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OPINIÃO

Pedagogia da mediocridade

Há pessoas que se tomam por muito elevadas, mas estão sempre na chapada, dando trombadas na realidade, com sua inapetência para com a verdade. Chegamos ao ponto, na escalada da patologia social, em que nem sempre se acha explicações para crimes brutais – se é que podem existir, à luz da razão e do concebível. Tais atos hediondos e brutais correm por conta da banalidade do mal – que vem crescer, de forma apavorante, em todos os estratos sociais, como resultado da inversão de consciência –, a mesma que, invadindo a área insuspeita e aparentemente inviolável da pedagogia educacional, permite que alunos humilhem, espanquem seus professores, impedindo ao mesmo tempo que estes os reprovem, mesmo que nada tenham aprendido do curso, ou se recusem a estudar.

O descalabro da patologia social começa com a eliminação da promoção por méritos, critério elementar e democrático para a convivência social e profissional. Reprimir o reprovar um aluno indisciplinado ou relapso, desrespeitoso para com seu professor e sua escola é visto como humilhação de parte fraca. A ordem da pedagogia populista de mensaleiros e aloprados é nivelar por baixo – que todos caiam na vala comum da incompetência e da mediocridade.

Trata-se da banalização e universalização da mediocridade (o triunfo da estupidez) que se vê grassar como praga em nosso país, em sabotagem auto-imposta de seu futuro está no romance profético Cartas de um Diabo a seu aprendiz, do escritor irlandês C.S. Lewis. A onda que assinala uma decadência coletiva em nível de patologia social invade não só a educação, mas também outros setores, como o das artes, da literatura e comunicação.

Em seu romance igualmente profético O jogo das contas de vidro, o escritor alemão Herman Hesse fala de um tempo de decadência e barbárie, em que músicos instrumentistas seriam substituídos por máquinas capazes de substituir o piano e, mais: reproduzir o som de todos os instrumentos de uma orquestra. Ele antecipou, em décadas, a invenção do órgão eletrônico – só não pode advinhar que tais trapizonga tecnológica seria tão devastadoramente eficiente que, mesmo sendo capaz de imitar o som de qualquer instrumento, seria ele próprio relegado ao esquecimento, com o aparecimento dos tais DJs, músicos sem talento e sem habilidade, cuja função consiste apenas em produzir ruídos mecânicos e repetitivos, ao fazer girar discos com os dedos, de encontro a uma agulha.

Retornando ao escritor C.S. Lewis e à sua ironia profética: a massificação banalizante atingiria a pedagogia – a educação, nivelando por baixo as possibilidades de ensino e aprendizagem, “seria a mais atacada pela interferência dos técnicos infernais”, como ressaltou Gismair Martins Teixeira, em artigo publicado na seção Opinião, de O Popular: “Segundo Pitafuso, crianças capazes de ler Homero e Dante, por conta da nova pedagogia, são obrigadas a repetir com os coleguinhas “Vovó viu a uva”, e a fazer bonequinhos de massinha, tudo para não traumatizarem os coleguinhas ainda ineptos”.

O superlotar salas de aula, para economizar professores e diminuir despesas, vem sendo a “revolução pedagógica”, posta em prática nas escolas de capitais como Salvador – lugar onde o baixo nível da educação coincide (?) com os altos índices de criminalidade. Trata-se de um verdadeiro arrastão – um arrastar de professores, alunos e a sociedade, para a vala comum do desastre social. Para onde nos levará uma educação que prepara para a inaptidão e a inapetência em relação à fraternidade e ao respeito à vida, que constitui a base da civilização?

(Brasigois Felício, escritor e jornalista; ocupa a cadeira 25 da Academia Goiana de Letras)

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