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Cirurgia pode ser solução para diabetes

O educador Saulo Detarso de Oliveira, 50 anos, aos 31 descobriu que tinha diabetes mellitus ou tipo 2. Também não era para menos, ele conta que até então tinha levado uma vida sedentária, sem nenhuma atenção ao tipo de alimento ingerido e o controle dos mesmos. Na época já contabilizava vários quilos acima do considerado saudável, consequência do seu estilo de vida.

Com o diagnóstico, passou a tomar medicação controlada, inclusive a insulina, porém pouco mudou seus hábitos, com churrasco e cerveja nos finais de semana e pouca atividade física.

Por quase duas décadas Saulo viveu numa montanha russa orgânica, com utilização de altíssimas doses de insulina e numa rotina entre internações – inclusive em UTI´s – tentativas frustradas de manter seu corpo e a doença sob controle.

Em março deste ano a vida de Saulo sofreu uma reviravolta após ele ter concordado em se submeter a uma cirurgia metabólica para controle do diabetes, como um dos últimos recursos em busca da saúde perdida.

Como Saulo outros 500 brasileiros descobrem todos os dias que têm diabetes; no total 16 milhões de pessoas só no Brasil sofrem com o mal metabólico, segundo dados da Sociedade Brasileira de Endocrinologia. No mundo todo a epidemia atinge mais de 400 milhões de pessoas e tem alto índice de mortalidade.

Grosso modo o diabetes se caracteriza pelo excesso de açúcar no sangue, isso porque o corpo deixa de produzir adequadamente a insulina, um hormônio responsável por converter glicose em energia. A ausência total ou parcial desse hormônio interfere não só na queima do açúcar do organismo como na sua conversão em outras substâncias, como proteínas, músculos e gordura.

O tratamento tradicional da diabetes consiste, basicamente, na aplicação de doses de insulina e na efetiva mudança de hábitos do paciente com adoção de dieta alimentar equilibrada e com baixo consumo de açúcar, prática de exercícios físicos, além de abrir mão de hábitos como fumo e álcool. Porém, desde a década de 90, uma nova prática vem se consolidando como aliada no combate e controle da doença: a cirurgia metabólica e bariátrica.

Para Saulo, a intervenção cirúrgica, por muito tempo não foi uma opção. Ele se apegava aos tabus sobre riscos acima da média cirúrgica, pós-operatório complicado e eficácia duvidosa da técnica.

Porém, em 2016, duas internações subsequentes, sendo a primeira de 46 dias – 15 na UTI –  em consequência do chamado pé diabético, uma das complicações do diabetes mellitus, em que uma área infeccionada do pé do doente é acometida por úlcera.

Então ele decidiu, ou melhor, foi convencido, que era hora de pensar mais sobre o assunto.  Encaminhado para o cirurgião geral especialista em cirurgia Maxley Martins Alves, Saulo foi se informando e revendo seus conceitos e preconceitos sobre a prática. Em março de 2017 ele foi um dos pacientes operados pelo médico num procedimento que durou cerca de duas horas.

O médico Maxley Martins explica ao DM, porém, que nem todo paciente diabético tem indicação de cirurgia metabólica e bariátrica. Segundo ele, os grandes beneficiários são mesmo os que têm mais peso a perder, obeso grau I acima. Ele acrescenta que a cirurgia passa a ser uma opção quando, lançado mão da medicação, associada a melhoria da qualidade de vida com dieta balanceada e exercícios, não se atinge o controle glicêmico esperado. Foi justamente o caso de Saulo, que com 118 quilos, taxa glicêmica nas alturas e inúmeras internações para tratar consequências da diabetes, estava naquela fase da doença em que se faz necessária uma ação mais rápida e eficaz.

Informações

Uma das preocupações de Saulo era de que o risco cirúrgico fosse maior pelo fato de ser diabético. Segundo o médico, atualmente, estima-se que os índices de mortalidade de uma cirurgia bariátrica estejam em torno de 0,15%, pouco diferentes dos constatados em cirurgias consideradas simples, como a de retirada de vesícula biliar, por exemplo.

A possibilidade de tromboses e embolias são minimizados com cuidados pré, durante e pós-operatórios e as infecções também estão cada vez mais controladas. “No caso de um portador de diabetes, claro que os riscos crescem, mas um pré-operatório com especialistas reduz esses riscos, que passam ser similares aos dos não diabéticos”, afirma o médico.

“Tive medo, na primeira indicação, mas logo busquei me inteirar sobre as pesquisas que eram todas favoráveis”, diz Saulo. Ele lembra que contar com as explicações do médico e com o apoio de uma equipe multidisciplinar, com nutricionais, psicólogos, fisioterapeutas, entre outros, foi o diferencial para a aceitação da cirurgia e essencial para sua boa recuperação.

A recuperação, o tabu do pós-operatório complicado foi quebrado poucas horas depois de Saulo sair do centro cirúrgico. “Sai da cirurgia as 18h30 e as 21 horas já estava eu correndo com o fisioterapeuta! Uma loucura”, relembra da rapidez com que as coisas aconteceram. Ele acrescentou que foram quatro dias de internação, sendo que, no quinto dia após a cirurgia, ele já voltava à sala de aula para desempenhas suas atividades profissionais normalmente.

Mas nem tudo são flores e facilidades. Existe um período de adaptação e Saulo não ficou livre dos incômodos iniciais. Ele relata que teve dificuldades com alguns alimentos, sentia vômitos quando comia errado, fraqueza e dificuldade para desenvolver atividade física. Porém, o médico explica que tudo isso faz parte do processo, já que há uma redução drástica na ingestão de calorias e perda de peso rápida e importante, mas que tais sintomas diminuem à medida que o organismo se adapta a nova realidade.

Foi o que Saulo vivenciou e ainda vivencia. Aos sete meses de cirurgia, ele já perdeu 31 quilos e, o que é melhor, eliminou junto com os quilos algumas medicações das quais há anos era praticamente dependente. A insulina, cuja gravidade do seu caso levou a aplicação de90 unidades diárias sem o controle ideal da taxa glicêmica, foi um dos primeiros medicamentos a ser riscado da lista.

Para quem se dividia entre os leitos de hospital e a rotina rígida de dieta e remédios em casa, estar 30 quilos mais magro e, ainda em fase de perda, livre das picadas da injeção de insulina, já seria um grande feito. Saulo, porém, explica que sete meses depois da cirurgia bariátrica vive uma nova vida. Com taxa glicêmica no controle sem insulina, ele se sente curado. Mais que isso, se sente realizado ao poder desfrutar de um torresminho com cerveja gelada de vez em quando, tudo com a devida parcimônia.

O começo da história - A primeira cirurgia bariátrica foi realizada em 1954 pelo médico sueco R.J Kremen e visava reduzir o peso de uma senhora portadora de obesidade mórbida. - O procedimento consiste na retirada de parte do intestino, o que leva a diminuição da absorção dos alimentos e a consequente perda de peso. - Em 1978, alguns cirurgiões se atentaram para o fato de que a redução da câmara gástrica e derivações intestinais, propiciavam, ainda, uma alternativa para o controle e cura da diabetes. Entre esses médicos estava o renomado cirurgião italiano, Nicola Scopinaro, que acabou por desenvolver a técnica que leva o seu nome e que, além de parte do intestino prevê, ainda, a redução da câmara gástrica (estômago). - Apesar dos resultados positivos de Scopinaro, o primeiro consenso sobre a cirurgia como opção ao diabetes só veio em 1991. - Somente em 2007 a mudança é consentida oficialmente, com a aceitação da Sociedade Americana de Cirurgia Metabólica e Bariátrica. Desde então, inúmeros esforços em comprovar os benefícios estão sendo empreendidos.  

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