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CULTURA

A extinção do MinC e o futuro das produções artísticas

28 de outubro de 2018. O ultradireitista Jair Bolsonaro chega ao poder com a promessa de combater a corrupção que assolou os últimos anos em que a ex-militante da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), Dilma Rousseff, ocupou o Palácio do Planalto. Ao sentar-se no trono, Bolsonaro tratou de colocar em prática um ponto que foi promessa durante sua campanha: a extinção do Ministério da Cultura.

Após a publicação no Diário Oficial da União em 1° de janeiro da medida provisória n° 870, as atividades que pertenciam ao MinC foram destinadas ao Ministério da Cidadania e a Cultura ganhou status de secretaria no novo governo. Como consequência direta, as leis de fomento à arte (responsáveis por viabilizar financeiramente produções de novos talentos e alvo de polêmica na última eleição) entraram em cheque e ninguém mais sabe o que vai acontecer no futuro.

Todo ano livros, filmes, espetáculos de artes cênicas, discos, shows e festivais são organizados com verba repassada por meio da Lei Rouanet e dos fundos de cultura estadual e municipal. Assim, de acordo com dados divulgados pelo MinC, 2,64% do Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) vem do incentivo, que são responsáveis ainda por empregar diretamente um milhão de pessoas, contratando aproximadamente 200 mil empresas e gerando R$ 10,5 bilhões de impostos.

Diretor da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás e vencedor do Prêmio de Literatura do MinC, o escritor Jamesson Buarque explicou ao DM Revista que o ministério tinha papel importante para captar recursos e disponibilizá-los por seleção via edital público. Com isso, a pasta estimulava as secretarias de cultura dos estados e municípios a promoveram uma política semelhante. Para o escritor, a extinção terá impacto nesse sentido e pode mudar o rumo da captação de recursos.

“O incentivo à produção artística de quem já se iniciou em uma arte, e sobretudo a possibilidade de revelação de novos talentos se reduzirão bastante”, afirma Buarque. Segundo ele, a redução do Estado – simbolizado numa política neoliberal – é “uma ação política de princípio retrógrado”. “Não é que artistas em início de carreira deixarão de produzir sua arte nem que novos artistas deixarão de surgir. É que a possibilidade de isso acontecer e as condições de manter isso vão se tornar bastante difíceis”, finaliza.

Classe artística

Em debate realizado durante a 22° edição da Mostra de Cinema de Tiradentes, que o DM Revista acompanhou em primeira mão, a atriz mineira Grace Passô, 38, teceu duras críticas ao descaso que o governo de extrema-direita tem com a arte. “A arte é uma invenção que faz parte da realidade, mas a gente (os artistas) não sabe muito bem o que está acontecendo, talvez seja uma jogada deles (os governantes) com esse objetivo”, afirma a diretora do longa Temporada, que está em cartaz.

Na ocasião, Passô destacou que o governo bolsonarista “sente tesão pela força” e o que “a gente vê é de uma truculência bem militar mesmo”. De acordo com ela, o governo ultradireitista gosta da ideia de virilidade e, a partir disso, há uma incógnita em relação aos projetos culturais que são financiados pelos editais das leis de fomento à cultura. “A sociedade manteve várias vezes reflexões sobre o porte de arma, por exemplo, mas não é eles quem decidem o que será feito ou não”.

Em entrevista concedida ao Revista durante a Mostra de Cinema de Tiradentes, a cineasta goiana Fabiana Assis comentou que o crescimento da produção audiovisual no Estado cresceu bastante nos últimos anos em função do Fundo de Arte e Cultura. “Precisam ser melhorados, mas já conseguimos muito com essas iniciativas. As leis atuam junto com as universidades e são primordiais para os festivais”, diz Assis, que participou da Mostra de Tiradentes com o documentário Parque Oeste.

“Uma das coisas que as pessoas não entendem é que o fomento à cultura gera emprego e movimenta a economia. Estamos alugando equipamentos e comprando outras coisas”, explica a documentarista. Assis lembrou também que as leis de incentivo são fundamentais para que aconteçam os festivais. “Movimenta a economia da cidade, pois alugamos pousadas, compramos passagens aérea, negociamos com os restaurantes”, completa a diretora de Parque Oeste.

Recentemente, o cantor carioca Chico Buarque afirmou que “com esses ministros, é preferível que Cultura não tenha ministérios”. A frase dita pelo artista mostra o sentimento de boa parte da classe artística sobre mal-estar que paira em relação ao que será feito de agora em diante.

Exumação do MinC

É neste contexto que o coletivo de mídia independente Metamorfose organiza na próxima sexta-feira (8) a festa Exumação: ressuscitação cultural após a morte do Ministério da Cultura. Com o objetivo de arrecadar recursos para o livro-reportagem gonzo Diário Subversivo: dias de embriaguez, utopia e tesão, o rolê vai contar com vasta programação, que vai desde a apresentação do cantor Ian Caetano até palco aberto para poesias, passando trapézio com Marcela F e performance surpresa. A última atração da noite será da banda goiana Guerrilha Armada dos Coelhos Mutantes.

Um das organizadoras do evento, a fotógrafa Júlia Lee, 22, contou que esse tipo de iniciativa precisa acontecer cada vez mais num contexto como o atual. “Além disso, o rolê é bem simbólico por conta do livro-reportagem de Beck, que trata sobre a chamada Primavera Estudantil. Também vamos contar uma diversificada programação que é justamente para protestar contra a extinção do MinC, uma das bandeiras de campanha do governo reacionário de Bolsonaro, completa.

Serviço:

Ressuscitação cultural após a morte do Ministério

Quando: sexta-feira, dia 8 de fevereiro

Onde: Cabaret Voltaire

Endereço: R. R-008, quadra 51, lote 07, Vila Itatiaia

Entrada R$ 10

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