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Minha casa é a barricada - Bakunin, a personagem histórica da ação

Ian Caetano, Especial para Diário da Manhã

“Em nenhuma parte houve, há ou haverá um monumento para Bakunin, não serviu e não serve de clichê ou modelo da direita ou da esquerda; assim sendo, salve o exu da revolução!” (Sergio Queiroz, autor da biografia Bakunin – Sangue, Suor e Barricadas)


No próximo sábado, 30 de maio, fazem-se os 201 anos do nascimento deste russo que até hoje é celebrado como um dos grandes revolucionários do Século XIX.

Bakunin nascera no 30 de maio de 1814, em província chamada Tver, Rússia, ainda sob o regime Tzarista. Embora filho de família da velha nobreza, o pai de Bakunin morara, considerada parte da vida, fora da Rússia, sendo um homem mais voltado aos costumes liberais que aos aristocráticos.

Bakunin e seus dez irmãos e irmãs foram criados em um ambiente de costumes ocidental-liberais, educados em contato com o francês (que era a única língua na qual, na juventude, Bakunin escrevia), alemão, inglês e, evidentemente, russo. Em 1825, algumas conspirações contra o tzar são postas em movimento, o que gera retaliações profundas. Temeroso por seus filhos, o pai de Bakunin envereda a educação destes, antes liberal, a uma educação mais subserviente ao tzarismo russo.

Nesse contexto, Bakunin é enviado por seu pai à Academia de Artilharia. Aos dezessete anos, em 1833, é promovido a oficial; neste período, tem contato com diversos povos submetidos ao tzarismo dentro dos domínios do império, contato que é importante para a formação de seu caráter militante. Durante uma missão do exército, ele abandona as tropas e volta a Moscou. Lá começa a ter contato com o pensamento filosófico dos “hegelianos de esquerda” (grupo ao que, à época, filiava-se Karl Marx).

Neste contato, apaixona-se pela filosofia e decide-se pela carreira acadêmica, o que o faz marchar rumo a Berlin, onde frequentará diversas aulas de Filosofia. No contato com a prática filosófica dos hegelianos de esquerda e com as lutas sociais que eclodiam por toda a Europa, Bakunin começa o costume que o acompanhará por longa parte de sua vida (inclusive abandonando o interesse acadêmico), o de saltar de lugar a lugar vendo e participando de insurreições.



Um dos exemplos é sua ida a Paris quando da proclamação da república: “Levantava-me às cinco ou quatro da manhã e dormia às duas da madrugada, em pé durante o dia inteiro, indo a todas as assembleias, reuniões, “clubs”, passeatas, manifestações; via todo mundo e não via ninguém, pois cada indivíduo se perdia na multidão errante e anônima; falava com todos sem depois lembrar das minhas palavras ou as dos outros, pois a atenção era absorvida a cada passo por fatos e coisas novas, pelas novidades imprevistas...”

E é participando de uma insurreição em Dresden, em 1849, que Bakunin é preso, condenado à morte por diversos tribunais e fica um longo período encarcerado (onde, dentre diversas outras mazelas, adquire escorbuto, que lhe desfalca quase toda a dentição). Em 1857, é autorizado a pedir indulgência ao tzar, o faz no mesmo mês e, ao invés da morte, é transferido à Sibéria; de onde foge para prosseguir sua vida militante.

Bakunin, uma das “pedras fundamentais do anarquismo”, só surgiria dai há algum tempo.

Este russo é uma figura controversa, boa parte desta controvérsia se dá por suas disputas com Karl Marx, dentre as quais a mais destacada é certamente as acirradas oposições entre eles dentro da Associação Internacional dos Trabalhadores.

Para alguns, é o grande opositor ao “tiranismo” de Marx dentro da Internacional. Para outros, era um arrivista irresponsável que pôs bastante coisa a perder dentro desta organização por conta de suas ações. Estas discussões têm profunda relevância histórica, mas, por vezes, são articuladas de forma que ofuscam outros dados também importantes.

FRUTÍFERO E POLÊMICO

Bakunin era, de fato, um “homem da ação”. Foi diversas vezes preso, participou de diversas insurreições e, embora este não seja seu lado mais frutífero, polemizou teoricamente com diversos pensadores e militantes de seu tempo.

Seu pensamento e sua história deram origem e, até hoje, inspiram diversas correntes do pensamento anarquista. Os limites de seu pensamento e de suas proposições devem ser analisados à luz deste fato, ele ainda é um autor que desperta interesse em diversos segmentos de movimentos sociais.

Critiquem-no ou adorem-no (filio-me fortemente aos primeiros), não podemos negar a história, se ele ainda encontra lugar nela por meio de seu legado, devemos nós legá-lo crédito.

Bakunin2

Muito da confusão, que se faz do autor, deve-se, em certa medida, à debilidade editorial, uma vez que suas obras são publicadas dispersamente, muitas vezes em fragmentos, e são poucos os lugares (a Espanha é um raro exemplo), onde suas obras receberam um tratamento editorial mais robusto. Mas o grande fator é, por certo, o caráter caótico da escrita do próprio autor. Como um “homem da prática”, seus textos eram envoltos na lógica do contexto imediato, curto, feitos aos arroubos e, por vezes, com digressões completamente escapadas do projeto inicial do texto.

É deste autor que estamos a falar, um homem que não se cabia no papel, pois seu ímpeto não era o de apresentar um sistema coerente, mas o de hipostasiar no papel o fogo que via nas barricadas.

“Sou um amante fanático da liberdade, considerando-a como o único espaço onde podem crescer e desenvolver-se a inteligência, a dignidade e a felicidade dos homens; não esta liberdade formal, outorgada e regulamentada pelo Estado, mentira eterna que, em realidade, representa apenas o privilégio de alguns, apoiada na escravidão de todos; (...) só aceito uma única liberdade que possa ser realmente digna desse nome, a liberdade que consiste no pleno desenvolvimento de todas as potencialidades materiais, intelectuais e morais que se encontrem em estado latente em cada um”.


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