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Diretora remonta história de Velho Oeste sem machões

O Oscar deste ano foi um marco de participação feminina, com dois longas de mulheres concorrendo a melhor filme, com um deles, “Nomadland”, sagrando-se vencedor, e duas diretoras disputando na sua categoria, com Chloé Zhao se tornando a segunda mulher a levar a estatueta. Mas o número poderia ter sido maior, com a inclusão de produções como “First Cow - A Primeira Vaca da América”, de Kelly Reichardt, que está em cartaz.

No filme, baseado no livro de Jonathan Raymond, a cineasta americana vai mais uma vez ao passado, desmistificando a história contada nos livros e no cinema. Em 1820, um Estado do Oregon quase desabitado é terreno fértil para aventureiros machões no comércio de peles. Nessa paisagem humana inóspita, o cozinheiro Cookie ( John Magaro) e o imigrante chinês King-Lu (Orion Lee) são exceções - e não por acaso tornam-se amigos e sócios num empreendimento possibilitado pela chegada da primeira vaca ao Oregon (sim, o título em português está incorreto). O problema é que a vaca não é deles.

“O caubói machão nunca vai morrer”, disse a cineasta, durante o Festival de Roterdã, que aconteceu em duas partes, uma em fevereiro e outra em junho. “Eu tinha gostado muito dos dois personagens do livro. Mas, especialmente nos tempos em que vivemos aqui nos Estados Unidos, quem aguenta mais um homem durão?”.

Por isso, ela transformou os caçadores de pele em “Muppets”. “Eles são ridículos. Foi uma espécie de alívio, depois de cinco anos de besteira de machões sendo jogada na nossa cara todo dia. Não acho que isso vai morrer. Veja aqueles caras que invadiram o Capitólio. Eles são como os caçadores de pele, são homens ridículos.”

Reichardt constantemente filma a tensão entre a natureza e o homem, ou melhor, entre a natureza e o capitalismo. Isso vem desde sua infância. Criada na Flórida, ela se lembra do primeiro McDonald’s sendo construído. Em pouco tempo, todos os outros cantos daquele cruzamento estavam ocupados por fast-foods. E, mesmo pequena, fã de fast-food, ela sabia que isso não era bom. “O que eu vejo muito é essa destruição corporativa da beleza e uma falta de imaginação quanto às possibilidades”, disse na masterclass no festival.

A diretora sempre atuou no cinema independente, com orçamentos bastante modestos. Mas isso não quer dizer que, como mulher, tenha se sentido acolhida. Ela ficou 12 anos sem filmar entre o primeiro e o segundo longas, criando coisas em Super-8 neste intervalo. “Eu pensei: vou contornar isso sem tentar fazer parte, porque é doloroso demais”, contou ela, ressaltando, porém, que sempre teve amigos com quem contar. “Sempre encarei meus filmes como projetos artísticos, sem expectativa do que pudesse acontecer. Mas tenho feito filmes consistentemente na última década, para minha surpresa.” A situação melhorou bastante desde o início dos anos 1990. Um exemplo é a celebração de mulheres e cineastas não brancos no último ano. “Por um lado, acho ótimo, um resultado do #MeToo. Por outro, fico pensando se é só efeito da covid, na linha ‘vamos dar prêmios agora porque ninguém está ligando para isso mesmo’. Vamos ver se o efeito é duradouro ou não”, disse. (M.M, especial A.E)

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