Janio Quadros, Jango,vinha enfrentando dificuldades. Os mais progressistas, mesmo sem serem aliados de Jango, iniciaram um movimento para garantir maior governabilidade ao governo. Os mesmos grupos que atuam hoje, atuavam na época. A grande mídia, setores políticos reacionários, grandes empresários, os EUA, todos alimentavam a ideia de que o país estava um caos e que a culpa era do Jango, assim como Hitler dizia que a culpa era dos judeus. Para isso, violavam a Constituição, impediam posses, enfim, usavam qualquer artifício para deixar o governo engessado, limitado; assim como flagrantemente vem acontecendo no Brasil. Marx já percebeu o curioso fato de os acontecimentos na história dos povos se repetirem, uma vez como tragédia, outra como farsa, momento em que os mais antigos, brutais e atrasados comportamentos reaparecem nas autoproclamadas sociedades civilizadas.
A grande mídia encarregava-se de protagonizar o papel de grande vilã, ateando fogo em um grupo político e poupando outros; o mesmo acontece agora. Está nítido o papel da Globo surrando o PT e poupando Aécio, Cunha, e outros, que mesmo já sendo réus continuam com seus cargos totalmente imexíveis, como disse Magre. Mas o Lula não é réu, e nem preciso dizer o que estão fazendo com ele.
Como se não bastasse, a grande vilã trouxe a campo o Poder Judiciário, ensinando-o como atingir uns, mesmo que para isso mande a Carta Magna para o ralo, e a poupar outros. O referido poder, provido de vários elementos vaidosos e loucos por uma fama, o poder só não basta, entra também de cabeça nessa estranha inversão da ordem! Lembro-me do que dizia Gui Debord em A sociedade do Espetáculo. A grande e irremediável redução do ser ao ter e, posteriormente, do ter ao aparecer. O culto narcísico de um mundo governado pela imagem acirra cada vez mais o ódio e a intolerância presente como base da cultura mundial, tanto das religiões e filosofias, como da ciência e do ateísmo, da direita como da esquerda, dos jovens como dos velhos.
A OAB também apoiou o golpe de 1964, agora repete a dose! Como dizia Nietzsche ao fim de sua vida, alguns governantes e líderes institucionais são tão míopes e arrogantes que, ao incitar o ódio entre as classes e às raças, “nem sequer percebem quanta dinamite há entre o céu e a terra”.
Não podemos perder a Democracia, ainda que imperfeita, conquistada com muito sangue derramado nos anos de chumbo da ditadura! Anos de chumbo não apenas para os comunistas e para os pobres, mas para famílias importantes como a do neoliberal Roberto Simonsen, cruelmente perseguida e aniquilada pelos militares e seu bobo da corte, a família Marinho. Quebraram suas fazendas de café, quebraram a Panair e quebraram a TV Excelcior. E adivinha como? Exatamente através de processos espúrios como os instalados pelo juiz Moro. Uma TV muito avançada para uma época em que a televisão dava seus primeiros passos no Brasil. Algo como o que a TV Cultura representa nos dias de hoje. Roberto Simonsen era neoliberal, mas nunca compactuou com a caça às bruxas e leprosos, ou melhor aos comunistas, que se instalou a partir de 64. Chamava em sua emissora figuras das quais se opunha diametralmente, como o ultraconservador Carlos Lacerda. Sua TV se pautava por mais programas culturais e menos comerciais, ao contrário da Globo, que já seduzia a elite a comprar as mercadorias vindas dos EUA e da Europa, como casacos de pele e patins para neve, algo inútil no Brasil, mas útil para inflar os egos dos homens anãos. Sempre lutou pelo reconhecimento da diferença, pelo respeito ao Outro e acabou aniquilado por gente que só enxerga o próprio umbigo e o próprio carecimento egoísta. Que odeia os pobres, os negros, os homossexuais e tudo aquilo que não seja igual a si mesmo.
Defender o direito à democracia que conquistamos com tanto suor e sangue é defender o direito do PT de continuar governando, assim como seria defender o direito do PSDB ou qualquer outro partido que estivesse sofrendo tais ataques inconstitucionais. Isso serve tanto para a direita como para a esquerda que, de modo oportunista, acha que ao derrubar os de cima a qualquer custo irão subir e se tornar a cabeça do mundo. Cairão mais uma vez nos braços do fascismo, exatamente como ocorreu em Weimar, na Alemanha.
Que este mês de março de 2016 não repita o mês de março de 1964!

(Marialda Valente é jornalista e advogada – [email protected])

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