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Rede de negócios liga empresário preso a ex-diretor da Petrobras

RIO — João Antônio Bernardi Filho, ex-dirigente da Odebrecht preso na 14ª fase da Operação Lava-Jato, figura no centro de uma intrincada rede de negócios que vai de serviços de petróleo e gás à administração de bens próprios e operações de câmbio. Uma das empresas das quais ele é sócio, a Hayley, recebeu propinas de US$ 1 milhão de Júlio Camargo, representante da japonesa Toyo Setal e delator do esquema de corrupção na Petrobras. Em outra, a Oil & Gás Service, seu nome aparece no banco de dados da Receita Federal como sócio de Alexandre Santos de Oliveira, genro de Irani Carlos Varella, ex-diretor da Petrobras Uruguai e ex-assessor especial da então presidente da estatal, Graça Foster.

Os investigadores da Lava-Jato suspeitam que a rede de empresas de Bernardi operava para movimentar o dinheiro dos negócios suspeitos envolvendo a Petrobras e seus fornecedores, incluindo a Odebrecht. Na delação premiada, Júlio Camargo disse que foi orientado por Fernando Falcão Soares, o Fernando Baiano, apontado como operador do PMDB, a depositar R$ 1 milhão, em duas parcelas, em contas da Hayley no Uruguai e na Suíça, para garantir contratos das empresas que representava junto à Petrobras.

A Hayley, fundada em 2008, tem como endereço declarado em Montevidéu o 21º andar da Rua Juncal 1305, que está vazio. No local, funcionou o escritório de advocacia Posadas, Posadas & Vecino, mas vizinhos e funcionários do prédio nunca ouviram falar da empresa. No Brasil, a firma uruguaia é a sócia da Hayley do Brasil, que funciona no escritório de advocacia de Christina Maria da Silva Jorge, que também teve a prisão decretada pelo juiz Sérgio Moro, e de José Reginaldo da Costa Filpi, no Centro do Rio. No local, não há qualquer referência à Hayley.

Um dos indícios de que Bernardi manteve o esquema ativo, mesmo após a divulgação do escândalo, foi o e-mail enviado em abril pelo GLOBO à advogada Christina Jorge, que aparece no contrato social como presidente da Hayley Uruguai, com perguntas sobre a empresa. Para Moro, a mensagem, rastreada pela Polícia Federal, “ilustra que João Antônio Bernardi Filho persistiu no controle da Hayley”. Isso porque, logo após receber a mensagem do repórter, Christina a enviou a Bernardi, pedindo orientação: “seguem as perguntas, aguardo seu comentário”.

Com a prisão de Bernardi, os investigadores esperam esclarecer pontos nebulosos na trajetória do empresário, que foi diretor-superintendente da Odebrecht Serviços de Óleo e Gás, antes de abrir negócios próprios.

Uma das frentes aponta para a Oil & Gás service, fruto de uma parceria com Alexandre Oliveira. Irani Carlos Varella, genro de Alexandre, é apresentado no site “Memória Petrobras” como engenheiro que ocupou funções gerenciais na Bacia de Campos, Petrobras Distribuidora e Cenpes. Ex-gerente-geral de Produção da Exploração e Produção (E&P) e diretor de Serviços, foi de outubro de 2008 a fevereiro de 2013, presidente da Petrobras Uruguai.

Alexandre Oliveira disse ao GLOBO que já não é mais sócio de Bernardi, e por isso ignora os negócios do empresário. Varella não foi localizado para esclarecer se conhece Bernardi.

Outro desafio da investigação é rastrear o destino do dinheiro transferido por Júlio Camargo para a conta “Hayley SA/BCP–Geneve/Iban, no Banque de Commerce et Placemente”, em Genebra, em duas operações. A segunda delas, em 4 de outubro de 2011, no valor de US$ 500 mil, ocorreu um dia antes de um não esclarecido assalto sofrido por Bernardi em pleno Centro do Rio. A polícia não conseguiu saber onde foram parar R$ 57 mil dos R$ 100 mil roubados do empresário na entrada da galeria que dá acesso ao BNDES.

NEGÓCIOS COM DUQUE

Em depoimento prestado a título de delação premiada, Júlio Camargo, então diretor da empreiteira Toyo Setal, disse que as duas transferências acima teriam sido feitas a pedido de Fernando Baiano, a título de comissão pela intermediação de contratos de fornecimento de sondas de perfuração da coreana Samsung à área Internacional da Petrobras.

Em setembro de 2012, a Hayley do Brasil — Empreendimentos e Participações comprou duas salas comerciais no Centro do Rio, como comprovam documentos obtidos em cartórios. Em seguida (janeiro de 2013), passou a funcionar no local a D3TM, consultoria do ex-diretor da Petrobras Renato Duque, montada logo após o dirigente deixar a estatal. Em novembro de 2013, a D3TM teria comprado estas duas salas por R$ 770 mil.

Bernardi foi também representante da Saipem, uma multinacional italiana de equipamentos de perfuração. Na Petrobras, Bernardi era conhecido desde os anos 1990, quando trabalhava na Odebrecht. Em 2011, a Saipem obteve, na diretoria de Serviços, comandada por Duque, seus dois maiores contratos no Brasil, para construir dois dutos ligando os campos de Sapinhoá, Lula e Lula Nordeste, no pré-sal. O trabalho foi concluído em 2013 ao custo de R$ 437 milhões.

O contrato social da Hayley do Brasil informa que objetivo é a participação em empreendimentos e administração de bens próprios, podendo participar de outras sociedades. O antigo endereço da empresa, Rua Alcindo Guanabara 25, sala 704, é um escritório de contabilidade de Roberto Garcia, não tendo sido em momento algum endereço da Hayley. Já o endereço atual, Avenida Franklin Roosevelt, 194, sobreloja 205, é o escritório de advocacia.

RETIRADA DE ATÉ R$ 1,2 MILHÃO

Inicialmente, a Hayley teve um capital social totalmente integralizado de R$ 2,5 milhões, dividido em 2.583.000 quotas no valor de R$ 1 (a Hayley S/A possuia 2.582.999 e João Antônio Bernardo Filho possuía uma quota no valor de R$ 1). As quotas subscritas à Hayley foram integralizadas com a incorporação ao patrimônio da sociedade das salas 420E, 421E e 422E do Bloco 1 do prédio em construção da Avenida Embaixador Abelardo Bueno, nº 1, em Jacarepaguá.

Em agosto do ano passado, fizeram um aumento de capital para R$ 4,2 milhões, mediante a emissão de 1.646.238 novas quotas, incorporando ao patrimônio da sociedade as lojas 122 e 123 do empreendimento denominado “Grupamento Seletto Business”, na Rua Embaixador Abelardo Bueno nº 1111, bloco 1, na Barra da Tijuca. E Bernardi permaneceu com uma quota.

Mais tarde, ata da reunião de sócios da Hayley do Brasil, em 24 de outubro de 2014, Reginaldo Filpi, em nome da quotista majoritária, autoriza Bernardi a fazer uma retirada do montante de até R$ 1,2 milhão, a título de antecipação de lucros, para ser compensado com os futuros resultados positivos da sociedade.

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