Home / Cidades

CIDADES

Super heróis do mundo real

Wellinton Carlos
Rariana Pinheiro

Diversos desafios da vida são piores que a kriptonita para o Superman e mesmo sem superpoderes é preciso ir para o “alto e avante”. Quando os problemas são relacionados aos filhos, então, muitos pais são capazes de enfrentar qualquer inimigo, passar meses no hospital, perder noites de sono de preocupação. Outros conseguem esperar, segurar o amor e ansiedade para, enfim, terem a chance de ser pais. Tendo em vista tantas histórias emocionantes envolvendo paternidade, neste Dia dos Pais, o DM registra histórias de alguns deles que, pelo amor aos seus rebentos, se tornaram “super-pais”. 

O lavador Alaor Moreira, por exemplo, hoje aos 82 anos, exerce heroicamente a função de pai. Ele tem oito filhos. “metade homem e metade mulher”, como diz. Logo após dar a luz à última filha, Cleide Moreira, sua mulher, Maria Eleonoura da Silva, morreu. Sendo assim, Alaor, aos 40 anos, seguiu em frente e sozinho na criação dos filhos e não achou difícil.

 “Graças a Deus consegui criar todos. E estão bem encaminhados.  Não teve algo que achei muito sacrificante, mas uma das minhas maiores preocupações era educação de todos e sempre trabalhei e nunca nos faltou comida”, conta.

De acordo com sua filha Cleide, apesar da vida dura, Alaor sempre foi um ótimo pai e nunca faltou amor e respeito. “Meus irmãos sempre apoiaram muito depois da partida de mamãe, mas ele sempre fez de tudo pra não nos deixar faltar nada. Lembro todos os dias da frase que o papai me falou quando ainda era criança: ‘filha nunca faça com ninguém o que você não quer que façam com você, seja sempre humilde com as pessoas’”, recorda.

"Meu pai é o meu porto seguro", diz Cleide, sobre Alaor, o lavrador criou 8 filhos sozinho.

Filho do coração

Isaque, que foi abandonado bebê na véspera de Natal, realizou o sonho de Ismael Carvalho de ser pai.


Já o desejo de Ismael Carvalho de ser pai de pelo menos uma criança transformou a vida de seu filho Isaque, hoje com 6 anos, para sempre. Ismael e a esposa, a professora Priscila Carvalho, após enfrentarem problemas para conceberem um filho biológico, procuraram o Cadastro Nacional de Adoção. Passaram por todas as etapas que envolvem cursos e entrevistas e aguardaram, com expectativa, a chegada do filho.

Após quatro anos de espera, conseguiram adotar Isaque quando tinha apenas 2 meses. Porém, apesar da pouca idade, o bebê já carregava consigo uma história triste. “Ele foi abandonado na véspera do Natal. A notícia repercutiu muito na imprensa e, desde quando ouvi sua história, senti algo no meu coração, que ele seria meu filho”, recorda Ismael.

A intuição se concretizou e os três vivem uma vida em família intensa, com direito a viagens, passeios e muito amor. “Estamos sempre juntos”, diz. Com acompanhamento psicológico, o menino sabe que é adotado e, aos poucos, pretendem contar toda história de sua chegada ao mundo. “Ele sempre fala que a barriguinha da mamãe estava dodói e por isso ele veio do coração”, conta demonstrando emoção.


A jornada dos vencedores
A construção da família historicamente sempre dependeu da figura de um pai forte. Na antiguidade, família, do latim famulus (escravo, propriedade), era um domínio do homem - que mandava nos integrantes e punia quem se sujeitava. Julgava e matava.

É na modernidade, com o desdobramento do conceito do amor, que passam a surgir pais que abrem mão do domínio total dos 'escravos' e se envolvem emocionalmente com os filhos. A luta do biólogo Charles Darwin pela vida da filha Emma, falecida em 1851, marca uma era em que os pais se dedicavam apaixonadamente pelas crias.

Relatos de dor de Darwin correram o mundo naquele século, tamanha a disposição em defendê-la da escarlatina. A sociedade científica temeu perder, isto sim, o 'pai' junto com a filha. "Perdemos a alegria da casa", disse Darwin cuja dedicação de tempo à ciência rivalizou com sua desesperada busca de cura para a menina de dez anos.

O pai herói moderno tem a mesma obstinação daqueles casos que despertaram curiosidades no século 19. O designer e programador Leonardo Duarte da Fonseca Neto vive sempre um sufoco: cuidar de dois filhos portadores de autismo e trabalhar.

Apesar da contrapartida emocional da esposa e auxílio da família, são sempre os três ( pai e dois filhos) contra o mundo que vive em um ritmo alucinado, sob a égide da desinformação, do dinheiro e do preconceito."Ser pai é, principalmente, cuidar, observar, ser exemplo e muitas vezes abdicar do que queremos em prol dos nossos filhos", diz ao DM.

Leonardo afirma que sua vida ganhou um "novo propósito" após ser pai. "Ser pai também é ser parceiro da mãe. Dividir as responsabilidades não apenas em meio a meio, mas em cem por cento da sua parcela de responsabilidade", analisa.Seu exemplo é de pai herói, já que os relatos, geralmente, são de pais que abandonam.

O programador não tem medos no presente. Mas guarda temor para o futuro, talvez o mais compartilhado pelos 'heróis' mortais: "O meu maior medo é não conseguir preparar os meus filhos para seguir quando eu não estiver mais aqui". No agora, que realmente importa, a proteção e orientação são constantes nas vidas de Arthur e Elisa.

Esperança
Leonardo não teme dificuldades. Para elas, reserva fé e esperança de que tudo sempre dará certo. "Eu quero o melhor para os meus filhos e o autismo adiciona alguns desafios". O primeiro deles - diz o papai - é o julgamento das pessoas por falta de conhecimento ou preconceito. "A criança autista, muitas vezes, se expressa, percebe e sente as coisas de forma diferente".

Ele diz que o diálogo é mais difícil: "Nem sempre sei se os meus filhos compreenderam o que foi dito, principalmente o Arthur, que tem um grau mais elevado de comprometimento da comunicação".

E qual recompensa diante tantas lutas? "Chegar em casa cansado e ser recebido com um sorriso pelo Arthur, ou com um grito de “Papai” e um abraço da Elisa".

Coragem

Com filhos na UTI por nascimento prematuro, o jornalista Johnny Cândido dormiu por meses no hospital.


O pai medieval abandonava os filhos - talvez como muitos ainda fazem em pleno século 21. Mas com diferenças: no passado imperava a falta de amor. No presente, o comportamento é de ausência de coragem.  O que não se contava era a capacidade de resistir que aumentaria a ponto destes pais abnegados serem cada vez mais comuns na sociedade atual. E muito corajosos.

Ao estudar o herói, Joseph Campbel desenvolveu um resumo da jornada destes personagens.O herói mítico escapa do mundo comum para uma região de maravilhas sobrenaturais. Consegue acumular forças inimagináveis que surpreendem quem está em volta.

A vitória decisiva é conquistada e o herói volta da aventura empreendida com "o poder de conceder bênçãos a seu semelhante". A jornada do pai real é diferente. Muitas vezes ele não tem a "recompensa" objetificada. E a vitória é o processo, como ocorreu com o pai de Serena e Venus Willians, as maiores tenistas da história. Juntas, elas chegaram ao topo por conta de um pai, John Willians, que acreditou no improvável: tornar duas meninas negras e pobres da Califórnia em fenômenos de um esporte de branco.

A história se repetiu com Anthony Hamilton, que forjou Lewis, o campeão de Fórmula 1. E ocorreu agora há pouco tempo em Goiás, quando o pai de Endrick, jogador do Palmeiras, lembrou dos dias que aliava o trabalho de faxineiro com a missão de tornar o filho um craque do futebol. Douglas Ramos, o pai do atleta, diz que nunca deixou de acreditar em sua missão ao lado do filho. O pai abnegado, como o programador Leonardo Duarte, leva na ponta da língua, a esperança de que toda jornada vai dar certo.

A luta dos pais heróis pode começar antes mesmo dos filhos nascerem. Tais histórias são prosáicas e repletas de reviravoltas. Afoitos para terem filhos estava o casal formado pelo jornalista Johnny Cândido e o chef de cozinha Pedro Ernesto. Eles optaram pelo método da barriga solidária e uma amiga de ambos gerou os gêmeos Gael e Mariana. 

Porém, ao voltar de um jantar no Dia dos Namorados, o casal recebeu a notícia que a amiga havia entrado em trabalho de parto com pouco mais de cinco meses. Foram meses de espera e angústia até levar os filhos bem para casa. Gael ficou por quatro meses na UTI e Mariana seis meses.

Como os gêmeos nasceram no auge da pandemia, apenas um acompanhante era permitido permanecer no hospital e não podia sair. Decidiram que Johnny, que tinha condições de trabalhar no local com um computador, ficou também “internado” no hospital. 

“O hospital liberou para eu ficar lá, mas não havia acomodação tinha uma sala de descanso para as mães, mas não me sentia à vontade de ficar lá, já que tirava a liberdade das mães recém-operadas. Trabalhava em uma sala do hospital e a noite juntava três cadeiras e colocava um colchonete em cima”, relembra.

Após as dificuldades, hoje os bebês estão desenvolvendo bem. Mariana ainda precisa fazer uma pequena cirurgia. “Hoje eles são nosso sonho materializados e a alegria da nossa casa. É muita correria, muita coisa para fazer, mas o amor supera tudo isso”, diz.


Parto

A estudante de jornalismo Eduarda Farias também teve um parto tenso, porém, o seu marido, o gestor financeiro Ezequias Farias salvou o dia. Eduarda experimentou um trabalho de 30 horas e a todo momento teve o companheiro ao lado.

“A gente brinca que ele ‘pariu’ junto comigo. A nossa filha é abençoada por ter um pai tão especial”, derrete-se. Ezequias teve um papel crucial no nascimento da filha Elizabeth, pois Eduarda, durante toda gestação, sonhou com um parto normal, com menos intervenção possível.

Porém, quando chegou o momento, a médica de plantão, segundo a estudante, usava procedimentos para ela intervencionistas e não queria cumprir com alguns tópicos do seu plano de parto.

“Vendo a situação, meu marido foi na administração do hospital pedir uma outra médica, por acreditar que eu e nossa filha merecíamos ter um momento como o que havia sonhado. Uma outra médica veio nos atender e a experiência mudou da água para o vinho: tive um parto feliz, humanizado, respeitoso, graças ao pai incrível que minha filha tem”.

Leia também:

  

edição
do dia

Capa do dia

últimas
notícias

+ notícias