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OPINIÃO

O legado olímpico como ferramenta de política externa brasileira

Em agosto e setembro de 2016, os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos foram sediados no Rio de Janeiro: a primeira vez que um evento esportivo de tamanha magnitude foi realizado na América do Sul. Encerrou-se, então, um ciclo de competições esportivas internacionais realizadas em solo brasileiro, considerando-se que o Brasil também sediou a Copa das Confederações, em 2013, e a Copa do Mundo de Futebol, em 2014. E parece que o brasileiro tomou gosto pela coisa, visto que já estão avançadas as negociações para que o Brasil sedie a Copa América de Futebol, em 2019.

Embora seja questionável o timing na realização de eventos desse tamanho aqui no Brasil – tendo em conta que os indicadores econômicos do governo brasileiro e das cidades-sede, especialmente do Rio de Janeiro, não estão nada favoráveis e que o dinheiro gasto com tais obras poderia ter sido revertido para obras públicas indispensáveis e que estão em estado crítico –, é evidente que mostramos ao mundo a capacidade de sediar competições esportivas de tal calibre, com logística e organização consideráveis, ainda que quase no improviso e em cima da hora. E conseguimos reforçar a imagem clássica que muitos temem em admitir: o brasileiro é um povo que sempre procura se divertir e festejar, pelos motivos mais razoáveis até os mais banais.

No entanto um legado silencioso passa despercebido após a realização de tantos eventos relevantes pelo Brasil. Não me refiro aos colossais estádios de futebol ou, no caso do Rio, às obras de infraestrutura e de revitalização de áreas que, até então, estavam esquecidas pelo poder público. Claro, são consequências valiosas para os cariocas e brasileiros das demais cidades-sede. Mas eventos de semelhante porte não são organizados somente pelos governos locais e entidades esportivas responsáveis. Inúmeros parceiros nacionais e internacionais aproveitam uma Copa do Mundo ou os Jogos Olímpicos para atuarem como patrocinadores ou até mesmo firmarem acordos de cooperação nas mais diversas áreas com uma cidade-sede ou país-sede.

Dessa forma, o Brasil concretizou parcerias necessárias à realização do evento – como no intercâmbio de segurança e tecnologia com países desenvolvidos, como a França e a Alemanha –, além de parcerias no setor turístico, logístico e esportivo, para que atletas que se destacam em suas modalidades tenham maior acesso a equipamentos e técnicos de ponta para tornarem-se potências em seus respectivos esportes. Outra parte desse “legado silencioso” remete à visão que o mundo criou de nós: durante boas semanas, os olhos de inúmeras nações estiveram voltados ao Brasil e observaram tudo o que o País pôde oferecer aos milhares de atletas e centenas de milhares de turistas que vieram prestigiar os Jogos Olímpicos e Paralímpicos. À face dos resultados positivos do evento, espera-se que os investidores estrangeiros voltem a olhar o País como um agente confiável e estável, a despeito da turbulência política recente que se instaurou no ambiente interno brasileiro.

Apesar dos enormes gastos com infraestrutura e logística para fazer com que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos saíssem do papel, o legado imaterial advindo desses e demais eventos esportivos recentes que o Brasil sediou torna-se maior que as obras, os estádios, os metrôs e as revitalizações feitas. Tornar a próxima geração de atletas mais capacitada e preparada para competir com esportistas do mundo todo e concretizar parcerias importantes em áreas essenciais é vantajoso em uma perspectiva futura, apesar de não ser tão perceptível pela grande parte da população. É seguro considerar que sediar tais competições esportivas internacionais consiste em um mecanismo efetivo de política externa para promover nosso país. Agora cabe aos nossos governantes fazerem com que o legado material e imaterial resultante de eventos do tipo não caia no esquecimento ou perca-se. E isso não é algo inimaginável, considerando-se a capacidade dos políticos brasileiros de perderem de vista as conquistas alcançadas por si mesmos — ou, como é mais frequente, por seus adversários — e pelo povo.

(Matheus Albuquerque Costa, estudante de Relações Internacionais na Universidade Católica de Brasília)

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