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POLÍTICA

Ódio na internet criminaliza a política

Josefh Goebbels, ministro da Propaganda da Alemanha Nazista, dizia que "uma mentira contada mil vezes se torna verdade". O reinado do terror do III Reich de Adolf Hittler mostrou que isto é realmente possível. As redes sociais, 70 anos depois do final da II Guerra, provam, mais uma vez, o poder do ódio e da mentira como armas de propaganda política.

O ódio e a dissiminação de boatos nas redes sociais chamam cada vez mais a atenção de psicólogos, sociólogos, advogados e dos governos. "O perfil das redes sociais mudou", diz ao jornal Valor Econômico Celso Figueiredo, professor de Mídias Sociais da Faculdade Mackenzie. Segundo ele, a polarização entre PT e PSDB nas últimas eleições acabou descambando na internet para troca de acusações entre simpatizantes dos dois grupos, com uns chamando os outros de "coxinhas" e "petralhas".

O sociólogo Alberto Carlos de Almeida, autor do livro A cabeça do brasileiro, também estuda o fenômeno da radicalização nas redes sociais, mas alerta que a criminalização da política, presente na web e no noticiário de grandes redes de televisão, rádio e jornais, está desinformando e deseducando os eleitores. Ele relata ao Valor que os manifestantes que foram às ruas em março e em abril, dificilmente atingirão um objetivo, pois tem em comum a repulsa aos partidos e aos políticos.

Alberto Carlos lembra que nas jornadas do Diretas Já, nos anos 1980, havia um objetivo claro e agentes políticos definidos, onde o PMDB foi protagonista das campanhas pela volta da democracia com a eleição direta para presidente da República. No impeachment do presidente, o PT protagonizou o movimento pela saída do presidente, o que veio ocorrer em setembro de 1992. Em 2015, as faixas pela volta da ditadura e o repúdio ao jogo político lançam as manifestações no vazio, e talvez seja por isto que estão sendo reduzidas.

Boatos e desinformação

Levantamento feito por pesquisadores da USP e da Unifesp, com apoio da Fundação Ford, trouxe dados estarrecedores. Em primeiro lugar, a completa desinformação e o absurdo analfabetismo político dos manifestantes que foram às ruas em São Paulo no dia 12 de abril. Em segundo, a capacidade destrutiva das redes sociais, quando usadas em prol da propagação de boatos.

De acordo com o levantamento, o Facebook (47,30%), o Watssap (26,60%), os blogs (14,20%) e o twitter (6,70%) são as redes sociais mais utilizadas pelos manifestantes para se abastecerem de informações. É através destes meios que aqueles que protestam se abastecem de tudo quanto é boato e distorção. Conforme a pesquisa, 64% acham que o PT quer implantar um regime comunista no Brasil, 71,3% creem que o filho de Lula (Fábio Luis) é sócio da JBS/Friboi; outros 53,20% estão crentes que o PCC é braço armado do PT; 70,90% (pasmem!) dizem que as cotas contra o racismo geram mais racismo(!) nas universidades e 42,60% acreditam que o PT trouxe 50 mil haitianos para o Brasil para votarem em Dilma (?!).

Os boatos têm sido multiplicados com o uso de trolls (perfis falsos nas redes sociais) e de haters (odiadores, pessoas que utilizam perfis falsos na internet para propagar ódio). São eles que propagam sandices a de que o programa Bolsa Família serve para tornar as pessoas preguiçosas. Esta tese, segundo a pesquisa da USP, foi aceita por 60,40% dos manifestantes que foram às ruas no dia 12 de abril. São estes mesmos boateiros que plantam a ideia (aceita por 85,30% dos pesquisados) de que os desvios da gangue de diretores da Petrobras é o maior escândalo da história do País. Maliciosamente, estes trolls escondem de seus leitores que a Operação Zelotes, da Polícia Federal, desbaratou uma quadrilha que desviou US$ 19 bilhões em sonegação de impostos, ao passo que os prejuízos na Petrobras não chegam a R$ 6 bilhões.

A amostra aa USP confirma que 77,4% dos que participaram dos protestos se declararam brancos. Também estão longe de ser pobres: 28,5% ganham entre 7,8 mil e 15 mil por mês e 19,5% ganham acima de 15 mil por mês.

A pesquisa entrevistou 571 manifestantes na Avenida Paulista, em São Paulo, onde houve a maior aglomeração de pessoas. A margem de erro é de 2,1. "São basicamente pessoas de direita, mas surpreende que, apesar de terem nível superior, possuem um nível de desinformação política altíssimo, o que é assustador", diz Esther Solano, professora de Relações Internacionais da Unifesp, uma das coordenadoras da pesquisa.

Síndrome de Hulk

Matéria no caderno EU&Fim de Semana, do jornal Valor Econômico, publicada na sexta-feira, 17, confirma a força do ódio nas redes sociais. A psicóloga Beatriz Breves, que já foi vítima de uma campanha de difamação no Facebook, transformou a experiência dolorosa no livro A maldade humana: como detonar uma pessoa no Facebook, feito em parceria com a amiga e também psicóloga Virgínia Sampaio. Beatriz foi vítima do boato de que tinha maltratado um gato no seu condomínio. Numa velocidade assustadora, mil pessoas curtiram a página do agressor. Seu caso foi parar na polícia, e ela recebeu visitas até de representantes da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Levou muito tempo para reconhecer o agressor e levá-lo à Justiça, mas as sequelas do caso continuam até hoje.

Para Aurélio Melo, professor em Psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, "a internet é representante de uma verdadeira sociedade sem fio, (...) a natureza de convivência humana é muito frágil. Todo mundo espia todo mundo, mas não há fios entre as pessoas. Você pode aparecer e desaparecer quando quiser". Com este anonimato o agressor se sente livre para manifestar seu ódio, sem risco de seu comportamento ser reprovado socialmente.

Mas não são apenas haters e trolls que assumem caráter doentio na internet. O psiquiatra Jairo Bouer identifica outro comportamento que ele batiza de "sindrome de Hulk". Assim como o médico, que e o alterego dos personagens em quadrinhos, certos usuários das redes sociais, também se transformam em monstros. "Impotentes diante de um problema, sem condições de usar sua capacidade argumentativa, ele parte para o uso da força. A frase repetida pela criatura verde é a mais adequada a este tipo de delinquente da web: Hulk esmaga!".

Preocupados com os ataques na internet, governo e sociedade civil se mobilizam. A presidente Dilma Rousseff (PT) lançou na semana passada, em parceria com o Ministério Público e o Poder Judiciário, uma espécie de "Ouvidoria na Web", com o site HumanizaRedes, que coleta denúncias de agressões na internet. As penas para trolls e haters ainda estão mais restritas ao pagamento de indenizações, a maioria na forma de cestas básicas. A legislação ainda é falha para tipificar esta nova modalidade criminosa, mas com o debate de acalorando, os legisladores devem agir para tapar esta lacuna, que ameaça as regras de convivência entre as pessoas, e até a própria democracia. (Com informações do site da USP -http://www.lage.ib.usp.br/manif/, jornal Valor Econômico, e do Blog Socialista Morena).

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