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OPINIÃO

Réquiem para Mário Martins

No meu livro A Imagem da Academia Goiana de Letras no Perfil de seus Acadêmicos, Editora Kelps/UCG, Goiânia, 2009, dediquei a esse ilustre literato, glorificado com sua eleição para a AGL – Academia Goiana de Letras, um capítulo intitulado Mário Martins, o maior biobibliógrafo do Brasil, motivo de elevada honra para mim, seu ex-professor na pós-graduação da Faculdade de Direito da UFG, curso que ele realizou com acentuado brilho, como, aliás, tudo quanto ele empreendeu em sua brilhante jornada.
Agora, neste 18 de março, recebo, com espanto e pesar, e-mail da gloriosa presidente de nossa Academia, AGL, nos seguintes termos: “A Academia Goiana de Letras mais uma vez enluta-se com a perda de um Confrade, Mário Ribeiro Martins. Com residência em Palmas, há muito fomos privados de uma convivência estreita com ele, mas o espírito acadêmico que une os membros de nossa Confraria sempre manteve, de certa forma, Mário conosco”. E termina, com um apelo a que todos da AGL somos plenamente solidários: “Unamo-nos em preces para que a alma de nosso Confrade seja abençoada pelo Pai, e sua família, confortada pela fé e amparada pela esperança do reencontro”.
Naquele texto, dizia eu, pleno da mais absoluta convicção: “Acredito inexistir, no Brasil, uma personalidade cultural que pertença a tantas centenas de entidades literárias, confessionais e de natureza cultural como ocorre com o jurista, poeta, dicionarista, biógrafo, bibliógrafo e genialogista, como ocorre com o acadêmico Mário Ribeiro Martins, baiano natural de Ipupiara, antiga Fundão, ou Jordão de Brotas, bela e misteriosa região da Chapada Diamantina, onde nasceu a 07 de agosto de 1943, filho de Adão Francisco Martins e de Dona Francolina Ribeiro Martins, casal do qual brotaram mais 7 rebentos: Adão, Eunice, Marli, Nina, Filemon, Gutemberg e Manoel Ribeiro Neto. Ou seja, cinco homens e três mulheres.
Nascido numa irmandade numerosa, Mário seria criado pela avó, a matriarca Maria Ribeiro dos Santos.
Ainda em Ipupiara, seria alfabetizado pela Tia Almerinda Ribeiro dos Santos e pela Professora Miriam Ribeiro Barreto, irmã do Dr. Isaac Ribeiro Barreto, primeiro médico de Brasília, DF. Aos 07 anos de idade, mudou-se, com a família, para Morpara (BA), onde seu genitor exerceria o comércio como profissão, e os ofícios de político e pregador evangélico da confissão Batista. Todavia, mais que à Loja ‘Primavera’, de seu pai, preocupa-se, na sua meninice curiosa, com livros, e com as pescarias no Rio São Francisco, o rio da unidade nacional, agora objeto da novela de Benedito Rui Barbosa, O Velho Chico, que prenuncia um êxito midiático sem precedentes. Aos 12 anos, retornaria à cidade natal, onde iria dedicar-se, seguindo a tradição da família, à agricultura, desde a construção de cerca de pedra (como é comum na região), de arame, roçagem de pastos, e atividade semelhante, inclusive atividades pastoris.
No ano de 1959, aos 16 anos, transferiu seu domicílio para a legendária Bom Jesus da Lapa, onde receberia forte influência do Pastor Pedro Pereira Nascimento, e se iniciaria como Pregador Batista. Ali, concluiria o Ginásio no Colégio São Vicente de Paulo, sendo escolhido Orador da Turma; e, classificado em primeiro lugar, é condecorado com a Medalha de Honra, e quinhoado com prêmio de viagem a Salvador, quando viaja de avião, pela primeira vez.
Aos 20 anos, matricula-se no Colégio Americano Batista (Gilreath), do Recife, onde, nos idos de 1907, também estudara Gilberto Freyre, o criador da Sociologia, no Brasil, hoje nome do Aeroporto Internacional dos Guararapes, que lembra históricas batalhas, num passado longínquo.
Susto enorme sofreria no acidente do teco-teco em que viajava de Petrolina para o Recife, quando, ao sobrevoar a Serra das Russas, o avião caiu, pegou fogo, morrendo carbonizados o piloto e o proprietário do aparelho, um fazendeiro da região. Jogado numa moita de capim, Mário salvou-se, por milagre. O acidente ocorreu a 28 de fevereiro de 1965. No fim desse ano, terminaria, no Colégio Batista, do Recife, o Curso Clássico, quando arrebataria seu primeiro prêmio literário, o Machado de Assis.
No ano seguinte, 1966, seria admitido, após exame psicotécnico, no Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil, no Recife. E, no ano de 1968, seria ungido Ministro do Evangelho, na condição de Pastor da Igreja Batista de Tejipió, quando passa a ministrar as disciplinas Teologia Bíblica, História do Cristianismo, Teoria do Conhecimento, dentre outras disciplinas intimamente relacionadas com a ciência da Religião.
Passo de suma relevância na sua formação jornalística, dar-se-ia no ano de 1970, quando passou a escrever para o ‘Jornal do Comércio’, o maior diário do Nordeste; e para o ‘Diário de Pernambuco’, o mais antigo jornal da América Latina, ambos editados no Recife, jornais até hoje de regular circulação na capital pernambucana e em toda aquela região nordestina. É, também, o ano de sua estréia em livro, com edição de ‘Correntes Migratórias do Brasil’, com o pseudônimo Snitram M. Oriebir, seu nome às avessas. No ano seguinte, 1971, licencia-se em Filosofia Pura, na Universidade Católica de Pernambuco. Também nesse ano, a felicidade da paternidade primeira, com o nascimento de Nívea Zênia, de seu casamento com Elenaide Batista dos Santos, de quem se divorciaria, mais tarde.
No ano de 1972, viria a conquistar o Mestrado em Teologia, com a dissertação ‘O Radicalismo Batista Brasileiro’. No ano seguinte, 1973, cruza o Atlântico para estudar na Espanha, onde se especializaria em Educação Moderna, e, também, na ciência de Sociologia e de Administração Pública, em Madri e em Alcalá-de-Henares, diploma assinado por Afonso de Borbon, que lhe foi entregue , em marcante solenidade pública, por Don Juan Carlos de Borbon, Rei de Espanha, após a redemocratização daquele pai, depois da morte do ditador Francisco Franco. Naquele mesmo ano, participou da Conferência Nacional sob re ‘Integración Del Minusalido em La Socidad’, e do ‘V Congresso Internacional de Sociologia’, em Barcelona. Proferiu, naquela época, memorável conferência no ‘Instituto de Cultura Hispânica de Madri, sobre o tema La Alfabetización em El Contexto de La Educación Permanente. E, após, viaja por vários países da Europa Ocidental, dentre os quais França, Portugal, e Inglaterra. E, de volta ao Brasil, foi eleito Presidente da Ordem dos Ministros Batistas de Pernambuco, e escolhido Diretor do Centro de Educação Teológica por Extensão, do Seminário Batista do Norte. Data dessa época a publicação de seu livro‘Gilberto Freyre, o ex-Protestante, traduzido para o Espanhol por Jorge Piñero Marques. Publica, também, nesse ano, o livro de poesias ‘Miscelânia Poética’, e os livros ‘Sociologia da Comunidade’, e ‘Subdesenvolvimento: Uma Conceituação Estática e Dinâmica”.
No ano de 1974, veio para o Planalto Central, deixando, definitivamente, o Nordeste, e estabeleceu residência em Anápolis, hoje centenária. Ali, seria docente nas Faculdades de Direito (FADA), Filosofia (Bernardo Sayão), lecionando Introdução à Filosofia, Sociologia, Ética Profissional. No ano de 1977, torna-se Co-Pastor da Primeira Igreja Batista de Anápolis, juntamente com o Pastor Isaías Batista dos Santos. A partir de então, passaria a colaborar nos jornais Mancheste, O Popular, Folha de Goiás, Correio do Planalto, ‘O Anápolis, Diário da Manhã, e outros.
No ano de 1979, publica seu livro Filosofia da Ciência, e recebe o ‘diplôme d’Honneur’ do Clube dos Intelectuais Franceses.
No ano de 1983, ingressou na Academia Goiana de Letras, onde ocuparia a Cadeira número 37, agora vaga, com seu decesso precoce.
A partir de 1995, passa a publicar uma coleção de Dicionários, após o ensaio ‘Estudos Literários de Autores Goianos’, verdadeira enciclopédia com mais de mil páginas. Entre eles, Dicionário Biobibliográfico de Membros da Academia Goianiense de Letras.
Eis, em breve síntese, o perfil do Acadêmico Mário
Martins, o maior biobibliógrafo do Brasil que ora deixa este plano para brilhar no firmamento da eternidade.

(Licínio Barbosa é advogado criminalista, professor emérito da UFG, professor titular da PUC-Goiás, membro titular do IAB-Instituto dos Advogados Brasileiros-Rio/RJ, e do IHGG-Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, membro efetivo da Academia Goiana de Letras, Cadeira 35 – E-mail [email protected])

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