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OPINIÃO

Criolo e o fenômeno do hibridismo social

William Correia ,Especial para Diário da Manhã

Criolo é um cantor multifacetado, artista marcado pelo rap e influência das ruas, que, apesar de mais de duas décadas de carreira, foi vislumbrado pela mídia de uns anos para cá. Antes disso, boa música para o pessoal da quebrada, projetos sociais e alguma fama entre as favelas de São Paulo e do Brasil – o que já é muito para quem deseja cantar a realidade.

A fama veio tardiamente, com o reconhecido álbum Nó na Orelha (2011). Aos poucos, a poesia que ficava restrita a um grupo menos favorecido da sociedade, atraiu a atenção de todos os segmentos: do pessoal que mora nos subúrbios a quem vive nos condomínios fechados, dos analfabetos aos letrados, além, é claro, da mídia especializada.

Repentinamente, a melodia munida com uma letra pesada foi capaz de convergir diversos estratos sociais e culturais distintos, como um bolo fatiado, com seus pedaços equidistantes, mas sempre com suas extremidades apontadas para o (mesmo) centro.

É louvável o resultado de tantos anos de trabalho e esforço. Até curiosa essa consequência num país que racha por causa de qualquer coisa: política, futebol, religião, economia, cultura, direitos humanos... Mas será que é assim mesmo?

Em suas apresentações mais recentes, o MC (Mestre de Cerimônias, como gosta de ser chamado) tem sido apreciado por um público com uma situação financeira melhor condicionada: hipsters, modinhas, playboys, patricinhas, cults e etc. A mensagem que antes era emitida para quem é subjugado, agora é ouvida pelos que, não raras vezes, integram a coalizão que têm nas mãos o mesmo povo de onde o Criolo veio.

Claro que isso é algo fantástico, não me interpretem de maneira equivocada: o ex-Criolo Doido, negro, filho de nordestinos, vindo da periferia, agora fazendo sua voz ecoar para quem quiser – e não quiser – ouvir; se os jovens elitistas andam indo a seus shows nas chamadas Pubs, os nossos manos oriundos do morro também podem acompanhá-lo em casas de espetáculo com um preço acessível, ainda que, atualmente, com menos regularidade, já que sua agenda é lotada de compromissos mais rentáveis.

Foquemos no que importa: será que todos aqueles que gostam de seu trabalho entendem sua manifestação artística como um clamor por justiça, amor, paz e igualdade? Uma crítica cruel ao capitalismo? Por apreço e respeito às minorias? Ou só o ouvem porque sua música adquiriu um apelo pop? Por seu tom de voz suave e ao mesmo tempo marcante? Em razão de sua musicalidade e genialidade ao brincar com as palavras?

Tudo bem que Criolo já manifestou em entrevistas que não tem a pretensão de fazer com que ninguém mude sua forma de pensar com sua arte, senão que pelo menos uma reflexão seja provocada. Ele só quer compartilhar suas ideias, sua ideologia, e as consequências disso o destino tratará de resolver, para o bem ou para o mal.

Só que se o jogo de rimas é agradável aos ouvidos, nem sempre os versos são uma obra-prima em questão de requinte e concordância. Todavia, acima de tudo, “o rap é compromisso, não é viagem”, como já cantava um dos ídolos do próprio Criolo, o saudoso Maestro do Canão, Sabotage.

(William Correia, bolsista do Prouni, estudante de Jornalismo da PUC-GO)

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