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Roda de samba reverencia obra da cantora Alcione

Alcione, você me tira do sério, destrói os planos que um dia fiz pra mim, me faz pensar porque que a vida é assim, eu sempre vou e volto pros braços da tua música. Ah, minha cara, se soubesses das vezes em que derramei lágrimas com o ouvido jogado na esquina sonora do teu romantismo, verdadeiras sessões de terapia na tentativa de expurgar a dor entranhada num coração sofredor já no alvorecer pós-fossa.

Maranhense de São Luís nascida no dia 21 de novembro de 1947, Alcione Dias Nazareth chegou ao Rio de Janeiro em 1968. Nas casas de show do Rio, cantou na noite e despontou no mercado fonográfico com o single “Marrom”, editado pela gravadora Philips em 1972 – com esse nome, inclusive, a artista se tornou conhecida. Mas a projeção nacional veio três anos depois, ao lançar o LP “A Voz do Samba” e colocar nas paradas de sucesso hits como “Não Deixe o Samba Morrer” e “A Voz do Morro”.

Alcione, agora, terá sua obra homenageada no 4° Encontro Nacional e Internacional Mulheres na Roda de Samba, numa live transmitida na página do evento no Facebook neste sábado, 11, às 17h. A roda de samba acontece desde 2018 e presta condolências a obras de grandes mulheres sambistas. No ano de estreia, foi Beth Carvalho, em 2019 Leci Brandão, Elza Soares no ano seguinte e neste 2021, marcado pelo espírito de catástrofe iminente por conta da pandemia e retrocessos políticos, a autora de “Gostoso Veneno” tem seus sucessos interpretados por 26 artistas goianas.

“Escolher Alcione, bem como as homenageadas anteriormente, vem de como a obra dessas artistas nos permite pertencimento e nos lança ainda mais dentro do movimento que busca potencializar a presença de mulheres em todos os espaços. Na música, no samba, na técnica. São referências que constroem a história da nossa música”, diz Nina Soldera, cantora, atriz, performer e uma das coordenadoras do evento neste ano.

Para Nina, o legado de Alcione para a música brasileira é da artista que consegue transitar pelo popular com sofisticação. Mas um popular que não subestima o ouvinte, e sim cria uma música que deleita os ouvidos já no primeiro acorde e na primeira sílaba cantada por uma das vozes mais poderosas da MPB. É uma maranhense, trompetista de primeira linha, que concebe ao samba uma outra faceta, fora do eixo Rio-Bahia. E assim como Tim Maia, a quem foi comparada, canta as dores de amor.

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Nina Sodera: "O repertório tem desde as mais conhecidas do grande público a canções como 'Figa de Guine'" - Foto: Facebook/ Reprodução

“Alcione não tem medo de se arriscar a gravar canções populares de compositores desconhecidos”, afirma Nina. O repertório selecionado para a roda de samba partiu do lirismo emocionante vocalizado pela intérprete de “Não Me Fale das Flores” em discos como “E Vamos à Lua” (1980) e procura abarcar diferentes fases da carreira dela, com três canções que todas as rodas do Brasil e demais cidades do mundo vão fazer ao mesmo tempo. São músicas, adianta a coordenadora, escolhidas pela própria Alcione.

Para abrir a live, três petardos: “Não Deixe o Samba Morrer”, “Sufoco” e “O Surdo”. Outra música, também sugerida pela Marrom, “Maria da Penha”, fica a critério das rodas locais. Depois, cada lugar segue seu itinerário pela história de Alcione, as músicas mais marcantes, dos momentos inesquecíveis, num verdadeiro convite ao público para lembrar de amores passados, ou derreter-se pelo amor do presente e deixar a força do samba entrar em casa. Em Goiânia, as 14 intérpretes utilizaram como critério a identificação e paixão pela música de Alcione, como se conversassem entre uma faixa e outra.

“O repertório tem desde as mais conhecidas do grande público, como a mencionada “Você Me Vira a Cabeça” e “Gostoso Veneno”, a canções como “Figa de Guine” que faz referência ao universo das músicas de terreiro”, revela Nina, destacando que o show será guiado pela emoção e alegria. “O público pode esperar aprofundar um pouco mais no repertório da Alcione, prestigiando as artistas de Goiânia e conhecendo o Encontro Nacional e Internacional de Mulheres na Roda de Samba e o movimento do protagonismo dessas mulheres na música brasileira e no samba.”

De fato, Alcione é uma das cantoras brasileiras mais importantes. Desde 1975, quando estreou no mercado fonográfico com o fundamental “A Voz do Samba”, ela tratou de enfileirar uma lista de obras-primas indispensáveis para a MPB, como “Morte de Um Poeta” (1976), “Pra Que Chorar” (1977), “Alerta Geral” (1978), “Gostoso Veneno” (1979) e “E Vamos à Luta” (1980). Então, sua representatividade no samba é inquestionável, digna de ser aplaudida em pé por qualquer bom ouvinte de música.

“Se hoje estamos celebrando o 4° ano de uma roda de samba feita por mulheres muito se deve a força dessa mulher preta, nordestina, de se posicionar como protagonista e encarar uma indústria que é extremamente machista, abrindo caminhos e inspirando todas nós e muitas que ainda virão”, explica a cantora Milca Franciele, cujo evento, diz ela, nasceu da própria essência do encontro, que foi idealizado pela cantora Dorina Barros com o objetivo de valorizar a memória e a potência das mulheres no samba.

É, Alcione, que ironia desta vida: você chora na avenida, pro meu povo se alegrar. E aqui dentro do peito uma dor me destrói, mas você me entende e diz que pancada de amor não dói. Eu, sem querer teimar com você, concordo. Meus ouvidos estão de olho no relógio para deleitarem-se nas baladas românticas de seu repertório pautado na diversidade rítmica, da cor e sabor brasileiros. Anotem na agenda: sábado, 11, a partir das 17h, vai rolar 4° Encontro Nacional e Internacional Mulheres na Roda de Samba.

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