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OPINIÃO

Pela sexta república

A crise política está madura. De um modo ou de outro haverá uma solução. Vai depender dos atores políticos. Os desesperados sonham com intervenção militar, sem saber que esta seria, de todas, a pior solução. Nem seria solução, mas agravamento do problema. Eleições diretas, já, para presidente da república é o remédio prescrito pelos que acham que a febre é a doença e não o sintoma.

A melhor solução, sem dúvida, aquela que pode erradicar a crise e apontar novos rumos para o país é a convocação de uma assembleia nacional constituinte, que dê ao Brasil uma nova república, a sexta república. Já se ouvem algumas vozes propondo a constituinte. Em Goiás, ela se fez ouvir a partir da entrevista do vice-governador José Eliton ao Diário da Manhã, edição desta segunda-feira.

É o primeiro político goiano a levantar a questão. Depois de quase trinta anos de promulgação da “Carta cidadã”, o que se pode avaliar da experiência é que, a par dos avanços no campo dos direitos individuais e sociais, no que diz respeito à organização do Estado e ao sistema eleitoral, a úncia avaliação possível é a Lei Maior fracassou.

O presidencialismo monárquico à brasileira é uma usina de crises institucionais. Nenhum presidente se aguenta se não estiver comprometido até a alma com o Congresso. Mas as legislaturas que temos, cada vez piores, acabam sendo fator de instabilidade. E o pior, resultam de um sistema eleitoral que perverte a vontade do eleitor, fazendo da representação uma ficção jurídica. A inautenticidade dos nossos parlamentos não resulta, necessariamente, de má conduta deste ou daquele parlamentar, mas de falhas do sistema eleitoral. Um sistema que, em última análise, está na base da “corrupção sistêmica” que há anos vem constrangendo o país, envergonhando a cidadania e desmoralizando as instituições.

Somos prisioneiros de uma absurda contradição. O presidente, eleito diretamente pelo povo, com base em programas geralmente progressistas, fica refém de um Congresso eleito pelos velhos currais eleitorais, de forma proporcional. A esmagadora maioria dos candidatos não tem compromisso nenhum com o programa presidencial. Ou o presidente alicia apoiadores no Congresso, atendendo à demanda fisiológica, ou simplesmente não governa. Se insistir em bater de frente com os congressistas, acaba derrubado.

O homem comum do povo não tem a menor chance de eleger-se para o Congresso. Só se chega lá com muito dinheiro. As campanhas são caríssimas. Daí a volúpia da chamada “classe política” pela dinheirama das empreiteiras, das grandes indústrias, do capital financeiro, do baixo protestantismo, e até dos açougues goianos.

“É hora de reconstruir a República”, brada José Eliton. Eu diria, de outro modo: fundar a sexta república, ou seja, organizar o Estado com base em nova Constituição. O povo, titular da soberania, tem que ser novamente chamado a redefinir os rumos do país. Precisamos de uma nova Carta. Da que está em vigor, há que se aproveitar apenas os artigos 5° (direitos humanos e garantias individuais) e os dispositivos relativos aos direitos sociais. O resto caducou historicamente.

Como disse, e repito, o comum do povo não tem chance nenhuma com o atual sistema. Por isso, assembleia constituinte há de ser eleita pelo sistema de voto distrital, aceitando-se candidaturas avulsas. Será um parlamento unicameral, exclusivo, e que se autodissolverá uma vez promulgada a Nova Carta. Seus membros não receberão nenhum provento, exceto ajuda de custo para se manterem sóbrios e modestamente em Brasília. Os deputados estarão prestando um serviço à pátria, da qual, como já disse o tenente Siqueira Campos, nada se exige, nem mesmo compreensão.

Como seria a sexta república? Eu cá tenho minhas propostas. Muitas delas em total sintonia com o que José Eliton propôs em sua entrevista. Em artigos que virão em seguida a este, pretendo expô-las em pormenores. É preciso dar continuidade ao debate iniciado pelo vice-governador. É preciso apreender a essência das coisas. Não tomar o efeito pela causa.

Como eleger uma nova Assembleia Nacional Constituinte? Em geral, a convocação do poder constituinte pressupõe ruptura da ordem estabelecida. Mas a ruptura não é uma condição necessária. No contexto de crise, havendo um forte consenso nacional, é possível transformar a ordem por dentro da ordem. A própria Carta de 88 fornece a base legal para a convocação de uma nova constituinte: o plebiscito.

Qualquer que seja a solução para a crise da presidência, ela terá caráter provisório. Uma eleição direta, agora, segundo as mesmas regras viciadas que levam a crises e mais crises, seria apenas adiar o desfecho trágico. A única palavra de ordem sensata neste momento é: por uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva, unicameral e soberana. O resto é delírio.

Helvécio Cardoso, jornalista

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