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OPINIÃO

Barreirinho, numa noite de luar

O luar no Barreirinho, cidade que então se insinuava (a segunda metade da década de 1950) era um espetáculo e tanto. Imperdível, em noite de céu limpo. Até porque era quase a única atração, numa quadra na qual os caminhões só apareciam entre maio/junho e novembro. Então, em noites de Lua cheia, na porta de alguma das poucas casas, grupos de jovens, a maioria na adolescência, organizavam, orientados pelas mães, algum tipo de diversão. Eram diversas modalidades de brincadeiras de roda, cantorias, um passatempo chamado “direito está vago”, e até algum tipo de desafio. Certa noite fui desafiado por uma linda moreninha chamada Ruth a declamar alguma poesia ou ao menos uma estrofe para ela. Semi alfabetizado, mas já então interessado por leitura, declamei o seguinte trecho que eu havia decorado de um folheto de cordel:

 “Beijo-te em sonho dormindo
 Nunca mais quero acordar
 Se o sonho é belo e tão lindo
 Quero viver a sonhar
 E um dia, ao morrer, sorrindo
 Por teu nome hei de chamar.”

Houve palmas, que me fizeram feliz. Chegada a minha vez, minha desafiadora, a quem pedi declamasse também, declamou uma estrofe de autoria própria:

 “Sou um botão que a rosa deu,
Meu pai colheu
Minha mãe, Leolina Camelo
Meu pai, Clóvis de Abreu.”

O casal Cloves e Leolina, ele paulista e ela de tradicional Família do Vale do Araguaia, era recém chegado ao Barreirinho. Deixara a fazenda, originalmente dela por herança dos pais, em busca de concretizar uma legítima aspiração: “Estudar os filhos”, como era comum dizer. E Mozarlândia, que se faça Justiça, contou nos seus primeiros tempos com docentes abnegados e dedicados, porque idealistas. De memória, cito alguns, aos quais reitero sempre minhas homenagens, do fundo do coração: Noêmia e Maria Ferreira Camelo, Socorro e Rita de Castro Mota, Maria Gama, Margarida Alencar Mota, José Godinho, e Farid.

Deixei Mozarlândia ao completar meus 15 anos. Viajei a cavalo durante dois dias e meio, até Rubiataba, às vésperas do Natal de 1960. Dali, um dia de viagem até Goiânia, buscando desvendar a vida e o mundo. Poucos contatos com amigos e amigas tão queridos, com quem convivi na Mozarlândia daquele tempo.

Agora, recebo a triste notícia de que Ruth Ferreira de Abreu partiu. Uma queda, fratura na cabeça, uma internação, e o adeus daquela que, durante toda a vida, sorriu, transmitiu alegria e excelente astral.

Que pena!

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