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Pai afasta de mim essa treta, por favor. Senhor, que eu leve apenas aquela saudável polêmica, se que você, caro frequentador de redação, acabou de discutir com o editor por causa da linha editorial do jornal.
Pai afasta de mim os discursos de ódio, onde comentários fascistas justificam tortura como ideia de equivocado de justiça, que eu não caia na tentação de uma simples resposta com dignidade humanista.
Pai afasta de mim a treta velha de cada dia, urgentemente, por favor, porque os tempos estão mudando e o lead e sublead têm sentido golpista e pró-mercado, a mesma ideologia que o dono da firma tem. Vê se pode um negócio desses.
Pai, o verdadeiro patrão nosso, meros operários da palavra, é o leitor, não o dono do jornal. Sem leitor não há sentido em haver jornalismo. Ora, a notícia precisa chegar ao conhecimento do público. Pena, pena mesmo, que isso que disse há pouco é apenas bonito. Sim, é bonito porque é teórico, Pai.
Pai, agora, só por hoje, não cairei em tentação, nem mesmo aquela máxima que impera nos botecos: só mais uma, vai.
Pai, fazei com que eu procure silenciar-me mais, ao invés de arrumar tretas por reacionários por aí. Não vale a pena, mas ainda não consegui compreender por que um infeliz tem inclinações à direita, sendo pobre.
Pai, afasta de mim esse post, as redes social tornaram-se um antro de ódio gratuito. Por mais frases inteligentes de Nelson Rodrigues, um conservador nato, mas elegante no trato com o vernáculo.
Pai, se Deus está morto, conforme salientou Nietzsche no século XIX, tudo é permitido. A frase mais famosa, atribuída erroneamente ao mestre russo Dostoievski, dá-nos sentido à vida. Ora, tudo é permitido, saca?
Pai, recentemente, o gênio da dramaturgia brasileiro Ariano Suassuna faria 90 anos nesta semana, caso fosse vivo. Ele morreu orgulhando-se de nunca ter mexido na internet, e dizia como um Miguel de Cervantes: “A humanidade se divide em dois grupos: os que concordam comigo e os equivocados.”
(Marcus Vinícius Beck, escritor)
