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OPINIÃO

Uma análise sistemática de quando a psicoterapia falha

Durante 28 anos venho trabalhando com psicoterapia, atendendo crianças, adolescentes e adultos, individualmente ou em família e, cheguei várias observações a respeito das falhas no processo psicoterápico.

Iniciamos dizendo que não existe psicoterapia individual, já que se trabalha, no consultório, no mínimo duas pessoas, cliente e psicoterapeuta. O que se aprende na faculdade sobre o não envolvimento com o cliente, vem sendo motivo de muitas discussões; mas acredito que não se pode ajudar uma pessoa sem um mínimo de envolvimento possível. O processo psicoterápico atual não funciona mais como funcionava há 20 anos atrás, século passado,, quando o cliente apenas falava e o profissional apenas ouvia ou, pouco falava. Temos hoje, uma clientela mais exigente e mais informações a respeito de como pode ser ajudados, quais os objetivos na psicoterapia e as diversas abordagens psicoterápicas; assim temos um diálogo mais aberto, portanto, mais humanista, voltado, assim se espera, para um mesmo objetivo: “Duas pessoas que se encontram para evoluírem e se ‘conhecerem’ sem, contudo, misturarem os papeis e objetivos – cliente e psicoterapeuta.”

De um lado nós temos a resistência de alguns profissionais, menos experientes, que se julgam “deuses” e acredita que o cliente nada pode saber a seu respeito, o que vai dificultar a relação e o crescimento – o vínculo –, pois pode existe a simpatia, mas dificulta o surgimento da empatia, ferramenta chave no processo psicoterápico. Vejo e ouço de clientes que já tenha passado por outros profissionais, que a falta de “envolvimento” do profissional no processo não fazia a terapia desenvolver e a relação fora se tornando apática. Claro que não podemos dirigir o cliente, nem tão pouco lhe dar caminhos “prontos”, mesmo porque não existe caminho “pronto”, cada indivíduo segue seu próprio caminho com ou sem ajuda. A tomada de partido também tem sido uma das falhas no processo, pois já ouvi de cliente que o profissional “x” pediu que a mesma não falasse mais de seu ex-noivo (“ele foi um traidor e é o responsável pela sua depressão”), “se ele te traiu não pense duas vezes, faça o mesmo com ele”, “foi-se a época em que nós (mulheres) dependíamos deles (homens), separe logo e vai cuidar de sua vida, você já perdeu muito tempo”, “seu pai é o único responsável por tudo que você esta passando”, e muitos outros absurdos.

Apesar das dificuldades pessoais de todo psicoterapeuta, temos também profissionais que só segue um caminho, conhece apenas uma abordagem psicoterápica e quer moldar o cliente, a qualquer custo à mesma, é como ir comprar uma roupa e tentar moldar o corpo para que se adapte a ela. Sabemos que o tempo que ficamos na faculdade só dá um “empurrão”; mas continuar lendo livros, participar de encontros, palestras e cursos, mesmo de pequena duração, é fator “sine qua non” ao crescimento profissional que terá, com certeza, mais argumentação durante uma sessão de psicoterapia.

Acredito que um “bom” psicoterapeuta, antes de qualquer coisa, deve estar sempre atento e aberto ao aprendizado, revendo diariamente conceitos de temas complexos e sempre atuais, tais como: ser humano, religião e Deus, amor e paixão, vida e viver, individualidade e individualismo, Psicologia e psicologismo, sexo e sexualidade, “pecado” e sentimento de culpa, doente e doença, perdão e desculpa, traição e “dis-traição”, mortalidade e imortalidade, finito e infinito, alma e fé, comodismo e bom senso, vergonha e orgulho, dentre outros. Temas que a “certeza” pode levar ao caos e ao aniquilamento do Ser. Cabeça feita é aquela que precisa ser refeita, cuidado!

Um processo psicoterápico, seja qual for à abordagem utilizada, jamais terá sucesso se não estiver sustentada no amor e no crescimento “espiritual” do cliente, o que independe de sua crença religiosa.

O outro lado do processo psicoterápico, com certeza, tem também as suas resistências, não diria nem maior nem menor, cada relação tem suas particularidades, portanto, pode ter suas semelhanças, mas nunca serão iguais, pois mesmo na relação entre o cliente e psicoterapeuta, juntos há algum tempo em terapia, não existe uma sessão igual a outra. A vida caminha para frente, jamais se dirige para o passado, mesmo que esteja falando e recordando dele.

A maior dificuldade do cliente no processo psicoterápico é compreender que tudo vem dele: dor, angústia, depressão, infelicidade, insegurança, medo, vícios, dificuldades de relacionamento interpessoal, etc. . sentimentos que vai juntando durante o período em que o mesmo evitou os problemas para não sofrer. Mas, a maioria de nós, temendo a dor envolvida, tenta evitar os problemas. “Nós adiamos o confronto, esperando que eles sumam; nós os ignoramos, os esquecemos, fingindo que eles não existem. Até mesmo tomamos droga (incluem as medicações) para nos ajudar a ignorá-los, de tal modo nos anestesiando que esquecemos as causas da dor” – M. Scott Peck – muitos clientes depressivos são dopados para não atentar contra a própria vida; mas esquecemos que morrer pode ser também quando negamos a vida, os problemas, os próprios sentimentos, é negar o confronto com a vida. Tentamos contornar os problemas em vez de encara-los de frente; tentamos sair deles em vez de vive-los e sofrer. Essa tendência a evitar os problemas e o sofrimento emocional, tem sido a maior causa de doenças psicoemocionais que afeta toda humanidade. “A neurose é sempre uma substituta do sofrimento legítimo” – Carl G. Jung.

Muitas pessoas não querem ou não podem suportar a dor de desistir daquilo que já foi ultrapassado. Em conseqüência, elas se apegam, às vezes para sempre, aos velhos padrões de comportamento e pensamento, deixando de lidar com qualquer crise, de verdadeiramente crescer e de experimentar a ditosa sensação de renascimento que acompanha a transição bem-sucedida para um maior amadurecimento psicoespiritual. Num crescimento e amadurecimento saudável teríamos que abandonar alguns padrões de comportamento como: o estado infantil, quando não é preciso responder a nenhuma exigência externa; fantasia da impotência; o desejo de possuir totalmente (inclusive sexualmente) os progenitores; a dependência da infância; imagens distorcidas dos pais; a onipotência da adolescência; a “liberdade” do descompromisso; a agilidade da juventude; a atração sexual e/ou a potência da juventude; a fantasia da imortalidade do corpo; a autoridade sobre os filhos; várias formas de poder pessoal, visível em muitos profissionais, patrões e políticos; a independência da saúde física e, finalmente, a personalidade e a própria vida. Renunciar a personalidade nos dá a oportunidade de conhecer a alegria mais beatífica, sólida e duradoura da vida. Pois é a morte que dá à vida todo o seu significado. Este “segredo” é a sabedoria central da Religião.

Assim, podemos dizer que a psicoterapia falha, não há a menor dúvida, porque ainda somos falhos e medrosos, incapazes de assumir a nós mesmos como realmente somos, incapazes de nos compreender físico, psíquico, emocional, social e economicamente. Fica claro que a felicidade, que todos buscamos, independe da nossa situação financeira, nível intelectual, social e, principalmente, do outro; ela esta em sabermos utilizar bem e com sabedoria o conhecimento, experiência e as “armas” que você já possui.

Apesar do ceticismo de ambos os lados, a psicoterapia tem auxiliado um grande número de pessoas que levam a sério o objetivo a que nos propomos na vida, buscando o equilíbrio interior para suportar com sobriedade o “desequilíbrio” do mundo exterior, assumindo um compromisso sábio com a vida e o viver, procurando viver à vida sem medo do que dirão os outros, plantando o que se quer colher e sabendo que ninguém tem a capacidade de fazer o outro feliz ou infeliz ou mudar o outro; mas que é no processo da busca e do tentame que o Ser Humano encontrará consigo mesmo e, isto se dá, no relacionamento interpessoal. Não podemos negar que, quem se submete ao processo psicoterápico por um período “razoável” de tempo, com um profissional experiente e com ética pessoal, se beneficia em muito e se torna mais capacitado para enfrentar os “solavancos” da vida, aprendendo: ouvir e falar, dizer sim e não e sentir a si mesmo sem medo, no momento “certo” através da construção responsável de si mesmo.

A psicoterapia pode falhar, não tenho dúvida; mas falhará menos quando, cliente e psicoterapêuta, estiverem voltados para o mesmo alvo: o amor verdadeiro e honesto assentado no respeito mútuo à dor vivida por ambos.

(Dr. José Geraldo Rabelo. Psicólogo holístico, psicoterapeuta espiritualista, parapsicólogo, filósofo clínico. Especialista em família, depressão, dependência química e alcoolismo. Escritor e palestrante. Emails.:[email protected] e/[email protected])

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