Home / Opinião

OPINIÃO

Ineficiência energética brasileira

No Brasil faltam investimentos e vontade política para equacionar esse problema. O que não falta são os excessos de tributos e encargos setoriais, que fazem com que o consumidor tenha uma conta alta - uma das mais caras do mundo.

Em setembro de 2012, a presidente Dilma Rousseff anunciou reduções significativas nas tarifas para os consumidores industriais e residenciais, com abatimentos que variaram de 16,2% até 28%, através da Medida Provisória 579.

A medida permitiu que o governo renovasse as concessões das usinas transmissoras e distribuidoras de energia que venceram entre 2015 e 2017. Em troca disso, as concessionárias beneficiadas aceitaram receber remuneração até 70% menor pelo serviço prestado. Mas o governo federal, não dando conta de arcar com a conta, acabou repassando-a para o consumidor, através do tarifaço em 2015 e, agora, com novo aumento.

Atualmente, 23 tributos (PIS, Confins, ICMS e outros) e pelo menos 13 encargos incidem sobre o setor de energia elétrica brasileiro, inclusive a Reserva Global de Reversão - RGR, criada em 1957 e renovada por medida provisória, em 2010, por mais 25 anos. Esse imposto tem a finalidade de arrecadar dinheiro para um fundo destinado a cobrir indenizações de eventuais reversões nas concessões de geração, transmissão e distribuição.

Ele sempre foi destinado para outras ações, pois se o mantivessem para o seu fim, não teríamos agora que custear novo aumento para pagar a indenização às transmissoras de energia, resultante do famigerado e fracassado plano de Dilma de 2012, na ordem de R$ 62,2 bilhões. Este valor será pago ao longo de oito anos, impactando em nossas contas, somente em 2017, em média, 7,17% nas tarifas. Dos R$ 62,2 bilhões devidos, mais de R$ 35,2 bilhões são de juros cobrados pelo calote.

A nossa crise energética tem sido desdenhada nos últimos 15 anos pela falta de iniciativa política. Ficou evidente, em 2001, quando a falta de chuvas e o baixo nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas – que supriam 90% da demanda nacional – fez com que faltasse energia.

Para suprir a necessidade energética, o Brasil investiu na ativação de usinas termoelétricas, movidas a carvão, óleo ou gás. Mas quando as térmicas são acionadas, há um acréscimo de R$ 4,50 em cima de cada 100 quilowatts/hora consumido, ou seja, o consumidor tem adicionalmente, na sua tarifa de luz, esse valor acrescido, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

O problema do preço da energia elétrica brasileira reside, principalmente, na falta de investimentos e na quantidade de encargos e impostos que incidem sobre a tarifa. Somados, eles respondem por metade do preço final cobrado ao consumidor.

Segundo matéria da revista Exame, a bagunça causada pelo governo Dilma e a crise da Lava Jato estão entregando, de mão beijada, o setor elétrico brasileiro a um grupo de estatais chinesas. A State Grid, por exemplo, desembarcou no país há seis anos e tem hoje 7.000 quilômetros de linhas de transmissão em funcionamento e outros 6.600 em construção. Em junho de 2016, a empresa anunciou a compra da participação do grupo Camargo Corrêa na CPFL – distribuidora paulista de energia e uma espécie de “joia da coroa” do setor – e é quase certo que assumirá brevemente 100% da companhia.

Nos últimos cinco anos, os chineses investiram cerca de 40 bilhões de dólares no setor elétrico brasileiro. A China Three Gorges (CTG), que opera a hidrelétrica de Três Gargantas (a maior do mundo), entrou no Brasil em 2013 com a aquisição de ativos da portuguesa EDP — 17 bilhões de reais e três aquisições depois, a CTG é hoje a segunda maior geradora do país fora do sistema estatal. Para vencer o leilão do linhão que transmite energia da usina de Belo Monte para a Região Sudeste, em 2014, a State Grid ofereceu um inacreditável deságio de 38% — a segunda colocada ofereceu 12%.

Segundo Fernando Camargo, diretor da LCA Consultoria, os chineses são praticamente os únicos com disponibilidade financeira, hoje, para viabilizar os grandes leilões do governo brasileiro.

No Brasil, embora tenhamos abundância de água, já esgotamos praticamente nosso potencial para a construção de novas hidrelétricas. O governo precisa voltar os olhos para o desenvolvimento de fontes de energia solar e eólica, e outra tantas que o país tem potencial para explorar. É preciso incentivos de créditos para as regiões com maior necessidade de energia.

O uso de energia fotovoltaica tem aumentado bastante. Somente em 2015, elas aumentaram 34%, e em 2016, 64%, com aumento de 321 gigawatts de energia, liderados pelos Estados Unidos e China. Segundo estudos da ONG World Wide Found for Nature - Brasil, após cinco anos o governo pode ter uma economia de R$ 7,5 bilhão por ano, além de gerar mais empregos.

A energia solar fotovoltaica oferece mais segurança para o setor energético, haja vista que poucas usinas geram a maior parte da energia consumida. Além de minimizar custos, pois a transmissão sempre será próxima do local de consumo.

O jornal Folha de São Paulo, no último dia 24, trouxe a seguinte matéria: “Desperdício consome 10% da energia elétrica do país”. Esse dado refere-se ao ano de 2014, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco). Esses 10% dos 430 terawatt-hora (TWh) consumidos no país a cada ano corresponde a um total superior ao que consome a população do estado do Rio de Janeiro, que alcança cerca de 36 TWh.

Para esta conta estimam-se R$ 12,64 bilhões, sendo que a metade corresponde a perdas geradas por consumidores residenciais; o restante divide-se entre indústria, comércio, serviços e órgãos públicos.

Para Rodrigo Aguiar, presidente da Abesco, existe ineficiência em sistemas de iluminação pública e no condicionamento de ar de hotéis, shoppings e comércio, além dos equipamentos obsoletos em indústrias de menor porte. De todo o consumo industrial brasileiro, 60% estão em motores, e 20% deles têm mais de 25 anos, consumindo mais de 40% de energia que um motor novo de alto rendimento.

Para que o Brasil atinja um nível de eficiência energética com patamares comparáveis aos de países avançados nesse tema, como Japão e Alemanha, é preciso incentivar os grandes empreendimentos industriais e comerciais a modernizarem seus sistemas de utilização de energia, com vistas a reduzir os desperdícios estruturais.

Outro ponto fundamental está nos incentivos tributários para aparelhos que consumirem menos energia (para que tenhamos uma ideia, as geladeiras são responsáveis por 22% do consumo doméstico no país), a par de investimento para a exploração da energia fotovoltaica, dentre tantos outros recursos disponíveis.

Enquanto não houver políticas públicas sérias e voltadas para investimentos futuros, viveremos este martírio de aumentos abusivos nas tarifas e falta de energia, o que trava o desenvolvimento econômico do Brasil.

(Márcio Cecílio, prefeito de São Miguel do Passa Quatro)

Leia também:

  

edição
do dia

Capa do dia

últimas
notícias

+ notícias