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OPINIÃO

Um amanhecer, no porvir

Vejo na ardência dos meus sentidos, como um claro painel dentro de minh’alma, um sol que não tem o dourado desse sol, mas um fulgor intenso e prateado anunciando portentoso amanhecer...

... Assim como se a terra terminasse de ser devastada por catástrofe terrível, como se um interminável silêncio a dominasse, após um caos tristemente desolador!

... E esse sol estivesse quebrando a rotina do mais belo amanhecer que já existiu... Assim, como a preludiar muita alegria, uma felicidade indefinível nos próximos dias, ventura que todos estivessem a sentir bem lá no ádito de su’alma em festa!

... Seria talvez o mundo novo tão longamente construído pelo Cristo,

naquela edificação de dois mil pacientes anos, e de inaugurá-lo fosse chegado o dia, sem mais a presença do terrível adversário dos homens e da paz e da Justiça e do Amor: o ódio! Esse gerador de tormentas!

... Parece até que os céus muito azuis se desanuviaram do negrume aterrador do fumo das bombas cheirando a sangue! ... E que as faces ferozes dos verdugos se apagaram da lembrança dos mansos, que temores, aversões e mentiroso respeito já não sentem por eles – pois que já se foram!

... Não mais o medo da guerra, nem da injustiça, nem das opressões e enganos criminosos que de apreensões tremer faziam nossos corações há tanto desassossegados!

Onde, naqueles dias que se seguiriam ao radioso amanhã de prata e muita luz, os monstros que os crimes mais hediondos semeavam na terra perante a aterradora expressão de loucura dos mansos que a tudo padeciam,

sem mais lágrimas para chorar e sem mais para quem pedir a justiça que nunca vinha! A segurança para os seus lares, para os seus filhos, para os seus passos, e para os passos de todos os infelizes? Onde estão eles agora, naquele estupendo e nunca visto amanhecer? Onde?

Eles... Não mais agora... Perderam-se nos báratros interiores!... Estão a rodopiar pelos infernos que dentro de suas almas construíram! ... Ou de novo renasceram bem longe, quem sabe num orbe de dor e inusitadas provações!

Mas os raios daquele Novo Sol, certeza tenho, que tão cedo não os tisnarão, porque o dia que esse prateado Sol está neste momento abençoando, não os acolhe nesta terra tão cansada de molhada ser pelo pranto!

... Muito tempo se passou após o possível transe de que vos falo, pois os azuis horizontes limpos e mais claros estão... Aves de raras belezas voam e trinam cânticos que denotam Paz; e os montes estão verdes, e as flores parecem que se vestem de viço maior, ou têm cores mais vivas e cores que não conheço ou não sei definir...

Há perfumes passeando com a brisa e risos de crianças musicando o espaço; há sons de árias sublimes que os homens daquele tempo de guerra tinham esquecido; há rios límpidos engalanados todos por flores que as mãos intangíveis dos ventos atiraram...

– O que houve com o mundo, senhor? Pergunto a um homem que passeava olhando os céus, que tinha brancos os cabelos e jovem a face, cujos olhos brilhavam Paz, e de sorriso franco, amigo; ele me olha e fica sério, assim... Como se eu lhe tivesse perguntado alguma grande tolice, e me fala:

– Não houve nada. Por quê?

E eu lhe explico simplesmente: – está tudo tão bom, tão lindo – há Paz...

Ele me fita bem nos olhos e, surpreso, me indaga: – Acaso já conheceu este mundo sem amor, sem beleza, sem tudo de bom que agora sente?

– Sim; um mundo de ódio, vício, sombra e guerra! Ele estremece como criança e me diz, retirando-se:

– Isso foi… Há mais de quinhentos anos.

(Iron Junqueira, jornalista)

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