Uma ode à sabedoria popular
Redação DM
Publicado em 1 de março de 2018 às 00:05 | Atualizado há 6 meses
Resguardar e empoderar a mulher kalunga, sua cultura, tradições e, principalmente, sua sabedoria ancestral é a preocupação central do projeto Mulheres em Círculo- “Sabedoria da mulher Kalunga, evento que acontece de amanhã até o próximo domingo e chega a três regiões da Chapada dos Veadeiros: amanhã estará na Comunidade de Diadema, no dia 3 (sábado) em Cavalcante, na Casa Kalunga, e domingo (4) encerra-se na comunidade Engenho.
À frente deste projeto está a psicóloga Marnene Souza, coordenadora de Mulheres em Círculo, um projeto que foi ensaiado em diversas situações, em vivências, workshops e até na clínica da idealizadora. Mas foi apenas com o apoio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura que a ação ganhou sustentabilidade para começar a chegar onde queria.
“O projeto traz consigo a valorização das ricas tradições destes lugares. E nas edições futuras queremos ampliar ainda mais o projeto, com a realização das atividades em outras comunidades da Chapada dos Veadeiros. Desta vez, por questões de logística e acessibilidade, estamos realizando apenas em três localidades”, explica a psicóloga.
O mergulho à cultura kalunga é a continuidade de algo maior. Com o nome Mulheres em Círculo – Sabores e Saberes do Feminino Sagrado, a proposta iniciou-se aqui em Goiânia, domingo (25). Na ocasião contou com a presença da artista plástica Rosy Cardoso, que trouxe questões sobre a arte no feminino, e da dançarina Mara Natércia, que liderou uma dança de roda e música. Em Goiânia, o projeto será realizado ainda no dia 23 de março.
CHAMADO DO CORAÇÃO
O desenvolvimento deste projeto, bem como a “tour” pelas comunidades da Chapada dos Veadeiros, segundo Marnene Sousa, era mais do que um sonho: ela o define como um “chamado do coração”. “Mulheres em Círculo também foi incentivado por meu interesse na ecopsicologia, a união entre psicologia e a ecologia, tanto como ciência quanto movimento social, que busca o elo humano com a rede da vida, a natureza.” “A ecopsicologia busca fazer com que o ser humano entenda que faz parte da natureza e não é superior a ela”, explica.
Como boa estudiosa da ecopsicologia, Marnene Souza, que ainda trabalha na ONG Amazonas Visão (cuja proposta é promover ações na área da saúde e do meio ambiente à comunidade ribeirinha do Rio Araguaia e Rio Amazonas), notou grande respeito e interação com o meio ambiente nas tradições e cultura das comunidades Quilombolas.
“Escolhemos trabalhar nesta região de Cavalcante, por tratar-se da porta de entrada para a comunidade Kalunga e por se tratar de um local, apesar de muito sofrido, é muito fértil em saberes. Com parteiras, curandeiras, cozinheiras, com uma saber muito interessante. Em Mulheres em Círculo queremos dialogar com mulheres mais jovens, para nunca se esqueçam da sabedoria que mora nas mulheres mais velhas da comunidade”, explica Marnene.
A troca de saberes é um objetivo claro da iniciativa que pode ser notada na equipe do projeto, que além da psicóloga de duas mulheres Kalunga, as irmãs Milza e Marta Farias. “Estas duas são mulheres incríveis, que fico emocionada só de falar. Milza é uma enfermeira que nunca perdeu o contato com suas origens e vai falar sobre a cultura Kalunga. Já Marta tem a sussa (uma dança tradicional nos Quilombos de Goiás) no pé e vai mostrar ainda o poder da culinária Kalunga, em um grande resgate de cores e sabores”, conta a coordenadora.
Neste clima de integração a dançarina Cláudia Prado vai mostrar às comunidades o poder das danças ancestrais com cirandas de roda, danças sagradas circulares. Rosy Cardoso, que já realizou exposições, como “Mulheres Que Amam Demais” e “Lata D’Água na Cabeça”, com temas ligadas ao empoderamento das mulheres, vai compartilhar com o projeto seus conhecimentos da arte no feminino e pinturas de mandalas.
MULHERES EMPODERADAS
Estará ainda presente em Mulheres Em Círculo músicas, cantorias tradicionais, contos, mitos, celebrações, meditação, entre outras ferramentas. E não será necessário que as participantes possuam conhecimentos nem habilidades específicas para se juntar ao projeto, que gira em torno de um bem maior: uma verdadeira igualdade entre sexos.
“Queremos despertar uma nova consciência. Integrar o masculino e o feminino em uma sociedade até hoje muito patriarcal. A gente ainda sustenta muitos valores do universo masculino, o que causa um desequilíbrio do yin e yang , que precisam trabalhar juntos.
OS KALUNGA
Cavalcante, que conta com belas atrações naturais, como diversas cachoeira, a pequena cidade é berço dos Kalunga–a maior comunidade de remanescentes quilombolas do Brasil. Estra é uma comunidade que construiu a sua cultura ao longo de quase 300 anos de isolamento (que foi uma maneira do povo Kalunga de encontrar a liberdade). Até 1982 não havia um levantamento sobre sua sociedade – que só teve seu valor reconhecido pela antropóloga Mari Baiocchi.