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Internet Móvel, Ilimitada!?

Desde janeiro desse ano, as operadoras de telefonia que oferecem o serviço de internet móvel vêm cessando o acesso à internet após atingida a franquia contratada. Mas em suas publicidades ofereciam o serviço de “internet ilimitada”, e nos contratos assinados pelos consumidores constava claramente que “ao atingir 100% da franquia, o cliente permanecerá conectado, porém com velocidade reduzida e sem pagar excedente de utilização [...]”. As empresas justificam essa prática abusiva por meio de uma Resolução da Anatel, que permite às empresas adotar, unilateralmente, nova política de acesso à internet móvel, com a finalidade de reverter os prejuízos com a perda de clientes de voz com a ascensão dos aplicativos de mensagens.

Anteriormente, quando usávamos todo o pacote de dados do nosso plano de acesso, a conexão era limitada para, em média, 128Kb/s ou menos. Ainda era possível continuar navegando e usando aplicativos de troca de mensagens. Após a mudança, a conexão passa a ser cortada completamente, reduzindo drasticamente a funcionalidade dos smartphones, e deixando de atender ao anseio dos clientes que contrataram o serviço de internet “ilimitada”. Essa alteração gerou grande revolta, justificada, entre os brasileiros.

Em meados do mês de abril, durante audiência da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados, Marcelo Bechara, vice-presidente da Anatel, comentou que, no máximo em duas semanas, o problema relacionado ao corte indevido da internet móvel seria solucionado. De acordo com ele, as operadoras entenderam mal sobre o que abrange os direitos dos consumidores, tomando uma atitude errada ao simplesmente negar o serviço sem oferecer soluções mais viáveis para os seus clientes. A medida de fazer o aviso por SMS foi ineficiente: só gerou mais confusão e revolta entre os consumidores.

A boa-fé é matéria norteadora de todas as relações obrigacionais e tem ocupado cada vez mais destaque no ordenamento jurídico pátrio, devendo ser observada em todos os atos jurídicos. É óbvio que uma alteração unilateral do contrato, que priva o contratante do serviço contratado, fere profundamente a boa-fé na execução dos termos contratuais, as operadoras estão descumprindo a oferta pactuada, sem, nem ao menos, tomar medidas para prevenir as consequências dessa alteração.

Essa Resolução, que vêm sendo invocada para justificar esse abuso, afronta o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Nesses casos de conflito de regras entre uma hierarquicamente superior e outra mais especifica, existem doutrinadores que entendem que deveria prevalecer a primeira. Deve-se lembrar que Resolução não é lei – não passou pelo crivo democrático, pois os diretores das autarquias não são eleitos, enquanto os legisladores o são. Outros doutrinadores entendem que deveria prevalecer a regra mais benéfica ao consumidor, que no presente caso daria o mesmo resultado.

A Constituição Federal de 1988, assim como o CDC, preveem que a livre iniciativa e a livre concorrência não são valores absolutos. Ambos os princípios têm limitações, entre as quais a necessidade de defesa do consumidor e de seus interesses. A publicidade, mediante promessas, sujeita-se à regra do Artigo 30 do CDC, que dispõe quanto ao dever do fornecedor em cumprir o que anuncia, em consonância com o Princípio da Vinculação.

Para o CDC, leis imperativas protegerão a confiança que o consumidor depositou no vínculo contratual, mais especificamente na prestação contratual, na sua adequação ao fim que razoavelmente dela se espera, resguardando também a confiança que o consumidor deposita na segurança do produto ou do serviço colocado no mercado.

O que está acontecendo, em síntese, é a adoção de uma prática comercial abusiva e irregular, por estar em desconformidade com os princípios basilares das relações obrigacionais e também com os direitos dos consumidores, que são justamente a parte mais vulnerável na relação jurídica. A prática abusiva deve ser coibida de imediato e, quando for o caso, reparados os danos dela advindos, pois as pessoas, físicas ou jurídicas, em suas interações na sociedade, ao alcançar direito de terceiro, ou ferir valores básicos da coletividade, devem arcar com as consequências, sem o que impossível seria a própria vida em sociedade.

(Arthur Ferreira Faria Gomes é

advogado)

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