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OPINIÃO

Festa do Divino Espírito Santo do Estado de Goiás: patrimônio cultural imaterial brasileiro

Enquanto ocupamos a nossa mente com a magia e encanto que a festa do “Divino Espírito Santo” proporciona esquecemos, por momentos outros assuntos, politicamente incorretos, que tanto nos afligem.
Tradicional Festa do Divino realizada sete semanas depois do Domingo de Páscoa, no dia de Pentecostes, para comemorar a descida do Espírito Santo sobre os doze apóstolos. Sua origem se encontra em Portugal do século 14, com uma celebração estabelecida pela rainha Isabel de (1271-1336) por ocasião da construção da igreja do Espírito Santo, na cidade de Alenquer. A devoção se difundiu rapidamente e tornou-se uma das mais intensas e populares em Portugal.
Inconformada com o confronto entre pai e filho legítimo em vista da herança pelo trono a rainha Isabel passou a suplicar ao Divino Espírito Santo pela paz entre seu esposo e seu filho. A interferência da rainha teria evitado um conflito armado, denominado a Peleja de Alvalade.
Chegou ao Brasil com os primeiros povoadores. Há documentos que atestam a realização da festa do Divino em diversas localidades brasileiras desde os séculos 17 e 18.
É o caso de uma carta do capelão João de Morais Navarro a Rodrigues Cezar de Menezes, então governador da Capitania de São Paulo, datada de 19 de maio de 1723, que se iniciava com as seguintes palavras: “Indo ter à festa do Santíssimo Espírito Sancto a Vila de Jundiahy [...]” (em “Documentos Avulsos”, publicação do Arquivo do Estado).

O Império do Divino


“Originalmente, a Festa do Divino constituía-se do estabelecimento do Império do Divino, com palanques e coretos, onde se armava o assento do Imperador, uma criança ou adulto escolhido para presidir a festa, que gozava de poderes de rei. Tinha o direito, inclusive, de ordenar a libertação dos presos comuns, em certas localidades do Brasil e de Portugal.”
Em todos os lugares as doações dos fieis são partes essenciais nas várias formas de recursos arrecadados para que a festa aconteça. Contagiante o giro da Folia do Divino: grupos de cantadores que visitam as casas dos fiéis para pedir donativos e todo tipo de auxílio. Levam com eles a Bandeira do Divino, ilustrada pela Pomba que simboliza o Espírito Santo e recebida com grande devoção em toda a parte.
Tudo se repete, ano após ano, renovando a fé e a esperança na chegada de uma nova era para o mundo dos homens, com igualdade, prosperidade e abundância para todos.
O modo de fazer a festa em cada região adapta – se às condições locais. Reafirma, subliminarmente, o lugar da realeza e do popular.
Apesar do mundo moderno globalizado e tecnológico, os municípios goianos preservam as suas manifestações culturais; convivem em harmonia o novo e o tradicional em seus diversos ritos religiosos populares na (en)tão cantada miscigenação do sagrado e profano expressados nessa tradicional festa.
Para se ter uma ideia do prestígio da Festa do Divino no século 19, o folclorista Câmara Cascudo lembra que o título de “imperador do Brasil” foi escolhido em 1822, pelo ministro José Bonifácio, porque o povo estava mais habituado com o título de imperador (do Divino) do que com o nome de rei.
“Uma peculiaridade que existe nesta festa, assim como se encontram em tantas outras, é o fato de haver a reunião de distintas classes sociais no evento”, embora haja a distinção nas homenagens aos santos, como sinalizou um pároco de uma determinada época em Santa Cruz de Goiás. Argumentou: – Por que o “Divino” tem “imperador e imperatriz” e os outros santos homenageados na mesma festa tem “festeiros”? Segundo ele não havia necessidade de continuar, tão explícita, a diferença de classes. Desde então, a festa do “Divino” de Santa Cruz de Goiás coroa, simbolicamente, o casal de festeiros e não mais o “Imperador e a Imperatriz”. O “Império do Divino” continua readaptado e ressignificado.
Uma que festa se mantém viva em vários municípios goianos. Em todos eles, é uma mescla de várias manifestações folclóricas com aproximações e distanciamentos nos modos de organizar; nos valores de cada um.
Uma intrigante diversidade de atividades; ritos que são como leis que regem os rituais praticados; símbolos, ritmos, dança, música, culinária, artesanato, teatro, língua ágrafa; espetáculo de fogos de artifício; relatos e narrativas orais e outras expressões... Modos de vidas que se “apresentam como poderosos gestos de sedução da memória” e como marcos e referências de identidade para os grupos sociais que, ano após ano, se desdobram para se expressarem causando impacto positivo no local.
Movimentada e comovente expressão cultural em Santa Cruz de Goiás, Palmeiras de Goiás, Jaraguá, Niquelândia, Silvânia, Cocalzinho, Gameleira, Formosa, Uruaçu, Pirenópolis, Pilar de Goiás, Corumbá, Crixás e muitos outros municípios goianos formando uma grande teia que alimenta o mundo real e o mundo imaginário de um povo.
Encontro de Coroas da Festa do Divino Espírito Santo em Jaraguá tendo início no Império de Zeca Paes e Simone, realizado por dois anos consecutivos em Jaraguá e este ano após sorteio a cidade de Niquelândia realizará o terceiro encontro...
Viva a Cultura Popular!
Viva o Divino Espírito Santo!
Viva a Festa do Divino Espírito Santo do Estado de Goiás: Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro!

(Aparecida Teixeira de Fátima Paraguassú, historiadora, pós-graduada em Docência Universitária; poetisa, musicista, escritora... Titular/Representante, região Centro-Oeste, no Colegiado Nacional de Culturas Populares/ Conselho Nacional de Política Cultural; ex-presidente e atual secretária da Associação dos Amigos de Santa Cruz; acadêmica/Academia Aparecidense de Letras)

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