A floresta ecoa o que nela se grita
Diário da Manhã
Publicado em 19 de dezembro de 2017 às 21:29 | Atualizado há 7 anos
“Nosso Senhor ama os pobres, por isso fez tantos” (Abraham Lincoln)
A crítica da religião é o pressuposto de toda a crítica. Um ser não humano é o reflexo do espelho onde o homem procura e deve buscar sua verdade ou realidade. O homem faz a religião, mas ela não faz o homem, por ser ela autoconsciência, sentimento de si. Ao buscar a religião o homem denuncia a perda de si, sem saber que “o homem é o mundo do homem, o Estado, a coletividade” (Marx), esse Estado e a sociedade que produzem a religião, uma doutrina, realização fantástica da essência humana ou realidade fictícia. A luta contra a religião é a luta contra o perfume do espírito, o suspiro do indivíduo sem alma, o ópio do povo. Ao lutar por meio da religião o homem denuncia sua miséria real, a necessidade de se abolir da falaciosa felicidade ilusória. Essa crítica liberta o homem da fantasia, provoca a perda da ilusão, o reencontro da razão, do próprio sol, contrário ao sol ilusório do homem que não gira em torno de si.
A alienação humana nas suas formas profanas foi desmascarada na sua sagrada, na crítica da religião pelo direito, da teologia através da política. Renegar 1843 é desconhecer a França de 1789 e o período atual, de participação nas nações modernas sem a participação nas suas revoluções ou contrarrevoluções de governantes que tiveram medo e aqueles que nunca o conheceram. Do contrário, ou conduzido por pastores, a liberdade só nos alcança no dia de seu funeral, ou, no grito do escravo debaixo do açoite traduzido como grito de rebelião. A floresta ecoa o que nela se grita. A Alemanha de dois séculos atrás, assim como o Cristianismo, estavam abaixo do nível da história, continuavam a ser objeto de crítica, a qual não é a paixão da cabeça, mas a cabeça da paixão.
A crítica não é um fim em si, mas uma arma a destruir o inimigo, um meio, indignação, sentimento, denúncia contra o mau humor, condescendência e insignificância do governo. A sociedade dividida se defronta, tratada e tolerada na sua existência dominada por governos e governantes agraciados pela dádiva do céu. Há que promover pressão sobre os governantes para despertar a consciência, trazer à luz pública o canto da sua própria melodia. Uma nação deve aprender a ter coragem, enfrentar o ancien régime ilusório, hipócrita e sofisticado a ocultar a imperfeição oculta do Estado moderno, no qual a salvação da ordem no mundo advém de heróis já mortos. A crítica política e moderna da realidade social urge sair do status quo alemão e apreender seu objeto sob o seu objeto.
A economia preocupa os alemães com suas tarifas, proibições e economia política que fez com que o chauvinismo alcançasse dos homens a matéria, metamorfoseando sujeitos de algodão e ferro em patriotas, pelas vias da economia política o domínio da sociedade sobre a riqueza. O domínio da propriedade privada sobre a nacionalidade por meio da economia nacional, expressão socioeconômica atada a uma questão de choque, ou exercícios adicionais em assuntos históricos velhos e banais. O real germe de vida da nação alemã só brotou no seu crânio. É impossível extinguir a filosofia sem a realizar. Na batalha crítica da filosofia contra o mundo alemão o homem real, só foi possível na medida em que o próprio Estado moderno não atribuiu importância ao homem real e o “status quo” da ciência política alemã exprime a imperfeição do Estado moderno em si, a degeneração de sua carne, tarefas que só podem ser resolvidas pela atividade prática.
A teoria transforma-se em força quando apodera das massas, e o radicalismo da teoria alemã com seu rigor prático determina a eliminação positiva da religião ou o homem que é para o homem o ser supremo, o que aguça a necessidade de acabar com as condições do homem diminuído, aprisionado, desamparado: “Infelizes cães! Querem tratá-los como homens!” O reformista Lutero venceu a escravidão pela religiosidade, mudou a escravidão pela persuasão, transformou padres em leigos, leigos em padres, libertou o homem da religiosidade exterior, transformou a religiosidade na essência íntima do homem, libertou o corpo das suas cadeias, da luta do padre contra seu próprio padre interior ou sua característica sacerdotal. A metamorfose filosófica dos alemães eclesiásticos em homens “emancipou” o povo, não se confinou aos príncipes, nem a restringir ao confisco da propriedade da Igreja, que fez da Alemanha a mais oficial servidora de Roma.
A revolução das necessidades reais se faz pela revolução radical, e a Alemanha ficou a observar as outras nações modernas se desenvolver. De acordo com Hegel, “o alemão não se encontrará no patamar da decadência europeia, será comparado a um subserviente que sofre dos males do cristianismo”. A sociedade civil emancipa-se se alcança comando universal, emancipação geral da sua situação. O dinheiro e a cultura desperta a sociedade enquanto representante de si, seus objetivos e interesses, o cérebro e o coração social a consciência revolucionária. A revolução de um povo é a emancipação da classe particular da sociedade civil. O significado negativo universal da nobreza e do clero francês produziu o significado positivo e geral da burguesia ou, o “nada sou e serei tudo” como a revelação da própria mediocridade da qual a classe média alemã tem como base da consciência mesquinha e limitada.
Os príncipes entram em conflito com o monarca, a burocracia com a nobreza, a burguesia com todos eles enquanto o proletariado já está a principiar uma luta contra a burguesia. São essas as condições humanas com base na liberdade social de vida prática pouco intelectual, e onde nenhuma classe da sociedade civil sente necessidade de conseguir emancipação da situação imediata da situação imediata, necessidade material além dos próprios grilhões. O mal feito não é particular, mas um mal geral a exigir título humano. A perda total da humanidade será suprimida na redenção total do homem, no proletariado resultado do movimento industrial, uma pobreza produzida artificialmente, massa ou povo oprimido que provém da desintegração da classe média. O proletariado conclama a dissolução da ordem social existente, afirma o mistério da sua própria existência, praga a dissolução dessa ordem, nega a propriedade privada, bebendo da filosofia para identificar suas armas materiais, intelectuais as quais tomam o homem para o homem, ou seu próprio ser supremo.
E o pulso, ainda pulsa!
(Antônio Lopes, escritor, filósofo, professor universitário, mestre em Serviço Social e doutorando em Ciências da Religião/PUC-Goiás, mestrando em Direitos Humanos/UFG)