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ENTRETENIMENTO

Festa na tela do cinema

Um festival de artes emo­ciona não só pelo encon­tro entre as pessoas, pela festa em si. Os trabalhos artísti­cos, apresentados em sequência, como se um complementasse o outro de uma forma única. Uma nova montagem, um novo show, totalmente exclusivo para quem está ali. Uma edição de um festi­val de cinema, por exemplo, apre­senta diversas produções de lo­cais culturalmente separados e com temáticas próprias. Apesar disso, o “encontro” dessas obras na tela também pode ser conside­rado uma festa. A confluência en­tre cada filme não é também algo aleatório, é possível através de um trabalho árduo de pesquisa de curadores. A Mostra de Cine­ma Tiradentes, que começa nes­ta terça-feira (19/1), na cidade de Tiradentes, Minas Gerais, procu­ra trazer filmes que apresentam um diálogo mais recente: aconte­cimentos políticos, econômicos e sociais da história recente do Bra­sil. A Mostra segue durante toda a semana, e o encerramento será no dia 27 de janeiro de 2018,

“A nossa seleção propõe um recorte de filmes com olhares ci­nematográficos bastante ama­durecidos, atrelados à viscerali­dade de questões emergenciais do presente”, conta a integrante da comissão de seleção, Cami­la Vieira. O público irá encontrar entre as temáticas dos filmes se­lecionados o racismo, a sexuali­dade, a opressão, a liberdade a resistência. A Mostra de Cinema Tiradentes chega este ano à sua 21ª edição e pode ser conside­rada um dos mais importantes polos de cinema, tanto por apre­sentar produções de vários esta­dos, mas também pelo incentivo financeiro para os premiados. São 70 títulos nesta edição, 15 federações do Brasil, sendo que quatro filmes que concorrem são produções goianas.

Os curtas são distribuídos em mostra competitivas, nove no to­tal: a Foco, cujos filmes concor­rem ao prêmio do Júri da Crítica; Foco Minas, que destaca a pro­dução mineira, estado que sedia o evento; a Panorama, Chamado Realista, Praça, Regional,Forma­ção, Jovem e Mostrinha. A Mos­tra Panorama conta com dois fil­mes goianos, Intervenção, com direção de Isaac Brum, e O Ta­manho da Pedra, de Hélio Fróes. Em entrevista ao jornal Diário da Manhã, o diretor Isaac Brum contou um pouco sobre o filme que concorre na Mostra, expec­tativas e sobre o trabalho do ci­neasta em Goiás.

Confira abaixo à entrevista:

Em Goiás, temos eventos e cursos importantes que fomentam o audio­visual. Por que você optou pelo estudo em São Paulo?

Eu nasci em Goiânia, mas saí daqui bem cedo, porque meus pais precisavam mu­dar pra São Paulo por motivo de trabalho. Quando fui pra faculdade, queria fazer Ci­nema, mas na cidade onde morava na épo­ca, Ribeirão Preto, não havia algum curso nessa área. Então comecei a fazer Jornalis­mo, mas decidi parar a faculdade no início do terceiro ano e ir pra São Paulo, capital, tentar algo na área de cinema. Isso foi em 2005, na época ainda não tinha o curso de Cinema da UEG. Acabei indo estudar Cine­ma na Anhembi Morumbi, e pra me susten­tar dava aulas de inglês. Me formei em 2010, fizemos um TCC que foi um documentário sobre montagem no cinema, chamado La­pidar o Bruto, um filme que está disponível na internet. Depois passei por algumas pro­dutoras, trabalhando como editor de vídeo na área de publicidade e resolvi voltar pra Goiânia em 2012. Aos poucos fui me intei­rando do que acontecia por aqui, dos editais e leis de fomento, do mercado, etc.

Você já pretendia gravar seu primeiro curta em Goiânia? Produziu algum tra­balho enquanto morava em São Paulo?

Quando voltei pra Goiânia já tinha a ideia inicial do que viria a ser o Interven­ção, mas não tinha a menor ideia de como conseguiria viabilizar o projeto. Aos poucos fui desenvolvendo o roteiro e descobrindo as formas de financiamento. Em 2015 finalizei o roteiro e comecei a buscar parceiros, escre­vi um projeto e mandei para os editais, mas não fui contemplado. Estava prestes a desis­tir do projeto. O problema maior, pra mim, era compor um elenco de peso.

Em 2016 decidi realizar o projeto de for­ma independente, pegar tudo o que tinha e investir no filme. Aí fui atrás dos atores, como o Rodrigo Cunha e o Rodrigo Cruz, do espe­táculo Dúplice, e o Duca Rodrigues. Já com alguns atores confirmados, conheci o Ra­phael Gustavo em um laboratório de rotei­ro, no Fica, e trocamos contatos. Algumas se­manas depois fui até ele e o convidei pra ser o produtor do curta, e ele topou na hora. Jun­tos fizemos um orçamento e montamos a produção, com vários profissionais que tam­bém já eram parceiros dele.

O que um diretor goiano, entre privilé­gios e dificuldades, tem de específico em relação aos artistas de outros Estados? Como você imagina a produção cinema­tográfica dessa região?

Acho que o que um diretor goiano tem de específico é justamente fazer parte de um grupo que começa a desenvolver o cinema goiano, um cinema que ainda está desco­brindo as suas características, que só recen­temente veio a ter um volume de produção. Penso que as possibilidades são muitas. Te­mos exemplos fortíssimos de estados fora do eixo que se redescobriram e que foram redes­cobertos através do cinema, como Pernam­buco e Minas Gerais, cujos filmes alcan­çaram e foram aplaudidos nos principais festivais do mundo.

Acho que estar fora do eixo é um grande diferencial, porque podemos criar um cine­ma totalmente único e original, totalmen­te goiano, que pode interessar as plateias do mundo inteiro. Por outro lado, precisa­mos estar em contato com profissionais dos grandes centros e aprender com eles, para podermos melhorar a qualidade dos nossos projetos. O cinema goiano deu um salto de qualidade nos últimos dois, três anos. Hoje está claro para todos aqui que vale a pena investir no audiovisual, que o dinheiro mo­vimenta o mercado como um todo e retorna pra sociedade.

O filme foi pago com dinheiro do seu bolso. Isso é comum em produções au­diovisuais? Quais são as opções de finan­ciamento e por que você optou por esta?

Sim, isso é bem comum atualmente. No meu caso resolvi investir porque acredita­va no projeto e porque ele dificilmente seria aprovado em um edital, no nome de um di­retor estreante como eu. Foi arriscado, mas um passo calculado. Sabia que não teria outra oportunidade, então tinha que fazer o melhor possível. Mas essa não é a forma ide­al de financiamento. Não há como se pro­duzir sem apoio institucional, sem leis de in­centivo e editais de fomento.

A temática urbana é constante no cur­ta. É algo presente no seu trabalho? Como você percebeu que queria fazer um filme sobre esse tema?

Sim, sempre quis fazer um filme que abordasse a questão das metrópoles, do caos urbano, da segurança pública, das drogas, da violência policial e do preconcei­to. Intervenção abarca todas essas temáti­cas. A recepção do filme é algo totalmente imprevisível, a gente nunca sabe se o públi­co vai entender, vai se interessar, ainda mais no primeiro filme.

Sobre a equipe que participou das gra­vações, quem fez a produção do projeto? Você já conhecia algum dos integrantes da equipe?

O responsável pela produção é o Rapha­el Gustavo, da produtora É Nóis Ki Tá. E contamos com um apoio fundamental da Ideia Produções. O Raphael tem desenvol­vido um trabalho bem interessante no bair­ro Vera Cruz. Foi lá que filmamos boa par­te do filme, inclusive a cena final foi filmada na rua da casa dele. Várias pessoas do bair­ro participaram da produção. Acho que ele é um grande exemplo da transformação que a cultura e o cinema podem gerar. Toda a comunidade do Vera Cruz tem se benefi­ciado das iniciativas dele. Sempre estão re­alizando algum projeto por lá, dando opor­tunidade para as pessoas participarem e conhecerem o universo do audiovisual.

A Ideia Produções ajudou bastante na logística, fornecendo um veículo de produ­ção e maquinária, e cedeu também o dire­tor de Fotografia Marcos Tomazetti, que tra­balhou junto com o operador de câmera Léo Rocha.

Já conhecia alguns atores, mas a maior parte da equipe foi montada por indicação do Raphael. Ele tem uma rede de colabo­radores e parceiros que possibilita a realiza­ção do curta. Contamos com uma galera de peso, muito talentosa, como as atrizes Elia­na Santos e Carol Schmid, que ele trouxe para o projeto.

O Venâncio Cruz, que se formou no Ba­sileu e faz o papel principal, foi selecionado após um teste de elenco que realizamos.

O filme foi lançado no Goiânia Mos­tra Curtas e agora segue para participar da mostra competitiva do Festival Tira­dentes. O que significa para você e para os produtores ser o representante goiano nesse festival? Você conhece outras pro­duções que concorrem na mostra?

Estar em Tiradentes esse ano é uma oportunidade incrível. É um dos maiores festivais do País, que tem essa característi­ca de revelar novos autores e não só isso, é um festival que valoriza a inovação de lin­guagem, que busca os filmes de vanguar­da, valoriza a autoria, a principal janela de inovação no cinema nacional atual­mente. É um orgulho estar lá junto com os colegas goianos Adan Sousa, com Meu Nome é Coraci, Hélio Fróes, com O Ta­manho da Pedra e Robney Almeida com o longa Dias Vazios.

Acho que o festival tem um papel mui­to importante no equilíbrio da disputa por visibilidade entre os demais festivais, que muitas vezes se torna um pouco vi­ciada. Isso porque Tiradentes dá oportu­nidade a filmes que talvez não tenham a oportunidade de serem exibidos em ou­tros festivais importantes, porque não compartilham da mesma filosofia.

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