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POLÍTICA

Elson Costa: desaparecido

  • Dirigente do PCB foi preso e morto, no ano de 1975
  • Ele teria tido corpo esquartejado e jogado no Rio Avoré
  • DOI-Codi liquidou luta armada e depois atacou Partidão
  • Aglaé de Sousa queria apenas enterrar seus restos mortais


Preso, morto sob torturas, ele teve o corpo esquertajeado e jogado no Rio Avoré. Membro do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro, não escapou da repressão política e militar executada pelo DOI-Codi após a derrota da luta armada. Elson Costa integra a lista oficial dos mortos e desaparecidos do Projeto Brasil Nunca Mais reconhecida pelo Estado Nacional.

– Nunca nos entregaram os restos mortais!

É o que denuncia Aglaé de Sousa Costa, sua viúva, que por quase 30 anos tentou elucidar as circunstâncias de sua prisão ilegal, tortura, morte, desaparecimento e ocultação de cadáver. Nascida em Prata, Triângulo Mineiro, em 3 de setembro de 1920, ela mudou-se para Uberlândia aos sete anos de idade, depois radicou-se em Ituiutaba até transferir-se a Goiás.

Estado de Goiás

– Morei em Morrinhos, formei-me no curso normal, no Colégio Hermenegildo de Morais, em 1939, virei professora, fiz nova mudança para Pontalina e depois me casei.

Elson Costa era mais velho do que Aglaé de Sousa sete anos. "Gamei nele desde quando era pequena", dispara. Um homem alegre e carinhoso, observa. Sob a direção do "Cavaleiro da Esperança", Luís Carlos Prestes, o homem da coluna que percorreu 26 mil quilômetros no Brasil com um ideário liberal até virar marxista no exílio, ele passou a integrar a direção do PCB.

O Partido Comunista do Brasil (PCB), fundado em 1922, fazia parte da Terceira Internacional Comunista, Komintern, criado após a vitória da revolução socialista de outubro de 1917, na atrasada Rússia. A insurreição havia sido liderada por Vladimir Ilich Ulianov, codinome Lênin, morto em janeiro de 1924, e por Liev Davidovich Bronstei, Leon Trotski, morto em agosto de 1940.

– Eles defendiam os interesses históricos dos trabalhadores da cidade e do campo.

Aparelho

O casal resolveu morar no Rio de Janeiro. Elson Costa mantinha as suas atividades políticas clandestinas no Partidão. Até ser preso. "Prenderam Elson Costa e eu. Nos levaram para a Ilha das Flores. Antes, passamos pelo Ministério da Marinha. Em sessões de tortura, ele sofreu afogamentos e até enfiaram agulhas embaixo de suas unhas", ataca.

– Depois, ele não podia nem encostar um dedo no outro.

Apelidado no futebol de "Mané Vaca", ele era um humanista. Ajudava os porteiros dos edifícios em que morávamos, registra. Tratava-se de uma boa pessoa, de um amigo de todos, define-o. Elson Souto “caiu”, termo utilizado pela esquerda clandestina, em janeiro do ano turbulento de 1975. Vinte dias depois estaria morto.

Clandestinidade

– Ele foi preso na clandestinidade sob o nome falso de Manuel de Sousa Gomes, depois de sair de seu aparelho, de chinelo, para ir a um bar próximo tomar um café. A repressão política e militar já o esperava. Quatro homens se jogaram em cima dele. Fiquei dois meses tentando localizá-lo em São Paulo. Não obtive nenhuma informação. É o que revela Aglaé de Sousa Costa.

Os homens da caserna, no II Exército, lhe disseram que ele deveria estar na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). "Não tocaram em mim, mas mostraram um revólver", recorda-se. O que não foi suficiente para demovê-la da ideia de reencontrar o seu marido, Elson Costa, membro do Comitê Central do PCB, vivo ou morto.

– A Folha de S.Paulo o chamou de agente provocador (terrorista).

Carta a Geisel

“Como mulher dele, tenho o direito de saber onde Elson Costa está”, disse aos agentes da repressão. Me mandaram procura-lo no necrotério, desabafa. "Ninguém tem o direito de tripudiar sobre o sofrimento dos outros", atirou. Ela mandou, em 1975, uma carta ao então presidente da República, o general Ernesto Geisel. O silêncio foi a resposta.

– Elson Souto foi preso em 15 de janeiro de 1975. Então, apelei à consciência cristã de Ernesto Geisel. Mas ele morreu sob torturas, queimaram o seu corpo e o jogaram em um rio.

SAIBA MAIS

Uma noite que durou 21 anos

militar

Em 31 de março de 1964, fardados e civis derrubam o presidente da República, João Belchior Goulart, e implantam uma ditadura. À sombra da guerra fria, a estratégia era desagregar o bloco-histórico populista e levar os interesses multinacionais e associados à direção do Estado.

As tropas do general Olímpio Mourão Filho desceram a serra sem um só tiro ou protesto. Jango teria voado com o general Assis Brasil à Fazenda Rancho Grande, em São Borja. Depois, com Maria Thereza e filhos, tomou um C-47 e aterrissou no exílio: Uruguai.

O primeiro general-presidente a entrar em cena foi Humberto Castello Branco. Ele queria um ato institucional que durasse apenas três meses. "Assinou três". Registro: queria que as cassações se limitassem a uma ou duas dezenas: cassou quinhentas pessoas e demitiu 2 mil.

O seu governo durou 32 meses, 23 dos quais sob a vigência de 37 atos complementares. O general Humberto Castello Branco foi o cérebro do golpe de estado civil e militar de 1964. Ele era o líder da sorbonne militar, composta, por exemplo, de Ernesto Geisel e o então coronel Golbery do Couto e Silva.

Para o brasilianista Thomas Skidmore, o movimento civil e militar de 31 de março de 1964 ocorreu com dez anos de atraso e nunca atingiu o seu objetivo: desmantelar a estrutura estatal e sindical corporativista montada por Getúlio Vargas, que suicidara-se em agosto do ano de 1954.

"O golpe ia ser dado em 1954, mas falhou por causa do suicídio de Vargas". Não foi uma quartelada, mas uma ação de classe traçada tática e estrategicamente pelas elites orgânicas do capital transnacional, analisa o cientista político uruguaio radicado no Brasil René Armand Dreiffus.

– Ipes, Ibad e ESG consideravam o Estado como instrumento de um novo arranjo político e de um "novo modelo de acumulação".

História: as articulações contra João Goulart começaram antes de sua posse, em agosto e setembro de 1961. Mais: se intensificaram a partir do plebiscito que decretou a volta do presidencialismo, em janeiro de 1963, e tomaram as ruas após o anúncio das reformas de base, em 1964.

Sucessor de Humberto Castello Branco, Arthur da Costa e Silva decreta o Ato Institucional nº 5 em 13 de dezembro de 1968. Vice, o civil Pedro Aleixo foi impedido de assumir o Palácio do Planalto. Depois de um breve exercício da Junta Militar, o general Garrastazu Médici chegou ao poder.

Em 1977, o presidente da República, Ernesto Geisel, que havia executado a partir de março de 1974 a distensão lenta, gradual e segura, baixa o Pacote de Abril. João Figueiredo é abençoado pela caserna no ano de 1978 e o Congresso Nacional aprova a Lei da Anistia, em 1979.

Os exilados retornaram ao Brasil e os presos políticos deixam os cárceres, pós-anistia. A ditadura acabou em 15 de março de 1985. Já Daniel Aarão Reis diz que a ditadura acaba, de fato, em 1979. Para ele, de 1979 a 1988 há, no Brasil, um período de transição.

A democracia no Brasil, depois dos anos de ditadura civil e militar, só se consolida e se institucionaliza, com a remoção do legado constitucional autoritário e a promulgação da Constituição de 5 de outubro de 1988, sob a Nova República. (Renato Dias)

MAIS INFORMAÇÕES

Revivendo – Elson Costa – Um filme de Marcello Rocha; edição: Murilo Sobrinho.

Luís Carlos Prestes – Um  revolucionário entre dois mundos (2014), Cia das Letras, de Daniel Aarão Reis Filho.

A Casa da Vovó – Uma biografia do DOI-Codi (1969-1991), o centro de sequestro, tortura e morte da ditadura militar' [2015], de Marcelo Godoy.

Dos Filhos Deste Solo – Boitempo Editorial. De Nilmário Miranda e Geraldo Tibúrcio.

NÚMEROS VERMELHOS

1917 Ano da Revolução Russa.

1922 Fundação do PCB (Brasil).

1924 Coluna Prestes em movimento.

1935 Insurreição comunista no Brasil.

1937 Getúlio Vargas instala a ditadura do estado novo.

1945 Cai Getúlio Vargas.

1946 PCB é legalizado.

1964 Golpe de Estado civil e militar

1975 Elson Costa é preso e torturado.

1985 Fim da ditadura civil e militar.

1988 Constituição é promulgada em 5 de outubro.

1992 Nasce, da costela do PCB, o PPS

2014 Sai o relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

2015 30 anos da morte e desaparecimento de Elson Costa.

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