Do descaso ao caos
Redação DM
Publicado em 4 de janeiro de 2018 às 23:05 | Atualizado há 7 anos
O trágico acontecimento do último dia primeiro de janeiro, no regime semiaberto era uma tragédia anunciada. Por diversas vezes durante o último ano de 2016, o Conselho de Comunidade na Execução Penal de Goiânia, através das vistorias que faz junto a todo o Sistema, seja de Aparecida de Goiânia, seja em Goiânia, relatou que o Regime Semiaberto estava sem condições para continuar suas atividades devido ao número absurdo de pessoas bloqueadas, o que significa dizer, pessoas que receberam o direito a progressão de regime (do Fechado para o Semiaberto), ou mesmo que foram condenadas diretamente ao regime Semiaberto, mas eram mantidas trancafiadas em instalações absolutamente impróprias para o fim a que se destina.
Nesse contexto, apenas para que se tenha uma idéia, o sistema tem capacidade para aproximadamente 150 presos e abrigava na fiscalização do Conselho em novembro, 860 pessoas em condições subumanas, confinadas por uma guarda noturna de apenas 3 agentes penitenciários, dois deles provisórios, com uma comida totalmente impropria para consumo (tanto dos agentes como dos presos) e, quando ouvimos os presos bloqueados (aqueles que não podem sair das celas porque aguardam audiência de justificação ou admonitória junto a 2ª VEC), recebemos como informação que as audiência estavam sendo marcadas em até 2 anos e meio…a título de esclarecimento, tal audiência tem por prazo médio 30 dias, segundo a Lei de Execução Penal – Lei n.º 7.210/84, tudo conforme artigo 118, e aplicação analógica ao texto Constitucional e ao Pacto de São José da Costa Rica.
A tragédia é uma das formas de manifestação do preso para chamar a atenção para o descaso da Execução Penal com o Sistema e, entende o preso, que é a única forma de buscar a tenção da população. Triste, mas infelizmente, ao que tudo indica, necessário frente ao terror proporcionado pelas Varas de execução de Goiânia, responsáveis diretamente pelo Caos que estamos presenciando.
A título de curiosidade, problema semelhante está acontecendo na Casa do Albergado, onde a capacidade é para 120 condenados em regime aberto (somente exige o retorno do condenado as noites e nos finais de semana e feriados) e hoje conta com 420 pessoas, das quais 150 estão bloqueadas, logo, presas, demorando em média 90 dias para a tal audiência de justificação. La, na Casa do Albergado, os “presos” não tem médicos, remédios, qualquer forma de tratamento, mas existem presos baleados, com feridas abertas, com queimaduras em 40% do corpo, jurados de morte, mas a juíza da 2.ª VEC, a mesma do Regime Semi-aberto, parece não se importar. Esse fato já está relatado em nossa vistoria junto ao sistema e oficiado à juíza responsável, onde demos o prazo de 48 horas para resposta e, para que a população tivesse conhecimento, oficiamos dando ciência dos fatos à Corregedoria do Tribunal de Justiça, ao Secretário de Governo, ao Superintendente do Sistema Prisional, ao Grão Mestrado da Maçonaria Goiana, ao Presidente da OAB e, agora, a população, para que todos possam se inteirar do que está por vir.
Fazemos questão de deixar claro aqui, que, bem antes de ser um problema de Governo, é um problema pontual do judiciário que parece se colocar em uma situação de descaso e morosidade absoluta para transformar o que é muito simples de resolver, em uma bomba relógio. Também é oportuno mencionar que o Conselho, a partir do momento em que assumimos a atual gestão, vem sofrendo retaliações por parte dos Juízes da Execução que insistem em tentar impedir que fiscalizemos o sistema e mostremos o que realmente acontece.
(Marcelo Bareato, advogado criminalista especialista em crimes econômicos, mestre em Direito Penal, professor e coordenador da área penal da PUC-GOIÁS, pós-graduações e preparatórios, presidente do Conselho de Comunidade na Execução Penal da Comarca de Goiânia desde nov/2016)