O Jesus dos excluídos
Diário da Manhã
Publicado em 29 de dezembro de 2017 às 23:25 | Atualizado há 7 anos
O nascimento de Jesus é comemorado no mesmo dia do nascimento do deus sol.
Aliás, o deus sol Horus, o deus-falcão egípcio, conhecido como “senhor do céu”, é um símbolo da realeza divina. Seus nome (“Har”, em egípcio) (“Rá”, em português) provavelmente significa “o alto”, “acima”, “distante” e está conectado com “Hry” (aquele que está acima de/sobre). O nome aparece em hieróglifos egípcios no protocolo real no início da civilização dinástica em 3000 a.C.
Por uma convenção, por um acordo, o Papa Júlio I decretou em 350 que o nascimento de Cristo deveria ser comemorado no dia 25 de dezembro, substituindo ou aproveitando a data de veneração ao Deus Sol, para que houvesse a adoração ao Salvador Jesus Cristo.
Desta maneira, o nascimento de Cristo passou a ser comemorado no Solstício de Inverno. É bom frisar que os romanos comemoravam o solstício de inverno erroneamente na data de 25 de dezembro. Ficou por isso mesmo.
O Solstício de inverno é um fenômeno astrológico conhecido desde a antiguidade. No dia 22 de dezembro ocorre o início do solstício de inverno no qual o sol tem o seu ponto mais baixo no horizonte, devido à inclinação do eixo terrestre. Este ponto mais baixo permanece por um período de três dias, e no dia 25 de dezembro o sol sai deste ponto, subindo 1 grau e voltando gradativamente ao seu ponto mais alto, finalizando assim o solstício de verão.
A estrela que brilha mais forte no céu é a estrela Sirius, que no dia 25 de dezembro fica alinhada à constelação de três reais (Marias aqui no Brasil). Este alinhamento aponta diretamente ao sol. Sendo assim, o sol, saindo do solstício de verão “renasce”, movendo-se 1 grau para o norte depois de três dias (22-25) e quando renasce, é sinalizado pela estrela Sirius, seguida pela constelação de três reis, formando assim um alinhamento entre os três.
Tudo isso porque as tradições pagãs misturam-se às tradições cristãs. Não há tradição divina sem o ‘homem’, pois Deus inclina-se à ele para estabelecer suas regras divinas.
A bíblia relata que o anjo Gabriel anunciou à Maria o nascimento de Jesus e à Izabel, o nascimento de João Batista.
E o que podemos abstrair entre as semelhanças da escolha dessas duas mulheres, consideradas especiais para Deus?
Maria e Izabel eram parentes. Pertenciam à linhagem levita, de onde surgiam os sacerdotes, apesar de que a linhagem feminina não era considerada à época.
Eram pobres. Maria, uma jovenzinha em torno dos seus 15 anos, órfã de pai e mãe, e Izabel, uma velha, mas não uma velha qualquer: uma velha sem filhos, o que era considerado uma maldição para os judeus de então.
Jesus vem ao mundo no meio dos excluídos, anunciado para nascer num contexto de mulheres pobres e idosos, classe esta considerada excluída até hoje entre nós.
E Jesus, o filho de Deus, revoluciona ainda mais, pois ao tomar a forma humana, ele se humilha, deixando o divino, a sua morada nos céus, e vem para a terra, habitar entre os humanos, seres inferiores, com suas mazelas, doenças em meio a castas de injustiças sociais.
Ao iniciar seu ministério aos 30 anos, Jesus inova e no Sermão do Monte abençoa os desvalidos, os injustiçados, os menosprezados: “bem aventurados os humildes, os que choram, os mansos, o que tem fome e sede de justiça, os misericordiosos, os limpos de coração, os pacificadores, os perseguidos”, ou seja, aqueles que não tinham nenhum valor na sociedade de então e ainda não têm na nossa.
E vendo a multidão, a alimenta. O primeiro milagre é conhecido como “alimentando os 5000” o segundo, “alimentando os 4000.”
É claro que trata-se do milagre da multiplicação, mas antes de tudo é o milagre da compaixão! Perceba o que Jesus disse: “Tenho compaixão deste povo, porque há três dias que está sempre comigo e nada tem que comer.”
A fome não dá margem à discussões filosóficas de que se deva ‘ensinar a pescar’. O objetivo é outro: matar a fome de quem tem fome! Anteriormente já tinha multiplicado o vinho em um casamento, matando a sede de quem tem sede.
E finaliza em João 6:35:
“35 E Jesus lhes disse: Eu sou o pão da vida; aquele que vem a mim não terá fome, e quem crê em mim nunca terá sede.”
É a esse Jesus que comemoramos nesse período de solstício de inverno. Um Jesus que não tinha parte com os poderosos e os repudiava (Mateus 22:21: “Daí pois a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”), que era metido no meio dos excluídos e com práticas não ortodoxas de liderança.
Se tivesse nascido hoje, talvez teria nascido entre os sem terra – aqueles do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) – ou em meio aos MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto); e se tivesse que ser classificado, seria como um comunista.
Finalmente, você leitor, deve estar horrorizado com tanto heresia assentada nesse texto.
Pois bem! Jesus foi condenado à morte sob a acusação de ser herege.
Estou no caminho certo.
(Silvana Marta de Paula Silva, advogada e escritora. Twitter: silvanamarta15; Instagram: silvana.marta)