Home / Cultura

CULTURA

Caetano traz turnê 'Meu Coco' para Goiânia

Caetano Veloso, 80, está odara. E Caetano odara, além de joia rara, canta e dança que dara. Caetano odara é como a menina baiana de Gil - só que melhor. Porque ele odara é uma voz contra as bases da ignorância e chega não apenas aos tímpanos do público, mas parece criar uma identificação com a qual as pessoas começam a gostar dele, beber ao som dele, transar ouvindo ele, pessoas cuja vida têm em suas trilhas sonoras um, dois ou - sei lá - três discos de Caetano Emanuel Viana Teles Veloso na vitrola.

O DM entrou nesta semana em contato com a assessoria do artista, mas foi informado ao jornal que ele, com uma “intensa rotina de shows e agenda lotada”, não irá “assumir novos compromissos”. Caetano, que foi perfilado pela revista norte-americana The New Yorker em fevereiro deste ano, não dará entrevista, embora traga neste sábado, 20, show da turnê “Meu Coco” para Goiânia. A apresentação será no Centro de Convenções da PUC, às 21h. Os ingressos podem ser comprados com valores a partir de R$ 200.

Entre canções marcantes de sua obra e composições de seu último disco, Caetano será acompanhado no palco pelos músicos Lucas Nunes, que produziu o disco “Meu Coco”, bem como Kainã do Jeje, Pretinho da Serrinha, Rodrigo Tavares, Alberto Continentino e Tiaguinho da Serrinha. Em termos visuais, o concerto adquiriu um aspecto quase mágico, já que o artista Hélio Eichbauer, antes de morrer, deixou um esboço cenográfico adaptado por Luiz Henrique. Eichbauer fazia cenários dos shows desde “O Estrangeiro”, no final dos anos 1980.

“Fazer show como parte da divulgação de um LP é um hábito velho, do tempo dos discos físicos. No show procuro juntar peças marcantes do álbum com obras que registrem momentos históricos do meu trabalho”, afirma Caetano, em comunicado à imprensa. O artista, nunca é demais lembrar, é responsável por clássicos da música popular brasileira, a começar por “Transa”, de 1972, disco considerado pelos fãs como o melhor “do exílio” - o episódio de sua prisão e Gil, aliás, é revisitado no doc “Narcísio em Férias”, dos cineastas Renato Terra e Ricardo Calil.

Até ser expulso do país pelos militares, foi uma longa trip e, depois de dois anos tentando entender a violência política brasileira, o autor de “You Don´t Know Me” juntou as peças ao lado de uma banda composta por músicos brasileiros para criar, ensaiar e gravar aquele que é um dos seus trabalhos mais ousados, presença ilustre na lista da Rolling Stone dos 100 melhores discos brasileiros de todos os tempos e também um dos mais votados na lista dos “500 Maiores Álbuns Brasileiros de Todos os Tempos”, do podcast “Discoteca Básica”. Ou seja, ninguém é capaz de desdizer a obra, não?

Para qualquer pessoa que saiba da força histórica, estética e poética do disco, a resposta é sim. Sobre “Transa”, inclusive, é necessário lembrar que o segundo elepê da fase londrina de Caetano Veloso foi gravado quase que ao vivo após meses de ensaio junto do grupo dirigido pelo músico Jards Macalé. O álbum une a linguagem do rock tocado na época com a saudade de um Brasil amordaçado pelos militares, país em que o músico virou persona non grata pelos fardados. Tudo isso, claro, em jams psicodélicas.

Segundo Caetano, sua consciência artística formou-se na rua do Amparo, onde lhe aconteceram coisas importantes à formação. “Ali eu descobri o sexo genital, vi ‘La Strada’ (filme de Federico Fellini, de 1954), me apaixonei pela primeira vez (e pela segunda, que foi a mais impressionante), li Clarice Lispector e - o que é mais importante - ouvi João Gilberto”, narrou o tropicalista, em seu livro de memórias “Verdade Tropical”, relançado pela Companhia das Letras em 2017. Em comemoração aos 80 anos do artista, a editora reuniu todas suas canções escritas numa obra de poesia e, ´especialmente, cultura popular. O título é as “Letras” (R$ 129,00).

Nos anos 60 e 70, a imprensa brasileira criou um falso antagonismo com Chico Buarque, como mostra o biógrafo Tom Cardoso na obra “Outras Palavras: Seis Vezes Caetano” (R$ 69,90), que acabou de sair do forno pela Record. Isso ficou evidente na histórica entrevista que Caetano Veloso concedeu ao jornalista Marco Aurélio Borba, então repórter de Playboy, em agosto de 1978. Mas, conforme mostra Cardoso na biografia-ensaio, o grande legado do tropicalista é mesmo sua música, independência intelectual e a capacidade de estar por décadas a fio em evidência, com polêmicas nos jornais ou qualquer algo do gênero.

Com bandaCê, Caetano Veloso se aproximou de público jovem

Com a bandaCê, junto da qual se apresentou no festival goiano Bananada em 2015, o cantor e compositor Caetano Veloso revirou sua carreira: três discos de estúdio (incluindo aclamado “Cê”, de 2006), três DVDs ao vivo e três turnês mundiais. Sem parar por aí, Caetano retornou ainda à linguagem experimental do rock, dessa vez numa pegada indie, e reconectou-se ao público jovem, lotando noites pelo Brasil ou enchendo teatros conhecidos mundo afora: a galera, eufórica, lhe aplaudia e, no centro do palco, o artista mandava de volta um som porreta.

“A história da bandaCê pede coragem”, atestou o músico ao jornal O Globo. Sem dúvida, antes de mais nada, foi preciso ter muita coragem, como reforçam os escritores Luiz Felipe Carneiro e Tito Guedes, na obra “A Trajetória Musical de Caetano Veloso Até a Reinvenção Com a BandaCê” (R$ 62,90), obra publicada pela Máquina de Livros. É desse período canções como “Wally Salomão”, “Comunista” e “Homem”. “Era tudo muito conciso, minimalista. Tocavam apenas o indispensável para produzir um som diferente, poderoso, estranho no melhor sentido do termo”, analisam Luiz Felipe Carneiro e Tito Guedes.

"Odara é uma palavra que se usa na Bahia, principalmente entre os pretos, no candomblé. Tem origem africana. Quer dizer bonito, bom, bacana, legal"Caetano Veloso, cantor e compositor

Caetano, então, continua odara? Sim. E o que é odara? “Odara é uma palavra que se usa na Bahia, principalmente entre os pretos, no candomblé. Tem origem africana. Quer dizer bonito, bom, bacana, legal…”, explicou o artista, na entrevista à Playboy, em 1978. E daí se Caetano Veloso foi atacado pelo poeta Décio Pignatari nos anos 1980? Ou se o jornalista Paulo Francis lhe dirigiu palavras pouco elegantes por uma entrevista com Mick Jagger?

Ele está odara, sim, e nós também, porque temos “Meu Coco” para ouvir e “Vivo Muito Vivo - 15 Contos Inspirados Nas Canções de Caetano Veloso” (R$ 54,90), que reúne nomes da literatura e jornalismo como Micheliny Verunschk e Arthur Dapieve. O livro foi lançado pela José Olympio. Caetano Veloso, além de dançar e cantar, é uma joia rara. E como.

Leia também:

  

edição
do dia

Capa do dia

últimas
notícias

+ notícias