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OPINIÃO

Sobre as manifestações e o desenvolvimento político, cultural e espiritual de um povo

Nelson Soares dos Santos ,Especial para Opinião Pública

Sexta Feira. A primeira manifestação sai às ruas. Entre os objetivos está o combate a corrupção, a defesa da Petrobras e a defesa do governo Dilma. Lideranças partidárias que apoiam a presidente, envolvidos diretamente na organização, dias antes, o próprio Lula conclamou a Stedille que convocasse o seu “exército” para ir às ruas em defesa do governo. Nas análises mais otimistas não foram mais que 100 mil as ruas em todo país, em diversas capitais. Qualquer, e praticamente todos os analistas consideraram um fracasso. Nos lugares onde houve maior concentração de pessoas era nítido as cores vermelhas do partido, a tentativa de opor burguesia e operariado; elite e trabalhadores, pobres e ricos, como se corrupção no Brasil fosse um problema de classe.

Domingo. Apenas em São Paulo mais de um milhão de pessoas nas ruas. Não houve nenhuma capital que o número de manifestante não tenha superado os dez milhares. Em Goiânia, falou-se em 60 mil pessoas. Vestindo verde e amarelo tudo parecia uma festa. Tinha protesto contra tudo e contra todos. Contra a corrupção, pedido de intervenção militar, contra o governo Dilma, e até, contra Paulo Freire. Diz-se que o movimento foi bancado por empresários e por federações das indústrias nos estados, diz-se que os partidos de oposição estiveram apoiando de uma ou outra forma a organização do movimento. Alguns partidos declararam apoio ao movimento, outros, confusos viram suas lideranças dividas sem saber que posição tomar.

Nelson Soares dos Santos

Diante das duas manifestações resta-nos tecer algumas considerações:

  1. Foi uma manifestação política. Não se pode negar que nas manifestações estiveram de alguma forma apoiadas por partidos políticos. Na sexta feira, os partidos que apoiam Dilma mostraram de forma visível a sua presença. E nem precisamos discutir se foram militantes pagos ou não, embora do ponto de vista moral isso seja relevante, o que se mostrou foi um movimento partidário. Já no domingo, mesmo que de forma invisível eram os partidos que de alguma forma estavam na rua, e embora, o movimento tenha se camuflado por trás de um discurso que abomina todos os partidos, isso não passa de uma estratégia para atrair os descontentes com todos os partidos, uma vez, que infelizmente, todos os partidos sem exceção tem na sua história algum corrupto ou acusado de corrupção. Não há nada de errado em se ter uma manifestação política, o grande problema que parece se configurar é termos uma mobilização das massas por meio do espectro político sem ao mesmo tempo haver um rumo político. Isso não somente é descabido como perigoso, sobretudo em um país com dimensões continentais.
  2. As manifestações mostraram um país dividido. Isso já estava presente no processo eleitoral, mas o que assusta não é o aumento desta divisão, o que assusta mesmo é que as estratégias utilizadas para desconstruir a candidatura Marina Silva no processo eleitoral, utilizadas largamente, com mentiras e todos os instrumentos condenáveis tanto pelo PT – Partido dos Trabalhadores, como Pelo PSDB, Partido da Social Democracia Brasileira continua presentes no imaginário popular. Certo radicalismo político fundado na ignorância da história, dos fatos recentes vividos pelo país. Um conservadorismo reacionário motivado dentro de certas instituições religiosas e em determinados tipos de movimentos sociais que prega um tipo de “Nós contra eles”, como se a vida fosse apenas um resumo de um dualismo narcisista de quem não consegue ver quase além da própria aparência de si mesmo em um espelho sujo. Neste sentido, as duas manifestações estão grávidas do mesmo mal. E é por esta razão que PT e PSDB se uniram na desconstrução da candidatura de Marina Silva, por que esta representava um programa de governo transparente, viável e fundado na realidade.
  3. Os partidos políticos. Ambas as manifestações mostraram o quanto o atual modelo de atuação dos partidos políticos está esgotado. Ou os partidos se reinventam ou de alguma forma será aprovado às candidaturas avulsas e muitos partidos simplesmente deixarão de existir. Os partidos são vistos pela sociedade com antro de corrupção, embora esta seja uma verdade parcial que não resiste ao ônus da prova, o povo por si mesmo corrupto e corruptor se apegará neste fato e sofrerá décadas para perceber que as instituições brasileiras são o resultado do caráter daqueles que as compõe, como o são qualquer instituição de qualquer país do mundo. Ainda falta muito para que a sociedade perceba que a saída é a educação moral, intelectual, cultural e espiritual do nosso povo.
  4. A democracia e a república nova. Muitos virão nas manifestações pedindo a volta da ditatura, ou da intervenção militar uma ameaça à democracia; e, claro, é no mínimo uma provocação, mas acreditar de forma assustada nisso é subestimar a força que tem a nossa jovem democracia. É ignorar os acontecimentos recentes do país como de fato muitos cartazes mostraram que é grande a ignorância histórica de uma grande parte da população. Tem a população culpa deste fato? Ou a grande culpa foi os governos do pós-ditadura não ter tido a coragem de fazer uma revolução na educação básica deste país? A necessidade de investimento em Educação básica está chegando a um ponto que logo ninguém mais poderá ignorar, nem mesmo aqueles que não tendo tido uma boa educação escolar pensam que a possui.
  5. A pauta a – Política. O mais curioso mesmo foi a pauta das manifestações. O que inicialmente parecia que seria um fla-flu, de um lado uns pedindo “Fica Dilma”, e de outro pedindo “Fora Dilma”; mesclou-se. Em ambas as manifestações à preocupação com a corrupção superou o desejo de derrubar a presidente, aliás, este se tornou fato secundário. A única pauta realmente presente e forte nas manifestações, tanto em uma como em outra foi a demonstração da sociedade de que está cansada da corrupção sistêmica. Mas como enfrentar a corrupção em uma sociedade onde desde porteiros de prédios, guardas de trânsitos, aos representantes no Congresso Nacional, é acostumado a pagar ou a cobrar propina? No fundo, a única pauta real das manifestações é um equívoco. O único programa político real que pode salvar a sociedade brasileira é um investimento em educação. Agora não mais apenas em educação escolar, mas em educação cultural, intelectual e espiritual.


Desenvolvimento Político e Educação.

A sociedade brasileira está diante de uma encruzilhada. Ou se enfrenta as raízes do problema ou não se encontra o caminho do real desenvolvimento político. A corrupção desenfreada são as folhas de um problema cujas raízes, é, a falta de educação integral do ser humano. Há uma pobreza política que precisa ser vencida e só o será com o surgimento de lideranças, partidos, com ideias e programas que possibilite dar um rumo de curto, médio e longo prazo para os anseios da população. E não existe outro caminho que não seja colocar a educação como fundamento central de todas as demais questões.

O Brasil avançou na educação do trabalhador, não tanto pelos investimentos do estado, mas muito mais pelas exigências do desenvolvimento tecnológico e do mercado; mas pouco avançou na educação de sua elite para viver uma nova forma de relacionamento diante das diferenças sociais, seja de classe, de renda, ou que nome se dê, mas ao fato de que existem ricos, pobres, alguns com mais e outros com menos. É a falta de educação moral que não permite ao rico ser magnânimo e ao pobre possuir liberalidade. É a falta de educação intelectual, cultural e espiritual que explica tantos indivíduos pedirem a volta da ditadura, formação de exércitos do absurdo (exércitos evangélicos, sem terra, etc), demonstrando um total desconhecimento da história e das leis. É a falta de educação escolar básica – aliás, como o PT errou feio na política de educação básica deste país – que explica tanta ignorância presentes nas manifestações, tantas reivindicações que beiram ao abismo do absurdo. É, quase absolutamente, a falta de educação.

(Nelson Soares dos Santos, professor universitário, e membro dirigente do Partido Popular Socialista. As ideias expostas neste artigo não representam necessariamente o pensamento do coletivo do Partido Popular Socialista, e sim daquele que o subscreve).

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