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OPINIÃO

 “Conheça-te a ti mesmo” - A arte do autodiálogo

Aparentemente, dialogar é um verbo simples de se pronunciar, entretanto, sua operacionalização tem se tornado cada vez mais complexa. Dialogar implica primeiramente em ouvir, ouvir não só o dito pelo outro, mas saber decifrar o tesouro presente nas entrelinhas do não dito. A arte de dialogar é uma função da inteligência para conhecer os outros, e a arte de autodialogar é uma função para se conhecer a si mesmo. Autodialogar implica em ouvir a sí próprio:  os próprios pensamentos, sentimentos e sensações. Não é nenhum segredo que no séc. XXI estamos vivenciando o auge da era da informação e informatização Mas quando nos perguntamos: para quê acumulamos e produzimos conhecimento? A resposta é vaga e redundante à pergunta: “para aumentar infinitamente nosso conhecimento.” Entramos, assim, numa corrida sem fim, em que nunca nos questionamos se isso realmente trará os benefícios prometidos. No parâmetro da  filosofia socrática “conhece-te a ti mesmo” se tornou uma espécie de referência na busca não só do autoconhecimento, mas do conhecimento do mundo circundante e da verdade. Para o pensador grego, conhecer-se é o ponto de partida para uma vida equilibrada e, por consequência, mais autêntica e feliz. O autodiálogo é o primeiro passo para o autoconhecimento. De que adianta grandes pensadores da contemporaneidade desmistificarem as ciências exatas, humanas e biológicas se calam-se sobre seus dramas, escondem suas fragilidades e omitem seus sentimentos?  O autodiálogo é o topo da pirâmide das leis que regem uma relação saudável, porém, a menos conhecida. A mais poderosa para desconstruir nossos fantasmas psíquicos, mas a menos praticada. Sem o autodiálogo o autoconhecimento torna-se inacessível, e sem o autoconhecimento o “eu” não tem como se conhecer tornando impossível a autoria da própria história. Não poder escrever a própria história implica em ser condicionado a viver segundo as leis que regem, de forma mecanicista, o ambiente externo ao próprio psiquismo. Sem um conhecimento prévio de si, de suas próprias limitações e das possibilidades que circundam um determinado objetivo, a vulnerabilidade diante das possíveis frustrações se tornam maiores, implicando, em última instância, na autorrejeição e autoabandono. O psiquiatra e escritor Augusto Curi salienta em uma de suas obras que “se o mundo se abandona, a solidão é intolerável, mas se você mesmo se abandona , a solidão é quase insuportável”. Figurativamente falando, “uma rejeição pode tirar o sono, mas a autorrejeição tira a possibilidade de tratar a insônia”. A priori, o autodiálogo pode soar estranho, quando presenciamos alguém conversado sozinho não nos hesitamos em rotulá-lo como “louco”. Entretanto, antes de desejarmos mais diálogo com outras pessoas, não menosprezando a importância das relações interpessoais para a saúde psíquica, comunicação e entendimento, precisamos aprender a desenvolver o nosso diálogo interno. Você pode fazer esse diálogo escrevendo, falando alto ou em silêncio, o importante é conversar, conversar muito e assim, gradativamente, ir identificando seus reais sentimentos sobre si e sobre o mundo que o cerca.

(Hully Segatti, escritora, pesquisadora, palestrante, professora de Inglês e acadêmica de Psicologia - [email protected])

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