Brasil

Pinguins em Goiás

Redação DM

Publicado em 4 de janeiro de 2016 às 21:38 | Atualizado há 10 anos

Em 1981, no Chile, reformas neoliberais da educação extinguiram a gratuidade das faculdades e iniciaram o processo de municipalização das escolas, seguido da privatização. Essas medidas fizeram com que mais de 40% das escolas passassem para as mãos da iniciativa privada. Em 1993 houve a liberação de cobrança de mensalidades nas escolas. Com o tempo, passaram a disputar os financiamentos estatais, para isso, apenas precisavam provar que o ensino era de ‘qualidade’. Todavia, a qualidade pretendida não era, de fato, boa. Javier Campos Martinez, em seu estudo sobre as desigualdades educativas no Chile, publicada em 2010, diz que o sistema local é, infelizmente, reproducionista e em momento algum provoca grandes perturbações. Além disso, ele disserta sobre como ela é alienadora na medida em que impede a mobilidade social, perpetuando o status quo.

O caos educacional fez com que os secundaristas, que devido aos seus uniformes – branco e preto, com gola V – são chamados de Pinguins, fossem, em 2006, às ruas protestar. Todavia, os abusos policiais fizeram com que a tática fosse alterada: para evitar confrontos com a polícia, os estudantes ocuparam as escolas, ao invés das ruas.

O espírito de força estudantil ganhou a América Latina inteira, provocando manifestações na Argentina, Uruguai, México e Brasil. Lutavam pelos mais diversos temas, desde o Passe Livre Estudantil até melhora na qualidade educacional, pela mudança na merenda até a eliminação do sistema horizontal de ensino. Poucos conseguiram seus objetivos.

Em Goiás, após a conquista do Passe Livre Estudantil e da redução das tarifas de ônibus, infelizmente, o movimento perdeu força – um dos motivos é, inclusive, o desserviço prestado pela grande mídia que, financiada pelo Governo, omitia informações importantes e era partidária. Todavia, o governador Marconi Perillo provocou a ira dos ‘Pinguins Goianos’. Ao pretender privatizar as escolas, os alunos acordaram e, mais uma vez, decidiram lutar.

Os secundaristas goianos começaram a ocupar suas escolas. O Governo Perillo, como contra ataque, permitiu cortes de água e energia.

Os estudantes ainda estão acampados nos colégios por não terem obtido respostas satisfatórias nas ‘negociações’ com o governo. Negociação, nesse caso, lê-se cassetete e repressão.

As medidas que estão para ser implantadas em Goiás não têm seus resultados comprovados, pelo contrário. Estudos mostram que o currículo é estreitado – a fim de garantir um ‘decoreba’ para o vestibular –, além disso, há possibilidades de queda no ensino e maior desigualdade entre alunos ricos e pobres, como se mostrou na Carolina do Norte (Estados Unidos).

O Governo está desesperado em diversos pontos: gastos excepcionais com publicidade, argumenta que as OS’s não têm fins lucrativos (?). As contra argumentações parecem fazer mais sentido: as OS’s da saúde no Rio de Janeiro estão em esquemas de corrupção, a ONU declarou-se contrária à privatização e militarização do ensino, dentre outras.

A problemática não tem previsão para um término, mas diferente do que se acreditava, o Natal e Ano Novo não enfraqueceram o movimento, pelo contrário: estudantes, ao celebrarem as festas nos colégios, aproximaram-se da comunidade e ganharam adeptos ao movimento. Enquanto o Governo não recua nas medidas austeras, dois grandes pontos positivos podem ser citados: 1- Nos colégios ocupados continua tendo aulas, não da grade curricular obrigatória, mas aulas de cidadania, cultura, música, teatro. Os alunos estão, finalmente, tendo aulas de verdade e podendo participar delas ativamente. 2- Jovens de 15,16,17 anos estão exercendo sua cidadania, ganham voz, interessam-se por política.

Só podemos esperar que, como no Chile, os estudantes consigam eleger representantes políticos nas próximas eleições para, com maior facilidade, alcançar seus objetivos. Que o espírito revolucionário continue vivo dentro de cada estudante e que as pessoas que criticam os ‘efeitos negativos das paralisações feitas’ entendam que “uma revolução não se faz com águas de rosas”.

 

(Arthur Santana, acadêmico do primeiro período de Letras Português-Inglês)

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