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OPINIÃO

Precisamos falar sobre livros, escolas e o encarceramento das bibliotecas

Quando se trabalha com uma mesma função por muito tempo, se acostuma com um determinado comportamento das pessoas, nos acomodamos na atuação profissional pois o ser humano tem essa capacidade de entender as perspectivas a partir das informações que armaze

Quando se trabalha com uma mesma função por muito tempo, se acostuma com um determinado comportamento das pessoas, nos acomodamos na atuação profissional pois o ser humano tem essa capacidade de entender as perspectivas a partir das informações que armazenam como muito relevantes, ou não relevantes.

O problema acontece quando essa acomodação se transforma em conformismo, quando não se é capaz de enxergar os erros, mesmo que eles estejam transbordando a sua frente. Nas escolas, muitos professores e alunos não são diferentes, os comportamentos vão se padronizando na medida que a visão dos professores e alunos sobre a escolas se tornam muito parecida e pessimista, “a escola é precarizada”, logo essa autoavaliação se torna hegemônica e não abre se espaço para se fazer mais nada. Muito menos se pensar em uma solução para a escola pública.

Hoje, as políticas públicas neoliberais na área de educação têm como objetivo, uma perspectiva de escola que cumpra determinado papel de instrução básica, as crianças seriam instruídas com leitura, cálculo e algumas situações que resolvam conflitos sociais e um pequeno preparo para o mercado de trabalho. Nessa visão reducionista, o professor vira um tarefeiro e aplicadores de exames e as crianças e adolescentes se tornam instruídos para responder esses exames, que devem ser contínuos e eficazes para conseguir perceber as desigualdades de conhecimento básicos que o aluno venha a ter.

Mesmo para essa tarefa de princípios básicos, esse modelo de educação ainda não consegue nem ao menos chegar perto de uma solução com vistas a qualidade de ensino. Primeiro porque os índices de leitura no país são extremamente baixos, e os avanços que temos nos últimos anos são bem pequenos se comparados aos necessários para ampliação de conhecimento de um povo. Em pesquisa realizada em 2011 pelo Instituto Pró-Livro, considera que no Brasil o número de pessoas que leem livros com frequência é de apenas 50% dos brasileiros, é um índice menor que os 55% registrados em 2007, mesmo entre professores essa distorção não muda muito. Segundo dados do questionário da Prova Brasil 2011, 21% dizem que leem às vezes e 34% nunca entram em contato com um livro.

Com número terríveis, podemos dizer que para resolver esse problema em todo o país seria necessária uma política pública de grande impacto que ampliasse o número de bibliotecas e acesso aos livros no país, mas a própria escola pode também fazer a sua parte, entre medidas possíveis está a abertura das bibliotecas escolares para os alunos e para a comunidade de maneira irrestrita, para permanência e também para realizar empréstimos.

Algumas universidades (públicas e particulares) aceitam a entrada da comunidade em suas bibliotecas, mas muitas delas não autorizam empréstimos para pessoas da comunidade, apenas para estudantes, professores e trabalhadores da instituição. Nas escolas públicas, acontece os mesmos problemas, muitas dessas não autorizam a entrada da comunidade, e em muitos casos, os próprios alunos das escolas não tem acesso livre para realizar os seus empréstimos.

Uma das justificativas para manter as bibliotecas trancadas e vigiadas se refere a propriedade da escola, se considera que os estudantes não são capazes de cuidar do próprio livro e que a tendência é que se houver empréstimos demais, os livros serão desgastados com o tempo, por isso muitas bibliotecas devem ter livros bem cuidados, mas que raramente são lidos pelos seus estudantes.

Muitas escolas que devido a precariedade institucional não possuem um profissional responsável para fazer os empréstimos, realizar a consulta e ajudar os estudantes, mas uma boa iniciativa poderia ser capaz de resolver esse problema. Tratar o leitor de livros com mais confiança. Já existem escolas que realizam empréstimos na base da confiança, o estudante pega o livro e realiza o registro do mesmo e o empréstimo do livro é feito na biblioteca.

Mesmo que alguns livros possam ser extraviados, uma escola inteira não pode trancar o direito de acesso de alguns estudantes com os livros, mesmo porque esse é um problema de ordem nacional e que atrasa o país inteiro, atrasa o projeto de desenvolvimento de uma cultura de leitores brasileiros.

(João Coelho, filósofo e professor. E-mail: jornalcafil@hotmail.com)