Liberalismo contra o populismo
Redação DM
Publicado em 22 de dezembro de 2017 às 23:15 | Atualizado há 7 anos
Chegou a hora das definições. Não importa se há ou não, no Congresso, número para aprovar a já raquítica reforma da Previdência, ou se o Judiciário proibiu o esclarecimento à sociedade de que ela trata de estabelecer, no longo prazo, uma Previdência republicana que reduzirá os privilégios mal adquiridos pela alta burocracia pública, uma casta escolhida por concurso (não eleita), cuja promoção sempre depende de um empurrãozinho de políticos eleitos e sobre a qual se perdeu qualquer controle social.
É certo que duas décadas de administrações do PSDB e do PT produziram certa estabilidade monetária e alguma melhora na distribuição de renda, ambas, porém, menores do que a de outros países emergentes.
Não é menos certo, entretanto, que reduziram o crescimento do nosso PIB per capita entre 1995 e 2016 a 1,1% ao ano, enquanto outros emergentes (de maior renda média) com estabilidade monetária e distribuição de renda iguais ou melhores do que as nossas cresceram 4,3% per capita ao ano, em paridade de poder de compra de 2011.
Nas últimas duas décadas, o PIB per capita brasileiro cresceu miseráveis 27%, enquanto o dos nossos companheiros emergentes cresceu 153%! De fato, as administrações do PSDB e do PT produziram um enorme empobrecimento relativo: em 1995, o nosso PIB per capita era 78% maior do que o deles. Hoje, ele é 12% menor! Há mil desculpas sofisticadas, mas nenhuma pode justificar esse fato, nem o finale grazioso dessa obra macabra que transformou o Brasil em uma colônia da China.
Não é surpresa os qualificados autores da pequena joia, o Plano Real, que “salvou” o PSDB, estarem se afastando dele. Quem não se lembra de 2007, quando o PSDB recusou os votos para a aprovação da CPMF (criada por ele) e do seu voto contra o fator previdenciário em 2015, porque temia que isso facilitasse o governo do PT?
É chegado o momento de enfrentar o oportunismo cívico do PSDB e do PT, que sempre fingem querer ir, mas sempre encontram uma desculpa elegante e hipócrita para demonstrar que não podem ir, porque desconfiam que indo beneficiariam o “outro”.
É hora de cada um assumir a sua responsabilidade sobre o que poderá ocorrer com a sociedade brasileira, se continuarmos a “empurrar com a barriga” as insuperáveis injustiças escondidas no nosso regime previdenciário, que são a maior negação da República.
É preciso reconhecer que o esclarecimento da sociedade sobre a necessidade e os benefícios futuros da reforma da Previdência tem sido incompetente. Só agora se pôs a mão na ferida e se começou a estimular a indignação com a injustiça do sistema.
A reação dos privilegiados não se fez esperar. Foram à Justiça para suspender o que chamaram de “propaganda enganosa”. Pode-se “inventar” qualquer argumento para provar que não há “privilégios”, ou que eles são “justos”.
Concretamente, entretanto, é impossível negar que uma “minoria” (a alta burocracia do Estado) recebe como salário, aposentadoria e pensões um múltiplo do que recebe a imensa “maioria” do setor privado que a financia com o pagamento de seus impostos.
É lamentável que a ambição desmedida do PSDB e do PT (na origem, ambos virtuosos e bem-intencionados), que, ao longo da desesperada batalha pelo poder, foram se empurrando, mutuamente, para um “populismo” vulgar.
Lamentável, porque o País precisa das ideologias originais dos dois, bem como do fortalecimento de um terceiro partido que se proponha a defender um liberalismo político sem adjetivos acompanhado de um liberalismo econômico responsável no espírito de uma “economia social de mercado”. Este é o “centro” que estamos procurando.
No momento, o que se impõe é a verdade: 1. Transmitir para a sociedade as injustiças reveladas no cuidadoso documento do Tesouro Nacional, Aspectos Fiscais da Seguridade Nacional. 2. Embargar no Judiciário a escandalosa proibição de fazê-lo obtida na primeira instância pelos beneficiários da injustiça. 3. Levar a votação a reforma que se encontra na Câmara dos Deputados para que cada um assuma a responsabilidade do que acontecerá ao País se ela vier a ser recusada. Não a submeter a votação será um ato de conivência covarde e de custo imensurável.
(Delfim Netto. Formado pela USP, é professor de Economia, foi ministro e deputado federal)